São Paulo, domingo, 14 de março de 2010

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Brasil perde comércio com os vizinhos

Apesar de prioridade da diplomacia de Lula, intercâmbio entre os países foi mais afetado pelo real valorizado e pela concorrência chinesa

Para diretor da Cepal, fóruns de integração da região deveriam seguir o exemplo da Ásia e ter um viés mais comercial e menos político


ÁLVARO FAGUNDES
DA REDAÇÃO

O setor exportador brasileiro perdeu mais espaço no comércio com a América do Sul e o México no ano passado. Com o real valorizado e a forte concorrência chinesa, o pragmatismo pesou mais do que a criação de diversos fóruns regionais de integração nos últimos anos.
Com exceção da Colômbia e do Uruguai, a participação das vendas brasileiras caiu em todos esses países no ano passado em relação a 2008, com quedas que variaram de 1% a 20%. A maior perda ocorreu nas transações com o Paraguai, 3,8 pontos percentuais, e a menor, nas vendas à Argentina (terceiro maior parceiro comercial do país), de 0,6 ponto percentual.
Ainda que vários dos países da região sejam pobres, a soma das exportações brasileiras para eles não é nada desprezível. No ano passado, apesar da perda de espaço, as vendas para América do Sul e México (total de dez países) representaram 19,4% do total exportado pelo Brasil -o equivalente a US$ 29,6 bilhões. Para ter uma base de comparação, a participação da União Europeia, muito mais rica e com 27 países, não foi muito maior: 22,3%.
Para Roberto Teixeira da Costa, dirigente do Ceal (Conselho Empresarial da América Latina), a situação é ainda mais grave porque a região é o principal mercado das exportações brasileiras de bens manufaturados e semimanufaturados (que exigem maior elaboração tecnológica). "É um mercado extremamente valioso para o país", disse o economista.
"O Brasil corre o risco, se não ficarmos atentos, de se tornar um grande produtor de commodities. Nada contra, mas não é exatamente o que gostaríamos que o país fosse", afirma Costa. Ele aponta o real valorizado, que encarece os produtos brasileiros no exterior, como um dos principais fatores para o recuo na participação.
Renato Baumann, diretor da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) no Brasil, segue por um caminho semelhante. Ele, porém, ressalta que a alta da moeda tem pesos distintos para os setores. Segundo o especialista, o real valorizado é "muito ruim" para alguns segmentos, como vestuário e calçados, que enfrentam forte concorrência chinesa. "Para itens mais elaborados, como autopeças, as coisas não ficam tão claras."
A China é outro ponto ressaltado pelos especialistas. Como vem acontecendo desde o início da década, o país asiático, maior exportador mundial, continuou a conquistar espaço no comércio latino-americano. Na Venezuela, por exemplo, as vendas chinesas passaram de 9,4% do total, em 2008, para 10,2%, em 2009, enquanto as brasileiras caíram de 9% para 8,3% nesse mesmo período.
Baumann, da Cepal, cita ainda o excesso de barreiras no comércio regional. "São tantas que as coisas não andam." Ele afirma que os fóruns de integração na região -prioridade da diplomacia do governo Lula, com criação de centros de debate como a Unasul (União das Nações Sul-Americanas)- têm um "viés político muito forte".
Para ele, a região deveria seguir o exemplo dos países asiáticos, para quem, devido também a rixas regionais, esses fóruns são "business only". "São muito pragmáticos, têm um componente de complementaridade que nunca tivemos."
A retração nas exportações brasileiras no ano passado também afetou a movimentação dos portos no país, que tiveram recuo de 4,6% ante 2008, na primeira queda desde 1999.


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