São Paulo, quinta-feira, 16 de junho de 2005

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Para analistas, BC só errou na dose

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O Banco Central exagerou um pouco na dose, mas usou o remédio correto. O ciclo de alta dos juros, que terminou ontem, poderia ter acabado alguns meses antes, na avaliação de analistas ouvidos pela Folha. Mas todos dizem acreditar que o aperto que começou em setembro era necessário para segurar a inflação.
A escalada dos juros era inevitável. "Havia um ritmo de crescimento muito intenso, combinado a um choque de custo por causa do aumento dos preços das commodities", lembra Luis Suzigan, analista da LCA.
Mas Suzigan está entre os analistas que avaliam, apesar de não usar a expressão, que o BC foi "mais realista que o rei". Ele elenca os custos do excesso de conservadorismo da política monetária:
1) os juros reais altos atraíram capital especulativo, ajudando a alimentar ainda mais a tendência de queda da taxa de câmbio;
2) o câmbio reduzido afetou os investimentos dos exportador, engavetados ou adiados por conta da perda de rentabilidade;
3) o BC acabou comprando uma inflação latente, ao deixar o câmbio cair muito, já que, quando o real se desvalorizar, a tendência é pressionar a inflação.
A inflação latente, diz Suzigan, cria um risco para a política monetária: ter que interromper mais cedo o processo de redução de juros que, prevê a maioria do analistas, deve começar no último trimestre deste ano.
Antonio Licha, economista do grupo de conjuntura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), chama a atenção para o que ele chama de "miopia" do BC, que "olhou demais para a inflação corrente e pouco para a futura".
Como Suzigan, ele concorda que o aperto foi necessário, mas diz que ele já poderia ter acabado. "A análise das perspectivas de inflação mostrava que a tendência era de queda a partir de maio. O juros poderiam ter sido mantidos já em março", diz.
Licha ressalta que "o teto da meta de inflação não está em perigo há alguns meses. O que interessa é não ultrapassar o teto de 7% e tentar minimizar os efeitos colaterais do aperto monetário no nível de atividade e da taxa de câmbio".
Mais até do que o impacto direto na atividade econômica, reduzindo a procura por bens e serviços por meio dos juros mais altos, o que preocupa os analistas são os efeitos negativos das altas dos juros no câmbio e, por tabela, nos investimentos dos exportadores.
Heron do Carmo, presidente do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia de São Paulo), lembra que o repasse do câmbio para os preços é um fenômeno assimétrico: mais rápido e forte na alta, mais lento e fraco na queda da taxa de câmbio.
Ele diz que as altas de juros que ocorreram a partir de janeiro foram desnecessárias. "O recuo da inflação que está ocorrendo agora já era favas contadas em dezembro", comenta Heron. Ele até arrisca uma interpretação para o excesso de conservadorismo do Copom. A autoridade monetária, diz ele, poderia estar se antecipando ao ano eleitoral, levando os juros a níveis mais altos do que o necessário agora, para não ter que voltar a elevá-los em período eleitoral, onde as pressões e turbulências seriam maiores.
O BC foi conservador, todos concordam, mas nem todos avaliam que essa não é a atitude que a autoridade deveria ter tomado, ainda que tenha pecado por um excesso de conservadorismo. Melhor excesso que falta, dizem. "Política monetária é isso. O BC tem que ser mais conservador que a média", diz Alexandre Póvoa, economista do Banco Modal.
Póvoa, apesar de avaliar que as últimas duas altas realizadas pelo Copom têm efeito "contestável", faz uma avaliação positiva do desempenho do BC durante o período de aperto. Ele tem só um receio. O de que o Copom também seja muito conservador na hora de baixar os juros, atrasando o início do processo de redução. Mas, diz Póvoa, "consideradas as imperfeições da economia brasileira e da meta relativamente apertada", o BC está indo bem.
Carlos Fagundes, professor de finanças do Ibmec-SP, elenca algumas das "imperfeições": a prática de indexação de preços de serviços públicos e a pouca experiência brasileira com sistema de metas de inflação.
Mas, diz Fagundes, "não existe remédio melhor e menos indolor para acabar com a inflação". A única maneira de conter preços, argumenta, é reduzindo o crescimento. "O governo tem sido perseverante e corajoso neste sentido", argumenta.


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