São Paulo, sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

Obama e a finança no bico do corvo


Democratas e assessores de Obama divulgam projetos de reforma; Armínio Fraga ajudou a elaborar propostas

OS DEMOCRATAS e os assessores econômicos de Barack Obama deram ontem mais sinais de que o sistema financeiro terá de dançar miudinho sob novas leis. Sugeriram ainda que dinheiro do pacotão Paulson-Bush será usado na recompra de dívida imobiliária, ora na mão de investidores e instituições financeiras, a fim de renegociá-las e reduzir o nível de calotes.
Ontem, Obama conseguiu liberar no Congresso a outra metade do pacote de US$ 700 bilhões.
As diretrizes do plano de reforma financeira foram divulgadas ontem pelo lendário ex-presidente do Fed Paul Volcker, que comandou o "Grupo dos 30" economistas, executivos e ex-banqueiros centrais que as discutiram (entre eles Armínio Fraga). Recomendaram a separação entre atividade bancária mais tradicional e negócios mais arriscados, numa reedição das leis dos anos 1930 (revogadas desde os 90), não se sabe se reedição ampliada, mas bem revista. Pediram rédea mais curta sobre seguradoras e corretoras.
Querem conter a promiscuidade entre agências de avaliação de risco e emissores de dívida. Outra ideia é enquadrar os "quase-bancos" no sistema de supervisão bancária (por exemplo os fundos de aplicação financeira, "mutual funds").
Volcker acha bom reduzir o tamanho dos conglomerados financeiros.
Disse que "sistema financeiro não passou na prova do mercado". Chamou o sistema bancário de "uma bagunça" ("a mess"). No Senado, tramita projeto de lei que permitiria a juízes de concordatas alterar contratos imobiliários.
Objetivo: evitar mais inadimplência e despejos. Mas tal medida coloca os bancos em pânico: se não puderem prever seu fluxo de renda futuro, vão emprestar apenas para pessoas com risco menos zero de crédito, contraindo ainda mais a economia.
Enquanto isso, Citigroup e Bank of America lutam pela vida -o governo vai ter de socorrer a turma de novo. E ativos financeiros que ficaram famosos na crise voltam a apodrecer, após a enésima onda do "pior já passou". Trata-se de títulos atrelados a hipotecas de segunda linha, as notórias "subprime", a imóveis comerciais e também a financiamentos para aquisições de empresas. A desvalorização desses e outros ativos come o capital das instituições financeiras que os detêm.
Tal degradação ocorre mesmo depois de o governo dos EUA ter tomado as seguintes medidas: 1) trocar títulos públicos por títulos podres dos bancos. Como alguns desses ativos jamais voltarão a valer um tostão, na prática o público americano doa dinheiro aos bancos; 2) comprar títulos privados, evitando derrocada ainda maior de parte do papelório e, por conseguinte, do capital dos bancos; 3) tornar-se o segurador de fusões & aquisições de instituições financeiras; 4) emprestar dinheiro a juro camarada aos bancos, com garantias para inglês ver; 5) estatizar instituições financeiras; 6) comprar parte do capital de outras.
A recessão tritura empregos e empresas. Caiu a ficha de que mais pessoas e firmas não pagarão as contas.
Mais títulos atrelados a tais pagamentos perderão valor, o que provoca mais liquidação de ativos, dando novo impulso ao ciclo vicioso. A inadimplência maior, de resto, afeta diretamente o balanço dos bancos.

vinit@uol.com.br


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