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OPINIÃO ECONÔMICA
Mudanças qualitativas no comércio exterior
ISAC ZAGURY
O comércio mundial terá
provavelmente um segundo
ano consecutivo de retração, o
que nunca ocorreu desde 1950. Os
mercados acionários voltaram a
registrar índices reais anteriores
aos da "crise Tequila". O volume
de emissões internacionais de títulos de renda fixa teve uma queda de 50% em relação ao mesmo
período do ano passado. Os bancos de atuação global tiveram pesadas perdas com empresas envolvidas com fraudes contábeis.
Esse cenário negativo provocou
uma crescente aversão ao risco e o
chamado efeito "flight to quality".
Embora enfrentando uma conjuntura internacional extremamente desfavorável, o país ainda
deve crescer pelo menos 1,5% em
2002. Por outro lado, o Brasil começa também a colher frutos de
sua estratégia de diversificar mercados, apesar da redução nas vendas para destinos tradicionais como Argentina e Europa. O resultado da balança será superior a
US$ 11 bilhões. Em realidade, a inversão da balança será de US$ 17
bilhões, caso consideremos o período 1999-2002.
Entretanto vale destacar algumas questões relevantes na análise do comércio exterior brasileiro.
Importantes mudanças ocorreram nas áreas da promoção comercial, do crédito e da produtividade.
Não obstante uma redução dos
preços internacionais das commodities exportadas pelo Brasil, o
saldo da balança comercial de
agronegócios cresceu em torno de
50% nos últimos anos. O agronegócio é um exemplo clássico do
boom de produtividade, demonstrado por meio de um crescimento de 45% da safra no período
1996-2002, com praticamente a
mesma área de cultivo. O país hoje produz 30% a mais de soja por
hectare que os Estados Unidos.
O comércio internacional está
muito mais protegido do que dez
anos atrás. Tanto os países industrializados como os em desenvolvimento vêm adotando políticas
ousadas e inovadoras de apoio às
exportações. Paradoxalmente, a
tarifa média americana para os 20
principais itens de exportação do
Brasil é três vezes superior à praticada no sentido inverso. A nova
lei agrícola americana adiciona
mais US$ 20 bilhões aos subsídios
já existentes.
A crescente diversificação da
pauta é resultado de nova política
de promoção comercial mais
agressiva, com diálogo permanente com novos parceiros. As
sucessivas crises internacionais
vêm exigindo mais agilidade no
redirecionamento dos destinos
das nossas exportações.
O país também se beneficiará
dos investimentos que realizou a
partir de 1999 para substituir importações, principalmente nos
segmentos do complexo eletrônico e de material de transporte. Representará, sem dúvida, uma ruptura no padrão do impacto do nível de atividade sobre a balança
comercial com uma redução sensível do coeficiente de elasticidade.
O financiamento é hoje, sem
dúvida, a grande variável estratégica para a inserção em novos
mercados e indispensável às exportações de bens de capital e manufaturados. O BNDES vem redirecionando suas prioridades e
alocará aproximadamente 35%
do seu orçamento em 2002 para o
apoio às exportações. Embora o
foco seja o crédito de longo prazo,
o banco vem suprindo, em caráter
complementar, com a agilidade
necessária, a demanda de capital
de giro para a produção dos bens
a serem exportados.
Não obstante os avanços recentes, a agenda das exportações ainda é bastante complexa e desafiadora. A falta de cultura exportadora e a excessiva concentração
da base são temas que exigirão esforços adicionais nos próximos
anos.
O crédito voluntário internacional continuará ainda escasso nos
próximos anos, já que a atual crise
parece mais duradoura e estrutural. Assim, será relevante compatibilizar a geração de saldos comerciais crescentes com a necessidade de crescimento em patamares mais elevados.
Isac Roffé Zagury, economista, é vice-presidente do BNDES.
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