São Paulo, domingo, 16 de abril de 2006

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Moradores bloqueiam estrada há 67 dias

DA ENVIADA A GUALEGUAYCHÚ

"Qualquer estudo ambiental sério vai demonstrar que as indústrias contaminam. Queremos as papeleiras longe daqui", disse Estela de Lanterna, aposentada da cidade argentina de Gualeguaychú, enquanto passava a caneca de mate aos companheiros.
Na última quinta-feira, o grupo da assembléia de moradores fazia plantão no bloqueio na principal passagem terrestre entre Uruguai e Argentina, que já dura 67 dias. A última interrupção total começou no dia 3, sem data para terminar -embora com cada vez mais pressão contrária.
Do outro lado da ponte sobre o rio Uruguai, a cerca de 50 km, está a uruguaia Fray Bentos, onde se erguem duas fábricas de pasta de celulose. Só os poucos moradores que vivem lá e trabalham na Argentina e pequenos fazendeiros da região podem passar. Os demais têm que desviar cerca de 300 km para encontrar a única passagem hoje liberada entre os vizinhos.
As empresas de transporte uruguaias ameaçam parar de levar cargas e pessoas à Argentina se os piquetes continuarem depois da Semana Santa.
Apesar das críticas recentes da Casa Rosada aos bloqueios, os assembleístas seguem com o protesto, sem ameaças de desalojamento e com infra-estrutura da prefeitura de Gualeguaychú.
A prefeitura cedeu um carro de apoio e provê policiamento na área, onde há barracas e banheiros. Os manifestantes explicam o apoio oficial que irrita os uruguaios: a cidade acredita que, com as fábricas, vai perder seu apelo turístico. Além do Carnaval mais tradicional do país, com direito a sambódromo, há parques e praias ao longo do rio.
Nenhum estudo completo do impacto ambiental das fábricas, aceito por argentinos e uruguaios, foi feito até agora. Um relatório do Banco Mundial, um dos potenciais financiadores das obras, recomenda que as indústrias forneçam maiores informações de seus métodos de produção.
O que é sabido é que, se instaladas, as fábricas de pasta de celulose terão ao menos um inconveniente para o turismo: o cheiro característico -semelhante ao de ovo podre- que liberam.
Mas para os moradores de Fray Bentos, também cidade turística da região, a relação custo/benefício vale a pena. "Toda fábrica contamina alguma coisa, mas não é como eles dizem. Agora temos emprego", diz Rodolfo Soñora, 52, vigilante de uma das indústrias, a Botnia.
Ele fazia parte da "Comissão de Apoio a Fonte de Trabalho", entidade criada há cinco anos, quando piorou a situação econômica de Fray Bentos, que tem 22 mil habitantes e hoje é um pólo decadente de exportação de carne. Soñora ganhava 6.000 pesos uruguaios, quando arranjava emprego na construção civil, e agora ganha 16 mil (R$ 1.400).
As duas fábricas juntas -Ence e Botnia- vão gerar cerca de 8.000 empregos diretos e indiretos, num dos maiores complexos da indústria de papel do mundo.


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