São Paulo, quarta-feira, 14 de julho de 2004

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COMÉRCIO EXTERIOR

Exportação brasileira deve ser favorecida por proposta da Comissão Européia de reduzir ajuda a produtores

UE propõe hoje corte nos subsídios ao açúcar

Evaristo Sá - 18.jun.04/France Presse
Manifestantes fantasiados de Blair (Reino Unido), Chirac (França) e Bush (EUA) protestam contra subsídios agrícolas na Unctad, em SP


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

A Comissão Européia propõe hoje a redução dos subsídios que dá a seus produtores de açúcar, o que abre perspectivas de o Brasil aumentar substancialmente suas exportações.
"O céu é o limite para o açúcar brasileiro", chega a festejar Antonio Donizeti Beraldo, representante da Confederação Nacional da Agricultura nas negociações comerciais internacionais.
Motivo da euforia: o preço de exportação da tonelada de açúcar produzida pelo Brasil é de cerca de US$ 200, ao passo que os europeus, mesmo com os cortes que deverão ser anunciados (e provavelmente aprovados) hoje, terão um custo de aproximadamente US$ 480 (ou 400).
Graças a esse nível de competitividade, as vendas brasileiras de açúcar cresceram 51% do primeiro semestre de 2003 para idêntico período deste ano (de US$ 850 milhões para US$ 1,3 bilhão).
Com a possível redução do protecionismo europeu, o açúcar brasileiro ganha em duas pontas:
1) A produção de açúcar tende a cair, com o que o preço subirá. O Brasil, como maior exportador de açúcar de cana, lucra com o preço mais elevado.
2) Caindo o subsídio europeu à exportação, o produto brasileiro, que não é subsidiado, ganha condições de acesso aos mercados hoje inundados pela União Européia, maior exportadora de açúcar branco (os europeus fazem açúcar da beterraba, mais propícia para produzir açúcar branco).
Segundo a agência de notícias France Presse, que antecipou o anúncio a ser feito hoje pela Comissão Européia, as exportações de açúcar subsidiado poderão cair, a partir do ano que vem, das 2,4 milhões de toneladas anuais de hoje para apenas 400 mil toneladas. Em dinheiro, os europeus cortarão as ajudas à exportação, hoje de 1,5 bilhão, para um nível ainda a ser estabelecido, sempre segundo a AFP.
Cairá também o preço mínimo oferecido aos produtores, hoje de 632 por tonelada, para 400 (ou US$ 480, ainda assim mais que o dobro do preço de exportação do açúcar brasileiro).
É por isso que, na análise mais cautelosa do Itamaraty, a decisão é "um passo na direção certa, melhora as coisas em relação ao sistema vigente, mas ainda é insuficiente", conforme ouviu a Folha.

Remuneração
O ganho do Brasil não será no mercado europeu, que é abastecido pela produção interna e também pela cota de 1,3 milhão de toneladas que a União Européia concede (e manterá) aos 19 países chamados ACP (África, Caribe e Pacífico) e em menor medida à Índia.
"A idéia toda não é entrar no mercado europeu. É buscar melhor remuneração, que fica diminuída porque os subsídios deprimem os preços", diz Maria Nazareth Farani Azevedo, especialista em agricultura no gabinete do chanceler Celso Amorim.
Maria Nazareth lembra que o mesmo princípio de busca de melhor remuneração foi central no processo que o Brasil moveu (e ganhou) na Organização Mundial do Comércio contra os subsídios norte-americanos ao algodão.
Agora, está em andamento, sempre na OMC, investigação sobre o açúcar europeu, pedida por Brasil, Austrália e Tailândia, grandes produtores. Por isso, tanto Maria Nazareth como Donizeti Beraldo vêem na decisão da União Européia uma antecipação à quase certa derrota no julgamento a ser feito pela OMC.
Paulo Venturelli, principal negociador comercial do Ministério da Agricultura, lembra que 50% dos subsídios à exportação concedidos pela União Européia estão concentrados no açúcar, o que, por si só, indica a importância do corte a ser anunciado hoje.
A decisão tende a influenciar duas negociações comerciais em andamento. Donizeti Beraldo conta que, nas negociações entre o Mercosul e a União Européia, o bloco do Sul vinha pedindo cota para exportar açúcar para os europeus, hoje mercado totalmente fechado.
"Os europeus não se mostraram radicalmente contrários", diz ele, "talvez por já saberem que o protecionismo ao açúcar estava para ser reduzido".
Na semana que vem, Mercosul e União Européia voltam a negociar, já sob as novas regras, mais liberais, para o açúcar.
No caso da Rodada Doha da OMC, a liberalização da agricultura vem sendo o principal entrave a avanços pedidos por Brasil e os grandes produtores agrícolas.
Se os europeus decidem reduzir a proteção ao açúcar, não parece ter lógica mantê-la para os demais produtos agrícolas.


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