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JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
Morrer na praia
O fim da CPMF poderá fazer o
país mostrar que amadureceu e entendeu a importância
da responsabilidade fiscal
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A NÃO-APROVAÇÃO da CPMF
(Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) retira do Orçamento 5% do PIB
das receitas da União (R$ 40 bilhões). O efeito disso para a economia vai depender de como o governo
irá reagir ao fato consumado.
A redução da receita ocorre em
um momento particularmente bom
para o país. O PIB irá crescer a taxas
próximas a 5% ao ano em 2007 e
2008, e o grau de formalização da
economia está aumentando. Com
isso, a receita tributária como proporção do PIB tem apresentado forte crescimento. Portanto, uma parte
da receita da CPMF será reposta pelo próprio desempenho da economia brasileira.
Porém isso não será suficiente e o
governo precisará decidir como enfrentar a redução de receitas. Existem dois caminhos a serem trilhados. O primeiro parte do pressuposto de que é necessário preservar o
ajuste fiscal e manter a trajetória da
relação dívida/PIB em queda como
condição para o crescimento de longo prazo. O ajuste teria que ser feito
via redução de despesas e aumento
de receitas. O segundo caminho parte do pressuposto de que o crescimento da economia se baseia no aumento dos gastos governamentais.
A preservação do crescimento exigiria a redução do superávit primário,
o aumento dos impostos e a manutenção das despesas.
A primeira estratégia exigiria uma
mudança drástica na proposta de
Orçamento para 2008, que prevê
contratação de servidores públicos,
aumentos reais de salários dos funcionários públicos e do salário mínimo, com efeitos importantes sobre o orçamento da seguridade social e
aumento de gastos com saúde, investimentos e do Ministério Público, do Legislativo e do Judiciário.
Reajustar os salários do funcionalismo e o salário mínimo pela inflação
passada, congelar a contratação de
novos servidores e os aumentos dos
gastos dos outros Poderes significaria uma importante redução dos
gastos planejados para 2008. Uma
redução nos investimentos públicos
e uma maior agressividade nos processos de concessão preservariam a
taxa de crescimento, com redução
de gastos.
Por outro lado, cancelar desonerações tributárias realizadas e as
planejadas para 2008 geraria ganhos importantes de receitas, além
de aumentar a eficiência do sistema
tributário. Finalmente, alguns tributos, como o IOF (Imposto sobre
Operações Financeiras) e a CSLL
(Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido), poderiam ser elevados.
Uma reação nessa direção reduziria a carga tributária, preservaria o
superávit primário, manteria a trajetória da relação dívida/PIB em
queda e, muito provavelmente,
apressaria a obtenção de "grau de investimento" pela economia brasileira. Como resultado, facilitaria a redução da taxa de juros pelo Banco
Central e aumentaria a taxa de crescimento do PIB.
Se a opção for pela segunda estratégia, a proposta orçamentária seria
mantida e o problema seria resolvido via aumento da arrecadação decorrente do aumento do PIB e da
formalização, aumento de impostos
e redução do superávit primário.
Nesse caso, o aumento de demanda
provavelmente forçaria o Banco
Central a aumentar a taxa de juros, a
queda na relação dívida/PIB seria
interrompida ou revertida e o país
perderia a chance de se tornar "grau
de investimento" em 2008.
Em suma, o fim da CPMF poderá
ser uma oportunidade para o país
mostrar que efetivamente amadureceu e entendeu a importância da
responsabilidade fiscal ou que ainda
continua imaturo e não-confiável. O
que seria uma pena, pois, depois de
tanto nadar, morreria na praia.
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO é professor do Departamento
de Economia da PUC-RJ e sócio da Tendências Consultoria
Integrada.
Hoje, excepcionalmente, a coluna de JOSÉ ALEXANDRE
SCHEINKMAN não é publicada.
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