São Paulo, quarta-feira, 16 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

COMENTÁRIO

Legado de Greenspan no Fed continua em questão

DO "FINANCIAL TIMES"

Parece um tanto indigno que Alan Greenspan tivesse de depor perante um comitê do Congresso norte-americano ontem para ser confirmado uma vez mais como presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA). Seu novo mandato, o quinto que ele cumprirá à frente da instituição desde que substituiu Paul Volcker em 1987, não estava em dúvida. Mas, com o final de seu período à frente do Fed se aproximando -o prazo expira em 2006, quando termina seu mandato de 14 anos como membro do conselho do banco central-, o legado de Greenspan continua em questão.
As recentes altas nos preços ao consumidor causaram preocupação quanto à possibilidade de que Greenspan esteja desperdiçando a obra em progresso que herdou de Volcker e ampliou durante todos esses anos: uma vitória secular sobre a inflação elevada.
Os temores de que esse estado de graça do Fed seja perdido, agora, devido à demora em elevar os juros, parecem exagerados. O surto de inflação registrado nos primeiros meses do ano tende a se moderar. A alta deve muito a elementos específicos como um aumento nos preços dos aluguéis imputado aos proprietários de imóveis. Com o mercado de trabalho e a economia exibindo ainda um grau considerável de elasticidade, o custo da unidade de mão-de-obra se mantendo baixo e as taxas de juros de longo prazo recuando de forma considerável, o risco de que crescimento e inflação escapem ao controle não é grande o bastante para justificar aumentos grandes ou preventivos nas taxas de juros. Os dados reconfortantes sobre os preços ao consumidor divulgados ontem, mostrando alta próxima às expectativas do mercado e abaixo dos temores dos pessimistas, justificam alta de 0,25 ponto percentual, e não de 0,5 ponto percentual, na taxa de juros básica, quando o conselho do Fed se reunir para discutir a política monetária.
Na verdade, uma ameaça mais séria ao legado de Greenspan deriva dos desequilíbrios que continuam a existir depois do boom do final dos anos 90 e da política fiscal frouxa que suas intervenções públicas no debate sobre cortes de impostos e déficits orçamentários tiveram o efeito de encorajar no começo do governo Bush.
Os prognósticos mais desfavoráveis de seus críticos ferrenhos, indicando que os EUA afundariam em um mar de dívidas pessoais e empresariais, não se concretizaram. Manter taxas baixas de juros por diversos anos permitiu que os domicílios e as companhias consertassem os estragos em seus balanços.
Mas nenhuma economia com déficit em conta corrente da ordem de 5% do PIB (Produto Interno Bruto), avaliações elevadas e pouco realistas no mercado de ações e um índice de poupança insustentavelmente baixo pode alegar ter atingido um equilíbrio seguro. Algumas das piores acusações talvez tenham sido rechaçadas, mas o júri ainda não chegou a um veredicto sobre os anos de Greenspan no comando da política monetária.


Tradução de Paulo Migliacci


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Clube do milhão: Sob Lula, cresce total de milionários
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.