São Paulo, terça-feira, 16 de março de 2010

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Brasil avança na retaliação aos EUA, que fazem ameaça

EUA veem "preocupações sobre um potencial impacto no clima para investimentos no Brasil"

Governo Obama se diz "decepcionado" com anúncio de retaliação do Brasil, que deve se concentrar em remédios e produtos culturais

EDUARDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ANDREA MURTA
DE WASHINGTON

A proposta do governo brasileiro para a retaliação cruzada contra propriedade intelectual dos EUA, que se concentrou na quebra de monopólios sobre medicamentos, produtos químicos e biotecnologia, além da suspensão de direitos autorais de produtos culturais do país, foi duramente criticada ontem em Washington.
Além de fazer uma ameaça velada a investimentos no Brasil, os EUA reagiram afirmando que o comércio bilateral poderá ser prejudicado caso as medidas anunciadas na semana passada sejam implementadas. "Algumas propostas levantam preocupações sobre um potencial impacto no clima para investimentos no Brasil", afirmou, em nota, uma porta-voz do representante americano para o Comércio, Ron Kirk.
No Brasil, o aumento da concorrência nos setores eleitos para retaliação de propriedade intelectual deve baratear medicamentos, livros, filmes, séries e músicas produzidos nos EUA.
O efeito é oposto ao causado pela retaliação de bens, na qual as 102 mercadorias norte-americanas já listadas podem ficar mais caras a partir de abril.
A relação de medidas -que por 20 dias estarão sob consulta pública- revela que o Brasil pretende atingir os EUA nos quatro privilégios dos titulares de propriedade intelectual: produção, comercialização, importação e licenciamento. O impacto em 2010 pode chegar a US$ 238 milhões.
O primeiro rol de medidas trata da suspensão por tempo determinado da proteção dos direitos de patentes e sobre a execução de obras musicais. Ou seja, as informações sobre fórmulas e processos de fabricação de medicamentos, produtos químicos agrícolas e cultivares estarão durante esse período sob domínio público, assim como a execução de músicas de artistas americanos.
"Provavelmente essa medida não será aplicada a produtos cuja patente ainda tem prazo longo de validade", afirmou o diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey. Segundo ele, não valeria a pena para a indústria adaptar o parque instalado para produzir produtos que teriam suas patentes novamente protegidas ao fim da retaliação.
Outro tipo de aplicação poderá ser a liberação do licenciamento de produtos sem a autorização ou remuneração aos titulares. No entanto, a liberação para a quebra de monopólios nessa modalidade, que inclui a edição de livros e a veiculação de séries de TV e filmes, precisará de autorização do governo.
Além disso, o governo poderá confiscar sob o título de direito comercial parte dos royalties devidos por empresas brasileiras às matrizes americanas. A lista publicada ontem também inclui a possibilidade de aumento dos custos para que empresas e pessoas norte-americanas registrem ou renovem a proteção a patentes.
O Brasil ganhou na OMC o direito de retaliar em US$ 829 milhões neste ano os EUA por subsídios ilegais ao algodão.

"Decepção"
"Estamos decepcionados por o Brasil ter dado esses passos.
Vamos continuar a trabalhar com o Brasil e com o Congresso dos EUA para encontrar uma solução para os temas nessa disputa sem que sejam necessárias as medidas anunciadas", diz nota do governo dos EUA.
Fontes do governo americano afirmaram à Folha que já está na mesa uma proposta preliminar para acordo que evite a aplicação da retaliação por parte do Brasil. Segundo negociadores brasileiros, porém, não há proposta concreta.
Membros do governo e empresários brasileiros afirmam que veriam com bons olhos uma proposta para facilitar a importação pelos EUA de itens como carne, álcool ou suco de laranja, antes de discutir o subsídio ao algodão diretamente.
Alguns empresários sugeriram ainda que a compensação seja feita por meio de investimentos americanos na pesquisa sobre o algodão.

FOLHA ONLINE
Veja a relação de medidas que podem ser aplicadas
www.folha.com.br/100744



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