São Paulo, terça-feira, 14 de março de 2006

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CRÉDITO

Questiona-se o fato de serem poucas as instituições cuja avaliação autorize a venda de ações de empresas no mercado

Agências de risco sofrem ataque nos EUA

FRANK PARTNOY
PARA O "FINANCIAL TIMES"

As audiências do Comitê Bancário do Senado norte-americano sobre as agências de classificação de crédito foram encerradas, na semana passada, com uma pergunta simples do presidente do comitê, o republicano Richard Shelby: "O que há de errado com a idéia de competição e transparência?". De acordo com a maioria dos critérios, o setor de classificação de crédito é o mais opaco e o menos competitivo dos mercados mundiais.
O cerne do problema é o domínio que a Moody's Corporation e a Standard & Poor's Rating Services exercem sobre as classificações de crédito. Os legisladores as classificam como "um duopólio de agências de classificação". Como sabe qualquer organização que tenha tentado obter uma classificação, as duas empresas detêm as chaves para os mercados financeiros. Desde que a Moody's abriu seu capital, em 2000, o valor de suas ações cresceu em mais de 400%. A cotação das ações da S&P também disparou, mesmo em um período de declínio geral do mercado.
Explicando o motivo dessa tendência, Shelby apontou na semana passada que a Moody's e a S&P enfrentam pouca competição -basicamente porque se beneficiam do domínio sobre uma forma de "licença regulatória": em essência, fornecem certificados que estabelecem que seus detentores cumprem determinadas normas legais. Quando as empresas pagam a Moody's e a S&P por uma classificação, estão implicitamente adquirindo uma espécie de licença financeira. As autoridades regulatórias tornaram as duas agências mais lucrativas ao impedir que companhias concorrentes vendam esse tipo de licença.
Ainda que existam 130 outras agências de classificação de crédito, o sistema de licenças regulatórias as impede de competir. Uma dessas agências, a Rapid Ratings, apresenta desempenho muito superior ao da Moody's e da S&P na análise de riscos de crédito. Ela previu os problemas financeiros na Enron e na Parmalat muito antes que a Moody's e a S&P rebaixassem as classificações de crédito das duas empresas. Mas as regras que governam fundos mútuos e fundos de pensão não permitem que eles se baseiem nas classificações da Rapid Ratings.
A Moody's e a S&P apresentam margens de lucros operacionais sustentados da ordem de 50%, graças em larga medida à grande rentabilidade oferecida pelos honorários que empresas emissoras de título pagam para obter as classificações que elas oferecem. Os honorários são elevados porque o valor das classificações abrange as licenças regulatórias, as quais permitem às empresas acesso ao mercado de capitais.
O líder da bancada democrata no Comitê Bancário do Senado é Paul Sarbanes, co-autor da lei Sarbanes-Oxley, que incluía uma cláusula prevendo novo exame da situação das agências de classificação de crédito.
Em setembro do ano passado, escrevi em artigo para o "Financial Times" que as audiências legislativas sobre as agências de classificação de crédito representariam "o começo do fim" para a Moody's e a S&P. Projetos de lei em debate na Câmara norte-americana pretendem resolver problemas importantes do setor adotando um sistema sob o qual novas agências de classificação de crédito poderiam aderir ao regime regulatório desde que se registrassem na Securities and Exchange Commission (SEC, agência federal norte-americana que regulamenta e fiscaliza os mercados de valores mobiliários).
Os próximos meses representarão um teste que determinará se as forças esmagadoras que apóiam a reforma serão capazes de superar o esforço concentrado de lobby que a Moody's e a S&P vêm conduzindo. A S&P chegou até a ameaçar o Congresso de que contestaria judicialmente qualquer nova lei, sob a alegação de que classificações de crédito são protegidas pelas leis que garantem a liberdade de expressão. Mas classificações de crédito não são simples opiniões. Existe uma diferença fundamental entre classificações de crédito e jornalismo. Os emissores de títulos pagam bilhões de dólares à Moody's e à S&P por sua "expressão", mas não estão pagando pela informação -estão pagando por uma licença que lhes confere o direito de vender títulos a investidores regulamentados que requerem classificações de crédito. O Congresso deveria eliminar as licenças que tornam as classificações de crédito tão valiosas. A Moody's e a S&P poderiam se expressar à vontade, depois disso.


O autor, que depôs sobre as agências de classificação de crédito ao Comitê Bancário do Senado, na semana passada, é professor de direito na Universidade de San Diego.

Tradução de Paulo Migliacci


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