São Paulo, domingo, 15 de novembro de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

As múltis brasileiras e o real forte


Desde 2005, investimento de empresas no exterior tem superado anualmente tudo o que o governo investe aqui

O AVANÇO das empresas brasileiras em território estrangeiro é um daqueles fenômenos que de fato "nunca antes" de Lula haviam acontecido na história deste país. Mas a multiplicação do número e do tamanho das múltis brasileiras apenas recentemente tornou-se assunto do governo, com Luciano Coutinho no BNDES.
Ao menos no tempo, o fenômeno parece bastante associado à grande oferta mundial de dinheiro barato, a juros baixos, verificada em particular a partir de 2003. A estabilidade da economia talvez ajude a explicar a expansão internacional das empresas nos anos mais recentes.
Em 2007, o investimento brasileiro líquido no exterior, investimento "produtivo", chegou a atingir 1,8% do PIB, embora essa conta não seja lá muito precisa (trata-se aqui da média do investimento acumulado em 12 meses, usando como base o PIB mensal em dólares divulgado pelo Banco Central). Em 2008, antes da crise, ainda flutuava em torno de 1,3% do PIB. Na última década, o investimento "produtivo" do governo federal jamais passou de 1% do PIB. O número precisa ser tomado com um grão de sal de resto porque mesmo técnicos que fazem tais estatísticas suspeitam que algum desse investimento direto ("produtivo") é investimento financeiro disfarçado.
Nos anos FHC, o investimento de empresas brasileiras no exterior foi de US$ 1,1 bilhão anual, em média.
Nos anos Lula, de US$ 9,7 bilhões, na média anual, com picos de US$ 24,8 bilhões em novembro de 2006 (no acumulado de 12 meses) e de US$ 25,7 bilhões em setembro de 2008. Em setembro de 2009, o saldo se inverteu (os brasileiros repatriaram mais capital do que investiram lá fora. Vide gráfico ao lado).
A seca de capital e a ameaça de depressão certamente foram os motivos da interrupção da onda. Mas dinheiro barato não é determinante. O que as empresas vão buscar lá fora?
Algumas asseguram reservas de recursos naturais, como a Petrobras e a Vale, por exemplo. Outras não têm mais como crescer no Brasil, têm seu mercado saturado, como algumas manufaturas. Dominar o mercado e ganhar ainda mais escala parece ser o caso de empresas de carnes (como a JBS) e de alimentos.
Muitas procuram o mercado externo para se proteger de flutuações da economia no Brasil. Fincar o pé lá fora pode fazer ainda com que a marca da empresa ou as de seus produtos ganhem fama mundial, beneficiando suas exportações. Por vezes, investir no Brasil é caro demais.
Trata-se de bons motivos, quando não estratégias necessárias para a sobrevivência ou o crescimento das empresas. Se confirmado o fortalecimento da economia brasileira, haverá mais capital para exportar. Ainda mais se o crédito mundial voltar a crescer e se vier mais apoio do BNDES. E muito mais se o real continuar a se fortalecer, o que barateia as compras brasileiras no exterior.

vinit@uol.com.br


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