São Paulo, sexta-feira, 15 de setembro de 2006

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Bolívia suspende medidas contra Petrobras

Surpreendido pelo confisco de receitas da petrolífera, Planalto pressionou governo vizinho, que decidiu negociar condições

Atacado pela oposição, presidente afirma que será "mais duro" se bolivianos não desistirem de ações contra estatal brasileira

HUMBERTO MEDINA
PEDRO DIAS LEITE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FABIANO MAISONNAVE
DA REPORTAGEM LOCAL

Após pressão do governo brasileiro, a Bolívia decidiu recuar e suspender as medidas de confisco das receitas das refinarias da Petrobras no país vizinho.
No início da noite, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que a Bolívia havia "congelado" a decisão de assumir a rede produtiva de hidrocarbonetos e a venda de gás e derivados de petróleo no país. Horas depois, em La Paz, o governo Evo Morales confirmou a suspensão para que as novas condições sejam negociadas com a companhia brasileira.
"É uma decisão para favorecer, para criar um clima favorável às negociações e aos acordos determinados pelo nosso decreto de nacionalização dos hidrocarbonetos", afirmou o vice-presidente da Bolívia, Alvaro García Linera.
A decisão foi anunciada após uma longa reunião entre o vice-presidente e cinco ministros de Estado, entre eles o titular dos Hidrocarbonetos, Andrés Soliz, que tinha afirmado previamente que a Bolívia não recuaria.
Como o recuo não é definitivo, Lula endureceu um pouco mais o discurso em relação aos bolivianos. "Obviamente que, se a Bolívia teimar em tomar essas atitudes unilaterais, o Brasil vai ter de pensar em como fazer uma coisa mais dura com a Bolívia. Mas confesso a vocês que vou trabalhar para que a gente resolva essa situação de uma forma tranqüila", disse em entrevista à TV Bandeirantes no início da noite.
Após a entrevista, antes de jantar com empresários, voltou a criticar decisões unilaterais como as da Bolívia. "Não podemos aceitar. Todo mundo sabe que paciência é importante nas negociações, mas tem limite."
Apesar disso, não perdeu o tom condescendente em relação a Morales. "A Bolívia é um país muito pobre", disse, acrescentando que o país vizinho precisa obter mais dinheiro com seus recursos energéticos.

Surpreendido
Antes do anúncio da suspensão da medida, os candidatos da oposição atacaram o petista por causa das ações de Morales, que recebeu o apoio explícito de Lula em sua campanha eleitoral. Surpreendido às vésperas da eleição presidencial, Lula considerou a ação boliviana "uma sacanagem", apurou a Folha (leia texto à pág. B5).
Seus ministros e a Petrobras adotaram um tom mais duro ao longo do dia. O Planalto ameaçou encerrar as atividades de refino da estatal no país, e a Petrobras disse que, sem o recuo boliviano, recorreria a todas as instâncias jurídicas.
"O seqüestro de receita [das refinarias] consideramos inaceitável", disse o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, que chegou a anunciar uma "reação à altura da ação". Em maio, quando começou a nacionalização do setor energético boliviano, o discurso do governo era mais ameno.
O Planalto aposta na negociação e se apegou ao fato de que a decisão boliviana foi tomada por meio de uma resolução ministerial, e não um decreto de Morales. Essa diferença abriria campo para uma resolução política do impasse, negociada diretamente com Morales. O chanceler Celso Amorim está em Havana para encontro dos países não-alinhados e pode negociar a questão com Evo Morales.
Ao longo do dia, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) adotou a mesma linha de Rondeau. De acordo com a ministra, a decisão boliviana não foi "adequada para as tratativas que vinham sendo feitas".
O Planalto marcou reunião com os bolivianos para o dia 9, mas Linera pediu ontem a antecipação da data. Caso a negociação não dê resultado, o último recurso do Brasil será recorrer ao Banco Mundial, para que um acordo de proteção de investimentos seja respeitado.
O governo brasileiro ficou sabendo da decisão pelos jornais bolivianos. "Nós tínhamos combinado que não haveria negociação pela imprensa, e nós tomamos conhecimento pela imprensa, inclusive de dados, e valores", disse Rondeau. Por conta da edição da medida, Rondeau cancelou a reunião na Bolívia marcada para hoje.


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