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OPINIÃO ECONÔMICA
Por uma lei de responsabilidade regulatória
GESNER OLIVEIRA
É urgente diminuir o risco
regulatório no Brasil. A parceria público-privada sobre a
qual tanto se fala só tem sentido
com regras estáveis. Da mesma
forma, o investimento direto estrangeiro requer previsibilidade.
Uma lei de responsabilidade regulatória (LRR) é importante para ambos.
A LRR deveria ser uma lei geral
das agências reguladoras para
aprofundar e corrigir o modelo
criado nos anos 90. O Executivo
precisa entender que a chance de
retorno ao monopólio estatal é
nula. As agências vieram para ficar. Cada declaração ambígua
sobre esse assunto é uma ducha
de água fria no investimento.
E a economia precisa urgentemente de inversão produtiva. O
investimento direto estrangeiro
acumulado no primeiro semestre
deste ano (US$ 3,5 bilhões) representa apenas 36% do montante
observado no mesmo período de
2002 e 26% do investimento observado no mesmo período em
2000. A previsão do Banco Central para o investimento direto de
2003 despencou de US$ 16 bilhões
para US$ 10 bilhões.
Os investimentos externos em
energia e telecomunicações caíram de US$ 3,74 bilhões no primeiro semestre de 2002 para US$
1,31 bilhão no primeiro semestre
deste ano. Segundo a Abdib (Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base), inversões da ordem de US$ 10 bilhões a US$ 12 bilhões foram canceladas em razão da indefinição
dos modelos regulatórios.
A formação de capital está desabando. A construção civil, que
responde por dois terços do investimento nacional, apresentou
queda de 11% no segundo trimestre deste ano relativamente ao
mesmo período do ano anterior.
O terço restante, formado pelas
máquinas e equipamentos, também deve apresentar queda, uma
vez que no primeiro semestre a
produção nacional desse setor
apresentou declínio de 2,1% e as
importações de bens de capital
caíram 30%.
No setor elétrico a situação não
é diferente. De acordo com a
Abradee (Associação Brasileira
de Distribuidoras de Energia Elétrica), a indefinição do novo modelo do setor colocou em compasso de espera quase 30 das 40 obras
de geração de energia atualmente
em andamento.
Diante da indefinição do Executivo, é possível imaginar um
papel mais ativo do Legislativo
em matéria regulatória. O projeto
de lei apresentado recentemente
pelo senador Arthur Virgílio
(PSDB-AM) que cria uma instância examinadora e aconselhadora vai nessa direção.
O projeto Telma de Souza (PT-SP) segue um caminho perigoso
ao facilitar demasiadamente a
demissão de dirigentes das agências, pois lhes retira autonomia, o
que aumenta o risco político-regulatório. Seria melhor tornar
para valer as sabatinas do Senado para a aprovação dos nomes
que o Planalto indica para regular setores estratégicos e complexos.
Mas o Executivo também pode
aperfeiçoar o controle de qualidade sobre as agências. A experiência dos EUA é útil nesse sentido.
Nos EUA, existe um órgão (Departamento de Informações e Assuntos Regulatórios, Oira, na sigla em inglês) que faz parte da estrutura do Departamento de Gestão e Orçamento, vinculado ao
Poder Executivo. Funciona como
um regulador dos reguladores.
Cabe ao Oira estabelecer um canal de comunicação e fiscalização
entre a sociedade e as agências reguladoras, analisar os impactos
das diversas regulações editadas
pelas agências e, de particular relevância para o caso brasileiro,
evitar conflitos entre as ações das
diversas agências.
Destacam-se duas exigências às
agências do EUA. A primeira é
preparar uma agenda de todas as
regulações em desenvolvimento
ou revisão, na data e na maneira
especificadas pelo administrador
da Oira. A segunda é preparar
um plano regulatório que contenha um compromisso objetivo
quanto aos objetivos a serem perseguidos e como esses últimos se
articulam com as demais políticas públicas.
Uma lei geral das agências na
esteira do Administrative Procedure Act americano seria oportuna no caso brasileiro. Nortearia a
atuação das agências, exigindo
transparência e ditando o procedimento de julgamento administrativo com contraditório e celeridade; exigiria consulta pública e
análise de custo-benefício para as
normas mais importantes.
O Judiciário também precisa
mudar. A morosidade, a falta de
especialização em matérias de
elevado conteúdo técnico e a "indústria de liminares" geram ainda mais incerteza regulatória.
Uma mudança firme na direção apontada acabaria com picuinhas ideológicas acerca das
agências reguladoras. Significaria um avanço, conferindo maior
segurança jurídica em um momento no qual o risco regulatório
constitui um dos principais entraves ao investimento, à produção e
ao emprego.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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