São Paulo, domingo, 17 de fevereiro de 2008

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Bloqueio da UE à carne não cai, diz fazendeiro irlandês

Líder de campanha contra o Brasil diz que preocupações são com padrões, e não políticas

Declaração de Stephanes, de que país vendeu carne de gado não-rastreado à Europa, facilitou trabalho, afirma o pecuarista

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BRUXELAS

O bloqueio europeu à carne do Brasil vai continuar, afirma Padraig Walshe, presidente da Associação de Fazendeiros da Irlanda. Ele fala em causa própria: a entidade que dirige lidera há meses uma agressiva campanha contra o produto brasileiro, que em muitos momentos beirou a difamação.
Preocupados com a perda do mercado para os exportadores brasileiros, que no ano passado mandaram 543,6 mil toneladas de carne bovina para a Europa, há cerca de dois anos os produtores irlandeses começaram a jogar pesado, apelando para a questão sanitária.
A campanha ganhou força de acusação em julho do ano passado, quando os irlandeses apresentaram relatório ao Parlamento Europeu questionando o sistema de rastreamento da carne produzida no país.
Tanta pressão levou a UE a apertar o cerco aos produtores brasileiros, exigindo normas mais rigorosas e limites na rastreabilidade, o sistema em que o animal é monitorado para evitar riscos de doenças -no caso do Brasil, a aftosa.
No começo deste mês, o lobby irlandês pôde comemorar sua maior vitória na "guerra da carne", como a disputa está sendo chamada na UE. Depois que o Brasil apresentou uma lista com 2.681 fazendas certificadas para a venda do produto, quase nove vezes o número sugerido pelos europeus, as importações foram suspensas. Agora o governo brasileiro tenta negociar uma nova lista, mas o impasse vai se arrastar pelo menos até meados de março, quando termina a próxima inspeção européia no Brasil.
Em entrevista à Folha, Walshe disse que confia na manutenção do bloqueio e afirmou que a declaração do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, de que o Brasil vendeu carne fora dos padrões para a Europa facilitou seu trabalho.  

FOLHA - Os representantes brasileiros manifestaram otimismo depois da reunião de sexta-feira com técnicos da União Européia. Qual a sua avaliação?
PADRAIG WALSHE
- Não acredito que o embargo será suspenso. O próprio ministro da Agricultura admitiu no Congresso que o Brasil exportou carne para a Europa que estava fora dos padrões exigidos, e eu acho que vai haver uma reação [da Comissão Européia] a isso. A equipe da UE que fará a visita ao Brasil precisa se certificar de que não entram nas fazendas certificadas bois vindos de regiões onde há focos de aftosa. Não creio que eles mudarão suas recomendações em breve.

FOLHA - Para produtores e diplomatas brasileiros, o que está por trás da "guerra da carne" não são preocupações sanitárias, mas política e protecionismo. O que o sr. acha?
WALSHE
- Definitivamente não é uma questão política. Trata-se de padrões. Nós, fazendeiros europeus, investimos milhões em padrões que foram estabelecidos em favor dos consumidores do bloco. Não vamos ficar de braços cruzados diante da entrada de produtos na União Européia que não são submetidos a esses altos padrões.

FOLHA - O que a associação pretende fazer para convencer a Comissão Européia a manter o bloqueio à carne do Brasil?
WALSHE
- Vamos continuar com o nosso lobby político e insistir em que a equivalência [a padrões europeus] deve ser respeitada em relação a qualquer produto que entre na UE.

FOLHA - O governo brasileiro afirma que a carne que o país exporta não oferece nenhum risco. A campanha em torno do perigo sanitário não é exagerada?
WALSHE
- Não importa de onde vem a carne: ela deve ser produzida sob as mesmas exigências sanitárias em vigor na UE. É preciso que haja rastreabilidade, para garantir as mesmas condições em relação aos produtores europeus. É injusto quando produtores de fora da UE podem usar hormônios, antibióticos e não precisam rastrear os animais. Nós sofremos um controle rigoroso e queremos igualdade de condições.

FOLHA - A associação que o sr. dirige fez campanha pesada na Europa desaconselhando o consumo de carne brasileira. Deu certo?
WALSHE
- Acho que os consumidores preferem carne européia. Precisamos identificar melhor o produto para que o consumidor saiba o que está comprando.

FOLHA - Em suas várias visitas ao Brasil, o sr. comeu carne?
WALSHE
- Em minhas viagens ao exterior, geralmente como o que me servem. Só exijo que a comida esteja razoavelmente bem preparada.


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