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Mantega impõe "quarentena" a secretário
Júlio Gomes de Almeida, da Secretaria de Política Econômica, não pode dar entrevistas ou comparecer a seminários
"Lei do silêncio" foi adotada
porque, para técnicos, ele
ainda carrega uma visão de
iniciativa privada e não "se
enquadrou" ao governo
JULIANNA SOFIA
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Prestes a completar dois meses no Ministério da Fazenda, o
secretário de Política Econômica, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, 54, vem sendo mantido
sob uma espécie de quarentena. Por determinações superiores, ele não concede entrevistas
à imprensa, não comparece a
seminários ou conferências e
participa de forma discreta de
cerimônias oficiais.
A "lei do silêncio" foi decretada pelo próprio ministro Guido
Mantega (Fazenda), que vem
evitando a exposição de Almeida para fugir de polêmicas. Na
avaliação de técnicos do ministério, o secretário não está "enquadrado" e ainda carrega a visão de quem está na iniciativa
privada. O temor de Mantega é
dar início a nova fase de "fogo
amigo" no governo.
Com suas funções na SPE esvaziadas por causa do calendário eleitoral -que inviabiliza a
discussão de projetos de reformas estruturais no Congresso-, Almeida ficou com a missão de trabalhar o projeto de
mudança nas regras cambiais e
dar o suporte técnico para os
discursos políticos do governo,
especialmente do ministro
Mantega, sobre questões econômicas.
O secretário sempre teve um
bom relacionamento com o ministro e sua escolha reforçou a
mudança no perfil do ministério. Diferentemente do seu antecessor, Mantega tem uma visão mais desenvolvimentista e
constantemente tromba com o
conservadorismo do Banco
Central, alvo de duras críticas
quando Almeida estava na iniciativa privada.
Apesar da forte ligação entre
os dois, há duas semanas o secretário causou um mal-estar
dentro do ministério.
Ele foi pivô de um episódio
que irritou o ministro: a divulgação de dados sobre investimentos públicos. O estudo fazia um balanço dos investimentos do governo federal em infra-estrutura durante a gestão
petista comparativamente aos
realizados no governo FHC e
foi elaborado por Almeida e sua
equipe.
O trabalho foi criticado por
especialistas em gastos públicos e pela oposição, que acusaram o ministro de maquiar os
números para fazer campanha
do governo. Mantega foi obrigado a rebater publicamente
tais declarações e até hoje se irrita quando lembra o ocorrido.
Nos bastidores do Ministério
da Fazenda, o que se comenta é
que o estudo produzido pela
SPE provocou um constrangimento geral, pois não houve
uma coordenação com a equipe
do Tesouro Nacional.
Apesar dos contratempos,
Almeida ainda é considerado
na Fazenda como o interlocutor mais próximo do ministro,
que tem delegado várias atribuições ao secretário. Em reuniões internas, ele fala em nome de Mantega ao se dirigir aos
demais secretários. Por esse
perfil, esperava-se que ele estivesse mais atuante também na
linha de frente.
A cautela do ministro deveria
se restringir às primeiras semanas, quando o novo secretário
ainda estava conhecendo o ministério e trocando o terno da
iniciativa privada pelo uniforme do setor público.
O cuidado de Mantega com o
novo colaborador ficou claro na
posse. O ministro não deixou o
secretário nem sequer se manifestar. A estratégia da Fazenda
de manter o secretário fora do
foco das atenções tem levado
seu adjunto, Otávio Damaso, a
representar a SPE. É o adjunto
que muitas vezes tem conversado com a imprensa. Almeida
se restringe a responder demandas específicas de jornalistas próximos ou a dar declarações eventuais quando é abordado inesperadamente.
Em entrevista recente à rádio Jovem Pan, uma das exceções do seu modo de agir, o secretário demonstrou que sua
veia crítica continua em plena
forma. Ele disse que a qualidade do gasto do governo é ruim e
destacou que há um processo
em curso de aumento das despesas correntes.
Sobrou até para o pacote
agrícola, que o próprio Almeida
ajudou a arrematar assim que
assumiu a secretaria. Para o secretário, embora as medidas
anunciadas fossem necessárias, é preciso evitar esse tipo
de aumento de despesa para
não comprometer as contas
públicas.
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