São Paulo, sexta-feira, 14 de agosto de 2009

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Ninguém vai contra o mercado, diz Bradesco

Presidente do banco afirma que a queda do juro é tendência natural e que oferta atual de crédito está "adequada" à economia

Para analistas, banco público navega melhor na crise, com conservadorismo do setor privado e condições mais privilegiadas para competir

DENYSE GODOY
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi, rebateu ontem à noite as críticas aos juros dos bancos privados feitas pelos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento). Para o executivo, a oferta de crédito pelo conjunto das instituições financeiras do país "atende suficientemente a demanda e é adequada às necessidades da economia brasileira".
Ele afirmou ainda que o viés de baixa dos juros "é um fato". "Quando cresce a competição, quem ganha é o cliente. Estamos vivendo um ambiente competitivo extremamente excitante em que o consumidor pode conseguir opções muito favoráveis." Segundo ele, a velocidade de redução dos juros será "a do mercado". "Ninguém vai contra o mercado, todo mundo vai a favor do mercado quando o mercado exige".
Segundo ele, o Bradesco não vai "comer poeira", como alertou Mantega, horas antes, às instituições privadas. "Estamos competitivos, abrindo agências", afirmou.
Mantega e Trabuco Cappi participaram de evento de empresários à noite em São Paulo. Também presente, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse que a redução dos juros pelos bancos públicos ajudou a combater a crise no país. Mas Meirelles também fez coro a Mantega: "Agora, com a expansão das instituições públicas, as privadas vão ter que voltar a recuperar terreno, senão perderão mercado".
Questionado sobre os riscos da atuação agressiva dos bancos públicos no crédito, Meirelles respondeu: "Vamos aguardar a divulgação dos números. Os números falam por si só".

Melhor na crise
Na opinião de analistas, os bancos públicos, sob pressão e com o patrocínio do governo, arriscaram mais na concessão de novos empréstimos em plena retração econômica. Como a crise se revelou menos severa do que se previa, acabaram navegando melhor e ganharam mercado perdido pelas instituições privadas.
Há dúvidas, no entanto, se os bancos privados perderam mercado porque foram rigorosos demais na concessão de crédito ou se a aposta dos bancos públicos se deu em condições privilegiadas.
O presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, afirmou que os bancos públicos não conseguirão sustentar mais os baixos "spreads" [diferença entre juro captado e repassado].
Segundo Armando Castelar Pinheiro, professor da UFRJ, os bancos públicos têm um custo de captação inferior ao restante do mercado devido à concentração de poupança e de depósitos judiciais. O BB ainda estava menos exposto que os bancos privados nos financiamentos para pessoa física, que têm as maiores inadimplências.
"Claro que os bancos privados tiveram posição mais conservadora. A tendência é que isso mude no final do ano. Os grandes bancos privados tendem a brigar para recuperar o que perderam", disse Castelar.
Para João Augusto Salles, da consultoria Lopes Filho, o BB também pôde ser mais agressivo no crédito porque o CMN (Conselho Monetário Nacional) autorizou a revisão da avaliação de risco dos agricultores, o que liberou dinheiro que deveria ser provisionado.
"Essa conta vai chegar. O Setubal tem razão. Os bancos públicos não conseguirão trabalhar trimestre a trimestre sem repassar custos", disse Lopes.
Segundo estudo da consultoria Economática, o BB liderou o ranking das instituições financeiras mais rentáveis nas Américas. O banco teve rentabilidade média sobre o patrimônio de 12,9%, acima de Bradesco (11,2%), Itaú Unibanco (10,1%) e Goldman Sachs (8,3%). Para Salles, a rentabilidade do BB não deverá se sustentar nesse patamar. Isso porque 35% do crédito do banco está no setor agrícola, que tem "spreads" mais baixos. "A rentabilidade do BB não se manterá maior do que a de Bradesco e Itaú", disse.
Na avaliação de Luis Miguel Santacreu, analista da consultoria Austin Ratings, o crescimento da participação de mercado dos bancos no crédito se dará pelo equilíbrio de cada um deles entre três variáveis: volume de novas concessões, tamanhos dos "spreads" e risco de inadimplência.
"O Setubal tem o desafio individual de não querer sacrificar muito a margem porque tem despesa adicional de integração do Unibanco. Já o Bradesco pode canalizar mais esforço com juro menor e utilizar isso como marketing. Está mais leve, ficou na terceira posição e não tem de digerir uma aquisição. Isso não é uma corrida de Fórmula 1 que vai terminar no final do ano. Cada um tem uma estratégia para ganhar mercado. Se essa briga vier em benefício da concorrência, vai ser positivo para o sistema como um todo", disse Santacreu.


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