São Paulo, terça-feira, 16 de março de 2010

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entrevista

Rogoff defende intervenção "amiga" no câmbio do país

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

No mundo pós-crise, Brasil e demais emergentes estão condenados a assistir a suas moedas se valorizarem indefinidamente, minando a competitividade das exportações. Para o economista Kenneth Rogoff, da Universidade Harvard, esses países terão de tomar medidas para segurar a taxa de câmbio. Segundo o economista, o problema é como fazer isso de forma "amiga" do mercado, sem levar à fuga de capitais, causando um estrago maior.
"Não tenho visto medidas inteligentes", disse. Ex-economista-chefe do FMI, Rogoff lança no Brasil "Desta Vez é Diferente: Oito Séculos de Delírios Financeiros" (Elsevier), um dos livros mais ácidos sobre a crise, que tem uma única mensagem: "Nós já estivemos aqui antes".
Leia entrevista.

 

FOLHA - O senhor afirma que um grande fluxo de capital pode dar a falsa impressão de que o governo promoveu um forte crescimento. Esse é o caso do Brasil, que deve crescer 6% em 2010?
KENNETH ROGOFF -
Não estava me referindo especificamente ao Brasil. Mas um país que tenha forte entrada de capital por cinco anos parecerá que tem uma situação melhor do que tem. Muito desse crescimento que o Brasil terá se deve à base de comparação, com a saída da recessão. O Brasil tem muito para ganhar em produtividade e reformas microeconômicas.

FOLHA - O Brasil e outros emergentes terão de tomar medidas para evitar a alta de suas moedas por conta desse capital?
ROGOFF -
É sempre importante ficar de olho nas entradas de capital. Os países nessa situação podem adotar medidas "amigas" do mercado para evitar uma entrada excessiva de recursos, que pode ser inconveniente. Para evitar que o real suba, talvez o governo tenha de adotar medidas nesse sentido.

FOLHA - Algum país conseguiu adotar medidas inteligentes nesse sentido? Qual a sua avaliação sobre o imposto aos investidores estrangeiros no Brasil?
ROGOFF -
A Índia e alguns países da Ásia estão prestando muita atenção nesse assunto; o Brasil também. E o Brasil tem mais condições de fazer isso porque tem um mercado financeiro muito mais fluído, o que é bastante saudável. Não tenho visto tantas medidas inteligentes dos países emergentes para evitar que suas moedas tenham excesso de volatilidade. O problema é como fazer.

FOLHA - O esquecimento faz parte da natureza dos mercados?
ROGOFF -
Não só dos mercados. As pessoas realmente se esquecem. Além de esquecer, negam que algumas coisas tenham acontecido! As crises financeiras acontecem com uma grande regularidade. A Grécia, que todos olham agora, passou quase toda a sua história em default (calote). O Brasil é um dos países que mais estiveram em moratória. O país esteve em default em um a cada quatro anos. Na Grécia, foi um a cada dois anos. Quantas pessoas sabem que a Grécia tem um histórico pior do que o Brasil? Quase ninguém.

FOLHA - Daqui a quanto tempo a crise atual será esquecida?
ROGOFF -
Diria que demora uns 15 anos; é o tempo em que uma criança se torna adolescente e acha que está em um mundo diferente. Imagino que hoje algumas pessoas no Brasil não saibam como era a inflação...

FOLHA - Qual país será a próxima Grécia?
ROGOFF -
Há vários países vulneráveis na Europa: Hungria, Espanha, Irlanda, Portugal. Não acredito que a Europa terá tanto sucesso em resolver esses problemas.

FOLHA - E fora da Europa?
ROGOFF -
Há um número grande de emergentes com uma situação bastante boa. Brasil e América Latina estão melhores do que a Europa.

FOLHA - Por que poucos países nunca entraram em default?
ROGOFF -
Parte da razão é que esses países precisavam mais da comunidade financeira. Mas é uma amostra tão pequena que é difícil saber.


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