São Paulo, terça-feira, 15 de abril de 2008

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FAO ataca produção de biocombustíveis

Ziegler, relator da ONU, afirma que fabricação em massa do produto é "crime contra a humanidade"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) alertou ontem de que a produção de biocombustíveis pode colocar em risco o acesso a alimentos pelos setores sociais mais pobres da América Latina e do Caribe.
"Isso [expansão dos biocombustíveis] pode ocasionar mudanças na demanda, no comércio exterior, na destinação de insumos produtivos -terra, água, capital etc.- e, finalmente, um aumento nos preços dos cultivos energéticos e tradicionais, pondo em risco o acesso aos alimentos para os setores mais pobres", diz trecho do documento da organização.
O assunto foi discutido ontem no primeiro dia da 30ª Conferência Regional da FAO para América Latina e Caribe, que vai até sexta-feira no Itamaraty, em Brasília.
"Não temos, neste momento, propostas, soluções imediatas. Não existem fórmulas rápidas para a solução de um tema que tem várias questões envolvidas", afirmou Guilherme Schultz, um dos técnicos da FAO envolvidos no estudo.
No caso do Brasil, a experiência nacional com álcool de cana-de-açúcar é vista como exemplo pelos 30 anos de erros e acertos resultando na tecnologia flex para automóveis.
Já os EUA, que destinarão 31% da safra de milho para álcool, foram alvo de críticas. "Não é o cultivo mais adequado tecnicamente para produzir álcool", disse Schultz.
Segundo o secretário de Relações Internacionais do Agronegócio, Célio Porto, a Europa também distorce o comércio de alimentos com subsídios para a produção de biocombustíveis e tarifas na importação de produtos agrícolas. "O Brasil produz sem subsídio e de uma forma que não compete com alimentos", afirmou.
Ontem, o relator especial das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, considerou crime contra a humanidade a produção em massa de biocombustíveis. Em resposta, Porto disse que os EUA e a Europa são os autores desse crime. "Pode ser [crime] nos países que estão desviando área de alimentos para biocombustíveis, como os Estados Unidos e a Europa. No Brasil, não. Aqui é auto-sustentável."
Para Ziegler, a queima de centenas de milhares de toneladas de trigo, cereais, arroz e outros produtos para produzir biocombustíveis é um fator primordial para as altas do preços dos alimentos. No entanto, ele admitiu que os combustíveis não são os únicos responsáveis.
Apesar de estrategicamente, e em relação à proteção do clima, haver argumentos favoráveis aos biocombustíveis, o relator disse que eles perdem a validade diante da ameaça de catástrofe humanitária.
"Os argumentos não têm validade diante do desastre que nos ameaça. Hoje, o uso e fomento dos biocombustíveis é um crime contra a humanidade", afirmou.
Outros fatores apontados pelo relator da ONU para a disparada da inflação dos produtos alimentícios foram a especulação dos mercados e a politica do FMI (Fundo Monetário Internacional), que, segundo ele, obriga muitos países em desenvolvimento a priorizar sua produção agrícola para a exportação ao mesmo tempo em que têm uma economia voltada à subsistência.


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