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Brasil deve evitar erro dos EUA, diz analista
Aposta no mercado interno é correta, mas é preciso cautela para evitar bolha de consumo, diz Jan Kregel, assessor da Unctad
Segundo ele, demanda será "mercadoria rara", e os
países que conseguirem
gerar mais financiamentos
internos sairão na frente
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
O Brasil tem que apostar em
seu mercado interno para continuar crescendo, mas não pode cometer o erro dos EUA e
provocar uma bolha de consumo com poupança externa, advertiu o economista britânico
Jan Kregel.
Nome importante da escola
pós-keynesiana, assessor da
Unctad (conferência da ONU
para comércio e desenvolvimento) e professor do Bard College, nos EUA, Kregel participou na semana retrasada de seminário no Instituto de Economia da UFRJ, no Rio, sobre
"respostas estratégicas à globalização".
Em sua análise, o consumidor americano não voltará a
gastar como antes, quando era
o motor da demanda global, já
que suas compras, que sustentaram a expansão dos EUA nos
anos pré-crise, basearam-se no
endividamento das famílias, e
não no aumento da renda.
"A dívida não pode crescer
para sempre. Uma hora tem
que ser paga. O governo tenta
salvar os bancos, mas o crédito
não terá mais a mesma força."
Ao mesmo tempo, continuou, países que já ajustaram
suas economias à desvalorização do dólar o fizeram com arrocho interno. "A Europa depende da máquina de exportação da Alemanha, que, em vez
de ajustar pelo câmbio, ajustou
pelo salário, em queda nos últimos dez anos. O Japão havia
feito o mesmo antes."
Por isso, concluiu, "a mercadoria rara será a demanda, e os
países que tiverem capacidade
de gerar demanda e financiamento interno estarão em posição privilegiada".
Para ele, a China não pode virar-se para o mercado interno
em curto prazo, já que cerca de
80% de sua população ainda vive perto do nível de subsistência. Já o Brasil "tem maior potencial", desde que os bancos
privados, e não só o BNDES, financiem a indústria.
"O setor bancário privado é
muito lucrativo, mas financia o
governo e depois o consumo, a
taxas altíssimas", afirmou.
O crédito é importante, disse
Kregel, porque não basta estimular a demanda, é necessário
também aumentar a oferta interna. "É preciso construir capacidade produtiva, por exemplo, em bens eletrônicos. Não
se deve pensar que, porque são
produtos simples, não podem
ter impacto tecnológico. Se você começa, pode desenvolver
tecnologia mais avançada."
Ele disse temer que haja uma
acomodação brasileira pela entrada de dinheiro barato e as
exportações de commodities:
"Não podemos só emprestar ao
consumidor para que compre
importados. Isso fizeram os
EUA". Num crescimento saudável, "o financiamento do
consumo deve vir do aumento
de salários, e o financiamento
para negócios deve vir do setor
financeiro."
Para o economista, não é boa
política de longo prazo fiar-se
na exportação de produtos minerais e energéticos para a China. "A China tem essas commodities, apenas ainda não decidiu explorá-las. Hoje é mais fácil transportar de barco do Brasil ou da África do que comprometer recursos na infraestrutura para tirar a matéria-prima
das Províncias do noroeste."
No mesmo seminário, o economista Antonio Barros de
Castro, assessor da presidência
do BNDES, destacou a ascensão da classe C como razão para
o destaque que o Brasil ganha
no exterior. "É um mercado
que ensandece os europeus e
está na hora de cobrar ingresso
para entrar nele", disse, citando
transferência tecnológica e
conteúdo nacional.
Na contramão de Kregel,
Barros de Castro disse não ser a
favor "de produzir tudo no Brasil", como no antigo desenvolvimentismo e afirmou que o
mundo em que exportar produtos agrícolas era coisa de país
pobre não existe mais. Citou a
tecnologia incorporada aos
plantios brasileiros. "O Brasil é
clone para uma revolução agrícola em escala mundial."
Castro também afirmou que
Kregel superestima o mercado
americano e minimiza o chinês.
Segundo ele, a capacidade da
China de produzir produtos baratos, mesmo agregando tecnologia, mudou o padrão de consumo dos "pobres do mundo".
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