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CRISE NO AR
Governo avalia que as contas "não fecham" na proposta apresentada pelo empresário Nelson Tanure para adquirir a aérea
Planalto vê compra da Varig com ceticismo
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
O governo viu com ceticismo e
constrangimento a compra da
Varig pelo empresário Nelson Tanure, e houve, até um acerto tácito
entre Planalto, Ministério da Defesa e empresas credoras de não
comentar o assunto. A operação é
considerada mais um "tiro n'água" para adiar os estertores da
mais emblemática companhia aérea brasileira.
O principal argumento para o
descrédito é aritmético: as contas
não fecham. Tanure, dono da Docas Investimentos e arrendatário
do "Jornal do Brasil" e da "Gazeta
Mercantil", obteve o controle da
Varig por US$ 112 milhões (R$
253 milhões), o que não é suficiente para pagar a dívida da companhia nem com a Infraero (administradora estatal de aeroportos), de R$ 450 milhões.
Além disso, o governo vê com
desconfiança o interesse de Tanure no mercado de aviação, e o empresário vem sendo chamado nos
gabinetes de Brasília de "novo Canhedo", em uma referência a
Wagner Canhedo, dono da Vasp
-que faliu.
A Varig reconhece um passivo
de "mais de R$ 7 bilhões", mas o
governo tem em mãos documentos de consultorias independentes
e contratadas pela própria Varig
dando conta de que esse valor pode ser, na realidade, perto de R$ 9
bilhões.
Mesmo com um eventual encontro de contas com uma causa
que a Varig vem ganhando da
União na Justiça e que está em última instância, ainda ficariam a
descoberto mais de R$ 4 bilhões,
na estimativa mais conservadora
do passivo.
Conforme o anúncio do negócio, anteontem, Tanure passa a ter
25% das ações ordinárias e o controle do capital votante da Fundação Ruben Berta-Par, controladora da Varig.
Ele esteve no mesmo dia em
Brasília para encontros com o vice-presidente da República e ministro da Defesa, José Alencar, e
com o presidente da Infraero,
Carlos Wilson. Nenhum dos dois
se manifestou sobre a questão
após o encontro. Alencar disse
ontem que o governo não tinha
nada com a operação.
Obstáculos
Apesar de o empresário não formalizar um pedido de socorro, inclusive porque a Varig já está em
processo de recuperação judicial
desde o mês de julho, o governo
sabe que, para reerguer a companhia, ele imagina obter investimentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), linhas de crédito
do Banco do Brasil, maiores facilidades de pagamento de combustível e isenção das taxas da Infraero. Nenhuma dessas possibilidades é factível.
O principal obstáculo é que Tanure é inadimplente no BNDES e
não poderia receber financiamento da instituição, nem mesmo ser
beneficiado com a transferência
de titularidade de um empréstimo de R$ 40 milhões feito à TAP
(companhia aérea estatal de Portugal), recentemente, para a compra de duas empresas vinculadas
à Varig -a VEM (de manutenção) e a VarigLog (logística).
Na expectativa do empresário,
manifestada em diferentes contatos, ele gostaria de comprar essas
duas empresas, "herdando" o financiamento aprovado pelo
BNDES à TAP. Conforme a Folha
apurou, isso não será feito. O
BNDES, aliás, nem foi informado
previamente da operação de Tanure com a Varig.
Conforme a Folha apurou, o
governo desconfia de que toda a
operação tenha ocorrido para encobrir a realidade e ganhar tempo, porque o principal problema
da Varig são os credores internacionais, que ameaçam até com o
arresto de aeronaves.
A primeira ameaça nesse sentido foi abortada justamente pelo
anúncio de que o BNDES e a TAP
estavam entrando na operação de
salvamento, e o arresto foi suspenso por ordem da Justiça americana. A Corte de Nova York vai
voltar a discutir a questão no próximo dia 22, já com a guinada mal
explicada em que a TAP deve sair,
e Tanure, entrar no negócio.
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