São Paulo, domingo, 14 de outubro de 2007

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BC teme que cortes alimentem inflação

Banco vê risco de ter de frear economia em 2008 caso a capacidade produtiva não dê conta da demanda e o preços venham a subir

Mesmo que o Copom opte por manter a Selic, governo poderá sustentar o discurso de que os juros estão no nível mais baixo da história

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Nas últimas duas semanas, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, atuou nos bastidores do governo preparando o terreno para uma parada nos cortes dos juros. A decisão oficial sobre a trajetória da taxa Selic será do Copom (Comitê de Política Monetária) -que tem mais duas reuniões agendadas para este ano, uma delas nesta semana-, mas Meirelles já começou a pavimentar o caminho para uma corrente que ganhou força nos debates internos do BC: o ritmo mais acelerado de crescimento da economia se tornou uma ameaça para a inflação em 2008.
Tentando evitar que o BC fique acuado e seja alvo de fogo amigo, caso os diretores resolvam suspender a queda dos juros já nesta semana, Meirelles entrou em campo e colocou essa possibilidade em discussão.
Enquanto ele fez a costura política com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na cúpula da equipe econômica, os diretores do BC foram encarregados de lançar a mesma idéia nos contatos com o mercado financeiro, reforçando preocupações que constam da ata da última reunião do Copom e também do relatório trimestral de inflação, divulgado há 20 dias.
Assim, procura-se, por um lado, dar argumentos ao governo para ajustar o discurso em defesa do BC. Por outro, a dúvida dos analistas fará a opção por uma parada no corte dos juros ser repassada nos relatórios enviados aos clientes. Dessa forma, se parar ou reduzir um pouco os juros nesta semana, o BC não causará surpresas ou instabilidade no mercado.
Segundo a Folha apurou, o principal argumento do BC tem sido o de que o Copom não pode colocar em risco o crescimento da economia para os próximos anos. Se a aceleração na demanda por bens e serviços não for acompanhada simultaneamente pelo aumento na capacidade produtiva das empresas, há risco de o BC ter de frear o crescimento da economia em 2008 para evitar a disparada da inflação.
Esse é o maior temor de Lula, que não quer repetir o ocorrido no primeiro mandato, quando o crescimento verificado em 2004 foi contido pela política monetária no ano seguinte. De olho nas eleições de 2010, Lula não quer altas e baixas no crescimento da economia e tem cobrado do BC e do ministro Guido Mantega (Fazenda) uma taxa em torno de 5% ao ano.
Para Meirelles, mesmo que o Copom opte por suspender a redução da Selic, o governo poderá sustentar o discurso de que os juros estão no nível mais baixo da história tanto em valor nominal como real (descontada a inflação).
Com isso, a estratégia de Meirelles já teria apoio até na Fazenda. Apesar de o ministro Guido Mantega discordar do diagnóstico de diretores do BC, ele não quer causar polêmica pública. O próprio Lula destacou, em discurso durante seminário do setor da construção civil, que a indústria precisa aumentar os investimentos para evitar que a inflação volte. Isso porque as empresas já estão utilizando mais de 85% da capacidade de produção.
Esse é um sinal de que as indústrias poderão não dar conta de atender o crescimento mais forte da demanda. Até o ministro da Previdência, Luiz Marinho, tradicionalmente crítico da atuação do BC, foi mais cauteloso ao comentar a política monetária e disse que é preciso deixar o BC agir com calma.

Divisão
O risco de pressão inflacionária divide os próprios diretores do BC. Uma corrente vem defendendo, desde julho, desaceleração nos cortes da taxa. Mas tem sido vencida por outra que vê espaço para novos cortes.
O desempenho recente da inflação, dando sinais de que a pressão dos alimentos arrefeceu, pode alimentar essa tese, mas a hipótese, avaliam, deve ser neutralizada pelo aumento das vendas na indústria além das expectativas.


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