São Paulo, segunda-feira, 15 de março de 2010

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"Quem não fazia acordo sofria represália"

Empresário que diz ter ajudado a formar cartel no setor da laranja nos anos 90 relata como fabricantes de suco agiram

Para Dino Tofini, que foi produtor de suco de laranja e hoje planta cana, punição é necessária porque "cartel permanece até hoje"


DA REPORTAGEM LOCAL

Dino Tofini, ex-dono da empresa CTM Citrus, afirma que os fabricantes de suco de laranja que quisessem sair ou não participar do suposto cartel da indústria de suco de laranja sofriam represálias das empresas maiores. A seguir, a continuação da entrevista concedida na semana passada. (FF e CR)

 

FOLHA - Qual era a represália feita a quem não quisesse participar do suposto cartel?
DINO TOFINI
- Levantar o preço da fruta a níveis absurdos para que o empresário [indústria] não pudesse comprar a laranja.

FOLHA - O sr. concordou com essa prática na época?
TOFINI
- Não só concordei como também trabalhei a favor, porque era muito interessante para mim como industrial.

FOLHA - Quanto o sr. ganhou com o suposto cartel no setor?
TOFINI
- O que ganhei foi a disponibilidade de ter o produto. A minha empresa na época foi beneficiada, sim. Se eu não cumprisse o acordo, teria que brigar com o Cutrale, por exemplo. Eu oferecia um preço para o produtor, e ele oferecia mais, era uma guerra total.

FOLHA - O sr. acha que as indústrias que participaram do suposto cartel devem ser punidas?
TOFINI
- É justo que elas sejam punidas. O cartel precisa acabar em benefício do Brasil, se é que ainda há tempo para isso.

FOLHA - O cartel existe até hoje?
TOFINI
- O cartel permanece até hoje, não há dúvida. Não tem mais as tradicionais reuniões às quartas-feiras, mas eles se falam às quintas-feiras, às sextas-feiras. Eles se falam muito, o conceito do cartel se mantém vivo, já está incutido no sistema da indústria de suco.

FOLHA - Como o sr. sabe disso, já que não está mais no setor?
TOFINI
- Depois que vendi a empresa, nós continuamos com a produção de laranja. Tínhamos contrato com a Cargill e foi interrompido justamente por discordar de preços que a empresa queria nos pagar. Tive de refazer contrato para vender a laranja por preço menor e engolir o prejuízo. Essa situação resultou em uma ação que movemos hoje contra a Cargill.

FOLHA - O suposto cartel também ocorria para definir preços para a venda do suco no exterior?
TOFINI
- Sim, o cartel atuava tanto no mercado interno como no externo. A venda do suco lá fora era só para quem o cartel quisesse. Eles faturam horrores na Bolsa Mercantil de Nova York porque o cartel tem todas as informações. Quando o preço cai, eles retiram 800 mil toneladas de suco do mercado e os preços voltam a subir.

FOLHA - A SDE investiga o setor desde 2006, quando houve a operação Fanta [técnicos da SDE e policiais federais cumpriram mandado de busca e apreensão de documentos em indústrias de suco de laranja]. Há demora nas investigações?
TOFINI
- Acho que as investigações estão caminhando tanto que os Cutrale já nem moram mais no Brasil.

FOLHA - As indústrias de suco têm "offshore" (empresa que funciona em paraíso fiscal) fora do Brasil?
TOFINI
- Todos os fabricantes de suco têm "offshore" para administrar os recursos financeiros que sobram. Uma empresa não consegue trabalhar no mercado externo sem ter estrutura interna. Essas indústrias têm bilhões de dólares lá fora.

FOLHA - O Ministério Público de SP enviou documento ao Departamento de Justiça americano para que os EUA também investiguem as empresas que exportam suco para lá. Eles devem investigar o setor?
TOFINI
- Devem e vão abrir uma auditoria, tenho certeza. E isso vai "embananar" todo o setor no país. O Brasil será punido.


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