São Paulo, sábado, 14 de março de 2009

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Brasil cobra do G20 estatização de bancos

Para ministro da Fazenda, essa é a resposta mais "concreta e rápida" para limpar sistema financeiro de ativos tóxicos

Limpeza dos ativos de risco é apontada como 1º passo para normalizar fluxo de crédito global; "rapidez é essencial", diz Mantega

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O ministro Guido Mantega defendeu ontem a nacionalização dos bancos (na verdade, estatização) como a resposta "mais concreta e mais rápida" para limpar o sistema financeiro dos ativos chamados tóxicos que impedem o fluxo normal de crédito e, por extensão, bloqueiam qualquer possibilidade de retomada da economia. Mantega emendou: "Rapidez é essencial".
A defesa da nacionalização -que, antes, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva já dissera que recomendaria a Barack Obama no encontro de hoje nos Estados Unidos- foi feita em reunião dos ministros da Fazenda dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), à margem do encontro de ministros e presidentes de bancos centrais do G20, inaugurado ontem com um jantar.
Mas os Brics não fecharam uma proposta conjunta. Discutiram as duas hipóteses mais recorrentes no debate sobre os ativos tóxicos: a compra deles por algum mecanismo que tampouco está perfeitamente delineado ou a nacionalização.
Nas discussões técnicas que antecederam a reunião ministerial do G20, ficou claro que a tendência é para que não se recomende uma solução global para o entupimento do sistema financeiro.
Poderá haver, sim, padrões internacionais, mas cada país os aplicará de acordo com suas próprias necessidades, características e legislação.
No que concordaram todos os quatro Brics é no fato de que, sem solução para os bancos, qualquer pacote de estímulo à economia perde eficácia, o que, de resto, é óbvio.
Nesse ponto, os Brics coincidem literalmente com o anfitrião, o ministro britânico do Tesouro, Alistair Darling, que disse ontem ser "crítico" que os "bancos limpem seus balanços", de forma a "assegurar que possam começar a fornecer crédito à economia de novo".
Darling também está de acordo com os Brics em outro ponto: os quatro países emergentes e o ministro britânico defendem pacotes de estímulo fiscal para retomar a demanda, tese aliás que foi lançada nesta semana pelos Estados Unidos.
Os europeus reagiram dizendo que já puseram dinheiro público suficiente para debelar a crise e preferem esperar os resultados dos pacotes anteriormente anunciados e em fase de implementação antes de abrir de novo os cofres.
Os europeus colocam a reforma da supervisão internacional como grande prioridade. Os Brics aceitam que se trata de providência relevante, mas acham que a ênfase não pode ser apenas na regulação.
Fizeram inclusive a distinção entre o urgente (a retomada da economia) e o estrutural (reforma da regulação).
Mas antes mesmo de começar a ministerial do G20 já houve um avanço em um dos inúmeros pontos ligados à regulação e à supervisão do sistema financeiro: a Suíça anunciou que vai relaxar suas rígidas regras de sigilo bancário e cooperar mais com seus pares no combate à evasão fiscal.
Além de chocolates, queijos e relógios, o sigilo bancário é um dos produtos mais típicos da Suíça. O fato de ter decidido se adequar às regras definidas pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, clubão das 30 economias mais ricas do planeta, mas do qual o Brasil ainda não faz parte) mostra a força que vai ganhando o G20.

Exigência
Países do grupo, como a França, vinham exigindo que o G20 adotasse medidas contra os chamados paraísos fiscais, entre os quais está a Suíça, na relação elaborada pela OCDE.
Outros países (Liechtenstein, Andorra e Bélgica) haviam anunciado idêntica adesão a padrões internacionais.
O primeiro-ministro Gordon Brown saudou a decisão de todos eles, especialmente da Suíça, e disse que é preciso passar "rapidamente" à implementação dos padrões da OCDE.
A importância do G20, que o Brasil pretende ver entronizado como nova diretoria informal da economia planetária, foi reconhecida por Alistar Darling: "No passado, os países mais desenvolvidos poderiam pensar que teriam condições de sair [de uma crise] por seus próprios meios. Agora, nós precisamos das economias emergentes, precisamos das economias em desenvolvimento. Nenhum país pode sair sozinho".
Darling minimizou as divergências entre norte-americanos (apoiados pelos Brics) e europeus em torno da questão regulação versus estímulo.
Tem motivos para fazê-lo: as discussões preliminares indicam que o comunicado final da ministerial, a ser divulgado hoje, não será um tudo ou nada. Nenhum país é insano a ponto de rejeitar a necessidade de relançar a economia, assim como não há resistência a um aperfeiçoamento e aprofundamento da supervisão/regulação.
Tudo é uma questão de matizes, que só ontem começaram a ser discutidos com mais profundidade. Pelo menos até o anoitecer, não fora posta à mesa a proposta do secretário norte-americano do Tesouro, Tim Geithner, de que os países do G20 comprometam, cada um, 2% de seus PIBs em pacote de estímulo à economia.
É razoável nesse cenário o palpite de Brad Setser (Council on Foreign Relations) de que o G20 envie "um forte sinal" de que tudo fará para a retomada econômica, mesmo que não assuma compromissos numéricos. "Não é o que os mercados estão esperando", acha Setser.


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