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OPINIÃO ECONÔMICA
Peter Drucker e o Brasil de 2006
BORIS TABACOF
Peter Drucker tem razão: o
Brasil marca passo não por
falta de poupança e investimento
mas pela ausência de boa gestão
pública. Daí ser necessário que a
discussão política do ano eleitoral
se concentre em como gerir bem o
país, sem comando quase ilimitado de qualquer equipe econômica.
O Brasil precisa de estadistas, além
de bons economistas. Drucker escreveu que nossa sociedade transformou-se com incrível rapidez na
sociedade das instituições -de
negócios, governo, cultura, educação e entes sociais. É certo que os
governos não são empresas, mas é
desejável que eles saibam gerir o
Estado e modernizá-lo. Deveríamos dar maior relevância ao homem que morreu em novembro,
aos 95 anos. Ele foi considerado o
inventor do "management", palavra difícil de traduzir, como ele
mesmo dizia. Talvez possa se chamar de gestão essa ciência que é
também uma arte, já que lida com
muito mais do que a simples gerência material de negócios.
Peter Drucker foi precoce, papel
que cabe aos gênios. Ainda nos
anos 50, afirmava que os trabalhadores de uma organização devem
ser tratados como parte dos seus
ativos, e não encargos que devem
ser eliminados. Na década de 70,
destacava a importância dos trabalhadores do conhecimento, antevendo a atual era da inovação.
Dizia que atrair e reter talentos são
as duas tarefas centrais da gestão.
Em alguns contextos, as teses de
Drucker têm algo a ver com o atual
momento brasileiro. Escreveu ele:
"Desenvolvimento econômico e
social significam gestão, acima de
tudo... Ficou óbvio que a visão tradicional dos economistas, do desenvolvimento como função da
poupança e investimento de capital, não era adequada. Ao contrário, é a gestão que produz desenvolvimento econômico e social e,
com ele, poupança e investimento
de capital".
E ainda: "Tornou-se evidente
que, diferentemente da crença
corrente na América Latina de que
os países em desenvolvimento são
subdesenvolvidos, eles são subadministrados (undermanaged)".
Há uma década, o sucesso de um
brilhante grupo de economistas
que delineou um projeto de estabilidade da moeda deu lugar ao surgimento da equipe econômica. A
título de acabar com a inflação galopante e manter a estabilidade,
esse grupo adotou uma política rígida e praticamente assumiu o comando maior do país. Ao aplicar
diligentemente o manual, definiu
como linha mestra a meta da inflação, esperando que o mercado, entregue a si próprio, encontrasse o
rumo do crescimento.
Acontece que o referido mercado é constituído por atores financeiros. Achar que esse mercado
pode encontrar um nível que determine condições de crescimento
da economia, já que ele flutua ao
sabor dos seus interesses, ganhando nas altas e nas baixas, é a crença
granítica das equipes econômicas.
A idéia de que qualquer coisa fora
dos cânones ortodoxos é populismo ou aventura é tentar impor o
malfadado pensamento único.
Precisamos de mais Drucker e de
menos ortodoxia. A globalização é
um fenômeno financeiro. É possível que a rápida integração nos fluxos trilionários de capitais, sem
que se estabeleçam políticas industriais com firmeza e visão atualizada, estejam fazendo mais mal
do que bem para o Brasil.
Outra lição de Drucker tem a ver
com a discussão sobre o risco de o
Brasil se tornar um país "pós-industrial" sem ter alcançado a plena
fase de economia industrial. A fruta estraga antes de amadurecer.
A história de Drucker se confunde com a história da ascensão da
corporação moderna e dos dirigentes que organizam o trabalho.
Embora não tenha exercido funções executivas em empresas,
Drucker foi consultor, com decisiva influência sobre figuras célebres, como Alfred Sloan, da General Motors, Jack Welch, da General
Electric, Andrew Grove, da Intel.
Na fase mais madura do guru
dos gurus -como Drucker era
chamado-, desencantou-se com
o capitalismo do final do século 20,
dedicando-se mais à gestão do setor não-lucrativo da sociedade.
Ele achava que a cobiça era mais
bem remunerada do que a performance e via com desconfiança os
executivos que se dedicavam à
construção de impérios, por intermédio de fusões e aquisições, e que
ganhavam largamente à medida
que despediam milhares dos seus
trabalhadores. Chegou a comparar, com certo exagero, os traders
de Wall Street a "camponeses balcânicos roubando as ovelhas uns
dos outros". O Brasil precisa dos
mercados financeiros atuantes,
mas também precisa crescer e buscar uma sociedade mais justa e feliz. O momento da verdade deve
estar chegando.
Boris Tabacof, 77, diretor do Conselho
de Economia da Ciesp, foi presidente do
Conselho Superior de Economia da
Fiesp/Ciesp e vice-presidente do Conselho de Administração da Cia. Suzano de
Papel e Celulose.
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