|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VINICIUS TORRES FREIRE
O Estado, de empresário a financista
Intervenção de Lula no setor empresarial não tem sentido, deve dar em bobagem e não mexe em má herança de FHC
O ESTADO brasileiro deixou de
ser empresário para tornar-se financista, algo entre banco de investimentos e firma de "private equity". Ou consultor "estratégico" com poder de veto e de alta
pressão. Passou da hora de rediscutir se o governo e prepostos devem
ter participações em empresas privadas, em quais e por qual motivo.
Nesses dias, o governo Lula começou a defender a liberação do mercado de telecomunicações e o financiamento, talvez subsidiado, de uma
operação privada de descruzamento
acionário. Pouco antes, um setor do
governo quis vetar ou controlar a
compra da Xstrata pela Vale.
No ano passado, uma estatal, a Petrobras, coordenou a reestruturação
da petroquímica. O governo Lula
privatizou estradas federais e licitou
uma grande hidrelétrica. Mas deve
tirar os portos, as Companhias Docas, do programa de desestatização.
Os lulianos ainda colocaram no PAC
medidas para melhorar a administração da Eletrobrás ("governança
corporativa"), o que não andou, a
fim de impulsionar a ação da empresa na expansão do setor elétrico.
Evidentemente, não há método
nesse conjunto de ações lulianas
-nem se discute aqui se é adequado
abrir a porteira para as teles ou turbinar a Eletrobrás. Não há também
orientação "ideológica" unívoca, digamos. Há oportunismos óbvios e
de mau odor, como no caso das teles.
Há idiotices fisiológicas e também
de mau odor, como manter os portos, as Docas, sob controle estatal,
um negócio que não funciona, no
qual o governo pretende botar dinheiro que poderia ser investido
alhures -e se quer usar o BNDES
para arrumar as dívidas dessas empresas loteadas entre a politicalha.
Lembre-se ainda de que o governo
é sócio mais ou menos estratégico
de parte relevante do setor privado.
Dos 97 maiores grupos industriais,
59 deles nacionais, o Estado tem
participação acionária no controle
ou interesses em ao menos 20 deles,
por meio do BNDESPar ou de fundos de pensão de estatais, politicamente controlados pelo governo.
São empresas de alimentos, têxteis, metalurgia, mineração, siderurgia, aviões, veículos, material de
construção, petroquímica etc. Nos
44 maiores do setor de serviços, o
Estado está em 12, a maioria empresas de energia elétrica e teles. A conta foi feita com base na lista de maiores empresas da revista "Grandes
Grupos", publicada pelo "Valor".
Muitas dessas participações são
resultado da politização das privatizações sob FHC, programa, aliás,
subsidiado pelo Estado. O vício é
mantido com satisfação por Lula.
Decerto fundos de pensão têm de investir seu dinheiro do modo mais
rentável possível, e o BNDES não
pode, de súbito, jogar no mercado
suas participações. Mas ainda há
privatizações por fazer (portos, aeroportos, estradas, ferrovias). E fundos públicos ou "parapúblicos" podem ter destinação melhor, como
em inovação tecnológica, pesquisa
científica, setores novos, de ponta,
que inexistam e sejam viáveis no
país, e não em fábricas de chapas,
ônibus, camisetas ou salsichas.
Por fim, o governo age como uma
firma de "private equity" ou de consultoria e assessoria de investimentos, o que não é, numa politização do
mercado na maior parte indevida,
obscura e que vai dar em besteira.
vinit@uol.com.br
Texto Anterior: Luiz Carlos Mendonça de Barros: O medo do "NOVO" Próximo Texto: Governo propõe o fim das demissões sem justa causa Índice
|