São Paulo, sexta-feira, 16 de novembro de 2007

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Idéia de mudar Ipea existe desde Dirceu

Então ministro disse que era preciso "estatizar" o instituto; objetivo é abrir espaço para corrente "desenvolvimentista"

Desde a posse de Pochmann, em agosto, publicações foram modificadas e outros quatro diretores já haviam sido substituídos

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

"É preciso estatizar o Ipea." A frase atribuída ao então todo-poderoso ministro José Dirceu (Casa Civil) no início do primeiro mandato do presidente Lula é tida por integrantes do próprio governo ouvidos pela Folha como a base das reformas que estão sendo promovidas no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
O afastamento de quatro pesquisadores que tinham pensamento econômico divergente do predominante no governo, divulgado ontem pela Folha, segue a linha adotada após a transferência do órgão da tutela do ministro Paulo Bernardo (Planejamento) para a do ministro Mangabeira Unger (Extraordinário de Assuntos Estratégicos), há alguns meses.
Desde agosto, quando o novo presidente do instituto nomeado por Unger, o petista Marcio Pochmann, tomou posse, publicações foram modificadas e outros quatro diretores já haviam sido substituídos. A maioria deles foi trocada por profissionais de fora do instituto.
Entre eles, Ana Peliano, que não era tolerada no PT por ter sido a principal auxiliar da ex-primeira-dama Ruth Cardoso no programa Comunidade Solidária. A socióloga ocupava a diretoria de Estudos Sociais do instituto. Também deixaram o cargo de direção Paulo Levy (Estudos Macroeconômicos), João Alberto De Negri (Estudos Setoriais) e José Aroudo Mota (Estudos Regionais).
Segundo a Folha apurou, a idéia com a reestruturação é tentar abrir mais espaço para a corrente autodenominada "desenvolvimentista", que, na avaliação de integrantes do governo, estava sufocada por ortodoxos alinhados com as idéias econômicas do governo anterior e do ex-ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda).
A visibilidade, a exposição e, principalmente, a repercussão que o pensamento de pesquisadores do Ipea, como o afastado Fabio Giambiagi, tinham na mídia sempre incomodaram a ala desenvolvimentista do governo, que ganhou poder neste segundo mandato de Lula.
Com isso, a tensão foi a marca do relacionamento do Ipea com petistas que consideravam que o instituto estava "tomado" por conservadores, quando não rotulados de tucanos. O ministro Paulo Bernardo, remanescente das fileiras paloccistas, era muito criticado nas reuniões internas do governo por não "enquadrar" o Ipea.

Autonomia
Apesar das pressões, o ministro não só manteve a autonomia do instituto como incorporou propostas sugeridas nos debates do Ipea. Uma delas previa equilibrar, no médio prazo, as contas públicas de tal forma que as receitas cobririam todos os gatos, inclusive com juros, o chamado déficit nominal zero.
Após embate público com a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), que desqualificou o projeto classificando como "rudimentar" no final do primeiro mandato de Lula, a idéia emplacou como uma das medidas fiscais do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
A desvinculação do Ipea do Planejamento e a transferência para a esfera no novo ministro Mangabeira Unger provocaram uma revolta geral entre os pesquisadores do instituto no início deste ano. Eles temiam a censura e a implantação de um pensamento único no órgão, que sempre se destacou pela diversidade de idéias. Sem isso, acreditam, o Ipea não existe.


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