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VINICIUS TORRES FREIRE
Quem liga para a dívida?
Queda da CPMF pode frear ou tornar mais lenta a queda da dívida pública e manter gasto com juros em nível brutal
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ECONOMISTAS DITOS liberais e
empresários festejam a queda
da CPMF, sem mais. Acham
que o gasto público é alto, o que é óbvio, e que cortar um imposto equivalente a 1,4% do PIB é o único modo de tornar o governo menos perdulário, na marra, o que é incerto. Intrigante nesse raciocínio, ao menos no caso de economistas, é que a discussão se limite aos riscos de que em
2008 não seja entregue o superávit
primário no nível prometido pelo
governo, 3,8% do PIB (superávit primário é a poupança do governo, desconsiderados pagamentos de juros).
Em primeiro lugar, economistas
ditos liberais parecem demasiadamente otimistas quanto ao cumprimento da meta de superávit. Segundo, parecem satisfeitos que o superávit caia dos atuais 4,2% (até outubro) para 3,8% em 2008. Terceiro,
condescendem com a meta de 3,8%.
Parece, pois, que os economistas liberais estão contentes com a queda
exasperadora de lenta da dívida pública, ora nuns 43% do PIB. Parecem tranqüilos em relação ao fato de
que o setor público gastará uns R$
150 bilhões em juros, neste ano.
Os economistas ditos desenvolvimentistas reclamam da brutal conta
de juros, dada a brutal taxa de juros,
mas sempre relutam em propor que
o governo contenha gastos e corte
mais dívida. Os economistas liberais
se preocupam apenas com imposto.
Mas quem paga a conta da dívida?
Como é possível tolerar que o governo de um país pobre e ainda com
péssimas condições de financiamento de suas dívidas tenha déficits
nominais grandes, de 2,5% do PIB?
É uma epidemia de nonsense. Há
muito economista achando que o
governo, de uma hora para outra, será capaz de cortar 30% ou até 40%
do que perderá com a CPMF. Vieram de Marte? Ademais, passaram a
ignorar que há pouco onde cortar,
tanto em termos legais como políticos. Segundo dados de João Paulo
Brunet, do Itaú, os gastos do governo central até outubro foram de
17,2% do PIB. São "incortáveis"
12,7% do PIB, despesas obrigatórias
como salários, INSS, transferências
sociais; 2,5% vão para saúde, educação e desenvolvimento social. Vai
para investimento 0,7% e gastos discricionários de custeio levam 1,3%
do PIB, quase uma CPMF.
Sim, a receita sobe ao dobro do ritmo do PIB. Sim, algum corte haverá,
assim como alta de imposto. Algum
dinheiro da CPMF voltará, por meio
de tributos sobre o consumo adicional que virá com o fim da cobrança
do tributo do cheque. Mas a composição do gasto público vai piorar.
Perdeu-se a chance de trocar a
CPMF por uma lei de contenção de
gasto corrente, o que resultaria numa "sobra de caixa" a ser destinada a
mais investimento e a mais abatimento de dívida (mais superávit primário). A suspensão do alongamento da dívida e do aumento de reservas internacionais, que se tornaram
muito custosos, dados os seus resultados ora modestos, poderia reduzir
ainda mais a despesa financeira. Poderíamos ter em breve déficit nominal zero, dívida menor, juro menor.
A estrutura das contas públicas seria
melhor. Enfim, o país não pode, por
ora, cortar imposto: deve demais.
Porém, muita gente parece antolhada ou cega por interesses muito
imediatos: empresários, oposição,
governo. E até economistas que bravateiam sua responsabilidade fiscal.
vinit@uol.com.br
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