|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANTONIO CARLOS LEMGRUBER
Brasil, macroeconomia e política
As condições parecem dadas
para a repetição do "milagre
brasileiro", se bem que a 6%
ou 8% ao ano, em vez de 10%
NO AUGE da ditadura militar,
em 1969 (primeiro ano do
AI-5, seqüestros, morte de
Costa e Silva, posse de Médici), eu
era repórter econômico da Sucursal
do Rio da Folha e fazia a cobertura
do Ministério da Fazenda. O então
ministro da Fazenda, Antonio Delfim Netto, com sua ironia peculiar,
costumava dizer e repetir para os
jornalistas: esses rapazes e moças
que estão nas ruas participando
das passeatas são os mesmos (bem
como seus pais e parentes) que estão comprando carros e imóveis
em grande quantidade. De fato, a
economia começara a crescer aceleradamente em 1968 e o processo
prosseguiu durante pelo menos
seis anos até 1973.
A média de crescimento 1968-1973 foi da ordem de 10% ao ano. É
verdade -e isso é importante para
falarmos de 2008-2010- que durante os seis anos anteriores (1962
a 1967) a economia estivera em autêntica recessão, inclusive com
dois anos de taxas negativas e média certamente inferior à das últimas décadas, talvez 1,5%.
Na altura de 1967/1968, havia,
portanto, um "hiato do produto"
-diferença entre o produto potencial e o PIB (Produto Interno Bruto) efetivo- enorme. Os cálculos
históricos da época, embora feitos
de forma rudimentar (séries de
tendência), sugeriam que o crescimento potencial de longo prazo do
PIB no Brasil era de 7% ao ano,
considerando, por exemplo, um
período longo de 1930 a 1975.
Assim, a economia pôde crescer
10% ao ano -graças aos automóveis e aos imóveis, entre outros setores- sem acelerar a inflação,
com uma reaproximação gradual
na direção do nível do produto potencial em 1973.
Era (e é) normal crescer por algum tempo a taxas acima da média
de crescimento do PIB potencial. É
justamente a recuperação cíclica.
Pois muito bem. Estamos de volta a uma situação muito parecida,
no auge das críticas ao governo Lula. Fala-se do câmbio supervalorizado, da carga tributária, dos gastos públicos, da alta taxa nominal
de juros. Mas o fato é que -assim
como em 1967/68- as condições
parecem estar dadas para uma repetição do "milagre brasileiro", se
bem que a 6% ou 8% ao ano, em vez
de 10% ao ano ou mais.
Tivemos 25 anos de baixo crescimento efetivo, e a chamada "taxa
de crescimento do PIB potencial"
certamente mudou. O crescimento
da população diminuiu acentuadamente e, infelizmente, o crescimento da produtividade desabou.
Esse não é local adequado para
tentar analisar a "queda": pode-se
falar atualmente numa taxa de
crescimento do produto potencial
de 4% -e não mais de 7%.
Portanto, em 2007/2008, o "hiato do produto" é certamente enorme. Há espaço para o Brasil crescer
durante vários anos a taxas superiores a 4% anuais, sem provocar
aceleração da inflação. Tudo indica
que vamos assistir em 2008/2010 a
um novo "milagre brasileiro". Não
interessa se, assim como ocorreu
na ditadura, muita gente torça contra (o curioso paradoxo é que os
torcedores contrários em 2007/
2008 são praticamente os opostos
de 1969).
Nossa expectativa é que -graças
aos automóveis e aos imóveis, entre outros- o Brasil volte a crescer
na faixa de 7% a partir de 2008. Isso deve acontecer, note-se bem,
com ou sem recessão nos Estados
Unidos. E aqui também vale a pena
retornar ao chamado período do
"milagre" (1968-1973). Naquela
época, o resto do mundo não estava crescendo assim tão aceleradamente, chegando ao ponto de se dizer, em 1973, que o Brasil era uma
"ilha de prosperidade".
ANTONIO CARLOS LEMGRUBER, 60, mestre e doutor em
economia pela Universidade de Virgínia, foi presidente do
Banco Central (1985).
Texto Anterior: Outro lado: Dantas nega envolvimento com o caso Próximo Texto: Mercado interno de carros está "bombando", diz Lula Índice
|