São Paulo, domingo, 16 de maio de 2010

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China usa crédito como moeda de troca para vender mais à AL

Chineses aplicam fórmula implementada na África, com oferta de linhas de financiamento em troca de suas mercadorias

Há uma década, os chineses movimentavam US$ 10 bi anuais em negócios com países latino-americanos; em 2009, foram US$ 201,5 bi

JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo chinês nega que pretenda ser a maior potência do mundo, mas suas transações comerciais e seus investimentos e financiamentos no exterior mostram que o discurso está distante da realidade, principalmente na América Latina.
Há uma década, os chineses movimentavam US$ 10 bilhões por ano em negócios com os países latino-americanos. Em 2009, foram US$ 201,5 bilhões, cifra que vem crescendo 40% ao ano desde 2006.
Resultado: a China já desbancou os EUA como principal parceiro comercial no continente, aplicando na região a fórmula implementada na África: oferta de linhas de financiamento e investimentos diretos em troca de suas mercadorias.
A Folha apurou que há pelo menos US$ 45 bilhões em linhas de crédito disponíveis nos bancos chineses para servirem de moeda de troca nas negociações com a América Latina.
A Huawei, gigante chinesa dos equipamentos de telecomunicações, é uma das empresas que oferecem esses "benefícios". Apenas a Oi tomou US$ 1,3 bilhão com bancos chineses desde 2008.
"Servimos somente de facilitadores entre os bancos chineses e os nossos clientes", afirma Marcelo Mattos, diretor de marketing da Huawei.
Empresas de outros setores também usam esses artifícios. Evidentemente, não há nada de errado, afinal, crédito extra no mercado é sempre bom.
O problema é que essa relação comercial atrelada aos "benefícios" cria dúvidas sobre o que é público e o que é privado nessas negociações e gera desequilíbrio em favor da China.
Em 2008, dado mais recente consolidado pela Organização Mundial do Comércio, o deficit da América Latina com a China chegou a US$ 10,9 bilhões, dos quais US$ 3,6 bilhões do Brasil.

Na ponta do lápis
A China já é o segundo parceiro comercial da Costa Rica, ao movimentar US$ 3 bilhões no ano passado. Em troca, comprou US$ 300 milhões em títulos da dívida do país.
Para a Venezuela, foram liberados US$ 12 bilhões em linhas de crédito sob a condição de um aumento de 380 mil barris diários de petróleo exportados para a China.
No Brasil, a quantia foi de US$ 10 bilhões para que a Petrobras aumentasse em 200 mil barris por dia suas exportações nos próximos oito anos.
A Argentina também teve US$ 10 bilhões em crédito, mas os dois países entraram em choque porque os argentinos denunciaram fabricantes chineses por práticas antidumping, no início deste ano.
Segundo Xu Yingzhen, subdiretora do Ministério da China para a América Latina, 64% de todas as reclamações da região foram feitas pelos vizinhos argentinos.
"Não é normal. Caso não cheguemos a um acordo, a China vai retirar seus investimentos na Argentina", disse.
Nesse ritmo, os especialistas acreditam que há risco de que as empresas latino-americanas se transformem em fornecedoras de matéria-prima, sustentando o crescimento chinês, sem conseguir promover a venda de seus manufaturados.


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