São Paulo, sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Uma nova dinâmica de crescimento

A perda da CPMF é uma boa oportunidade para que o governo opere a política fiscal de forma menos tosca

OS NÚMEROS do PIB relativos ao terceiro trimestre de 2007 surpreenderam mesmo os analistas mais otimistas. Ontem, um dia depois de sua divulgação pelo IBGE, assistimos a uma revisão em massa das estimativas para o crescimento brasileiro em 2007 e em 2008. A grande maioria dos analistas está convergindo para um crescimento de 5,5% neste ano e de 5% no próximo, mostrando claramente que finalmente cruzamos uma barreira que parecia impossível de ser cruzada sem grandes reformas estruturais em nosso sistema econômico.
Minha opinião é otimista sobre o momento que estamos vivendo. Em várias colunas, refleti sobre os efeitos estruturais que o crescimento da China tem provocado na economia brasileira, culminando no hoje quase consensual tema do "DESCOLAMENTO" em relação à desaceleração da economia americana. Essas mudanças atingiram nossa economia já na virada do século, mas ficaram realmente visíveis para o analista mais atento a partir de 2004. O crescimento de hoje, identificado pelo IBGE, deve ser entendido no contexto desse processo de mudanças.
Agrego hoje um novo argumento ao meu otimismo -crescente- para os próximos anos. Ele reflete uma lição de economia que meu irmão José Roberto me ensinou há algum tempo: "Uma economia, para mudar, precisa crescer a taxas estáveis por um período longo de tempo".
Mais importante que a magnitude da taxa de crescimento, diz ele, é a sua estabilidade em um patamar relativamente alto por um período longo. E isso está ocorrendo no Brasil depois de mais de 25 anos em que prevaleceu uma elevada volatilidade da taxa de crescimento.
Essa observação é fácil de ser entendida para quem pensa a economia de mercado como um sistema dominado pelo homem real, identificado primeiramente por Adam Smith. Tal homem é racional, mas também dirigido por emoções, sempre de natureza subjetiva e individual. O espírito animal mencionado mais tarde por Keynes é volátil, caprichoso e precisa contar com horizontes longos para despertar no homem o ímpeto empreendedor.
Quando o empresário não tem confiança no futuro, ele não investe e a economia não cresce. E essa confiança nasce quando se identifica um horizonte mais longo para o crescimento, como está acontecendo agora no Brasil.
E a surpresa nos números do PIB recém-divulgados está quase que totalmente concentrada no volume de investimentos privados. O crescimento do consumo das famílias -6% ao ano- e do governo -3,5% ao ano- veio em linha com as previsões. O diferencial está nos investimentos em máquinas e equipamentos, que devem crescer 13,5% em 2007, mais de dois pontos percentuais acima do que se previa há pouco tempo.
Na semana passada, tratei dos riscos de inflação nos próximos meses, que decorrem das incertezas a respeito da capacidade de curto prazo de a oferta atender o crescimento da demanda, em um momento de baixa ociosidade na economia e gastos públicos crescentes. Essa é uma questão de curto prazo, com a qual uma política econômica responsável pode lidar sem maiores sobressaltos.
Mas a dinâmica de longo prazo, que parece estar emergindo, é infinitamente mais importante, e o bom analista deve considerá-la como tal.
A perda da CPMF é até uma boa oportunidade para que o governo passe a operar a política fiscal de forma menos tosca, com potenciais benefícios -imediatos e de longo prazo- para o país.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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