São Paulo, terça-feira, 16 de agosto de 2005

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"PAÍS DO MENSALÃO"

Presidente da Chevron afirma que companhia perde mercado por causa de adulteração e sonegações

Múlti reclama de fraudes em combustíveis

DA REPORTAGEM LOCAL

Carlos Roberto Fernandes, presidente da Chevron Brasil, que opera no país desde 1915, por meio da Texaco -que, em 2002, se fundiu com a Chevron-, admite que não é fácil operar no mercado brasileiro, caracterizado pela adulteração de combustíveis e pela sonegação fiscal. "A sonegação afeta a concorrência sadia e a adulteração, o consumidor."
Para ele, a legislação brasileira não é suficiente para punir os que trabalham ilegalmente no setor. "Há muitas leis em vigor tratando do mesmo tema. Isso facilita a vida dos fraudadores. A ANP [Agência Nacional do Petróleo] precisa de recursos, aparentemente congelados, para a fiscalização." Leia a seguir os principais trechos da entrevista com o presidente da Chevron, que prevê faturar US$ 4 bilhões no Brasil neste ano. (FÁTIMA FERNANDES)
 

Folha - Como é concorrer num mercado, como o brasileiro, onde existe muita adulteração de combustíveis e sonegação fiscal?
Carlos Roberto Fernandes -
A Chevron tem tradição de ética nos negócios e é dessa forma que quer ser reconhecida. O mercado de combustíveis no Brasil ainda está em processo de evolução. A desregulamentação, iniciada por volta de 1993, foi atingida pelo enfraquecimento da economia em 1998, quando surgiu um grande número de fornecedores pequenos, queda do consumo e das margens, resultando no forte crescimento da sonegação fiscal e da adulteração de produtos. Sem instrumentos adequados, regulamentação e fiscalização, a ANP logo se viu diante de um quadro que requeria urgentes reconfigurações regulatórias, iniciadas em 1999. A adulteração de combustíveis e as fraudes fiscais causam grandes prejuízos ao Estado e aos consumidores.

Folha - Quais as formas de sonegação que mais lesam a empresa?
Fernandes -
Estimamos que, só no álcool, a sonegação de PIS/Cofins seja da ordem de 50% do produto comercializado e que a sonegação (incluindo ICMS) deve atingir cerca de R$ 1 bilhão por ano, só no álcool. Já houve casos, em SP, de "combustível" fabricado em laboratório clandestino sem uma gota de petróleo. A indústria de solventes necessita de um novo marco regulatório porque o mercado está inundado de solventes e o consumo legal não justifica esse volume.

Folha - Empresas do setor já declararam que tiveram de vender com preços abaixo do custo para enfrentar concorrentes desleais. Isso já aconteceu com a Chevron?
Fernandes -
As empresas sérias do mercado estão constantemente ajustando seus custos para poder competir. O setor trabalha com margens pequenas. Isso faz com que algumas empresas que participam desse mercado procurem aumentar suas margens por meio da sonegação e da adulteração, gerando uma competição danosa, tanto para os revendedores como para as distribuidoras.

Folha - A empresa aprova os postos sem bandeira? Isso é bom ou ruim para o consumidor?
Fernandes -
Os postos bandeira branca são uma realidade do mercado brasileiro, como de outros que já foram desregulamentados. Eles cumprem seu papel no mercado e não são necessariamente prejudiciais para o consumidor. O problema é quando um posto ou distribuidora procura aumentar suas margens por meio de procedimentos que envolvem fraudes fiscais ou adulteração.

Folha - O setor de combustível é considerado um dos campeões em sonegação fiscal. Como isso afeta o trabalho da empresa no Brasil?
Fernandes -
A sonegação afeta o trabalho de qualquer empresa que opera de maneira ética. No mercado de combustíveis isso foi e ainda é grave. Mas recentes análises indicam uma redução dessa sonegação em razão de ações conjuntas entre ANP, Ministério Público e Polícia Federal.

Folha - A venda de solventes como combustível abalou a empresa?
Fernandes -
Não é possível precisar o quanto do mercado foi perdido exclusivamente por conta da adulteração por meio de solventes. A perda sofrida foi decorrente de todos os aspectos relacionados aos problemas enfrentados pelo mercado desde a sua desregulamentação. No nosso caso, a perda no mercado brasileiro foi de cerca de três pontos percentuais.

Folha - Que medidas poderiam ser adotadas para atenuar a situação?
Fernandes -
Essas medidas passam pela intensificação da fiscalização policial e tributária, pelo endurecimento das legislações estaduais, pelo aumento da fiscalização da ANP e pelo endurecimento das penalidades nas ocorrências de fraudes e sonegação. Nós, como indústria, estamos trabalhando com diversas entidades federais e estaduais nesse sentido. Os esforços conjuntos dos governos federal e estaduais têm permitido intensificar a fiscalização, mas a ANP se ressente de recursos para ampliar a sua fiscalização.

Folha - A crise política afeta de que forma a empresa no Brasil?
Fernandes -
Crises políticas afetam a vida de todos e temos confiança de que as instituições irão encontrar as devidas soluções para os problemas, na menor margem de tempo, de modo que a economia não venha a ser afetada.

Folha- A empresa já pensou em deixar o país?
Fernandes -
Nunca pensamos em deixar o país. A marca Texaco comemorou 90 anos no Brasil e pretende permanecer forte e competitiva no mercado. A Chevron confia no país e o considera estratégico para seus negócios.


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