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OPINIÃO ECONÔMICA
Criar na crise
PIO GUERRA
O ônus maior da grave crise por
que passa o país atinge as micro e
pequenas empresas, que, pelo porte e pela estrutura, são o elo mais
fraco do sistema produtivo. A
combinação perversa de vários fatores, especialmente os juros elevadíssimos e a desaceleração da
atividade econômica, está a exigir,
talvez mais do que em qualquer
outro momento da vida nacional,
uma política pública para a micro e
a pequena empresa. Se já se disse
que é na crise que a gente aprende,
cria e inova, por que não fazê-lo
agora?
Uma política pública global para
o segmento não significa, ressalte-se de imediato, reviver uma outra
língua do pê de que fala a tropicalista canção de Gilberto Gil -ou
seja, estabelecer privilégios, paternalismo, protecionismo. Propõe-se, isso sim, alavancar um segmento de fundamental importância na
economia. É preciso colocar a
questão da micro e pequena empresa na real discussão nacional,
levando a soluções -que não são
mirabolantes, requerendo apenas
e tão-somente vontade política-
para ampliar a participação delas
no desenvolvimento econômico e
social brasileiro.
Estamos falando, afinal, de um
segmento de mais de 4,5 milhões
de estabelecimentos, que responde
por 60% do emprego e 20% do PIB.
Além de democratizar as oportunidades e gerar empregos, as micro e pequenas empresas são onipresentes -isto é, estão em todo
canto e não apenas localizadamente, como a grande empresa- e absorvem pessoas menos qualificadas, nem sempre admitidas na
grande empresa. Sua presença na
rede de fornecedores das grandes
empresas, a abertura de novos espaços econômicos no país e a crescente terceirização de serviços
criam, ademais, a possibilidade
para que aumente a oferta de oportunidades de trabalho.
Como ressalta estudo encomendado pelo Sebrae, as micro e pequenas empresas não competem
com a grande empresa, mas, ao
contrário, integram-se na cadeia
produtiva, com claras vantagens
competitivas em relação às empresas maiores, pela sua flexibilidade.
É uma característica que as torna
capazes de absorver com rapidez e
eficiência novas demandas, nichos
de mercado e tecnologias. O desenvolvimento do segmento, portanto, tem de ser visto como parte
integrante do desenvolvimento da
economia como um todo, como
aliás têm reiterado os ministros do
Desenvolvimento, Celso Lafer, e
do Trabalho, Francisco Dornelles.
É falsa a percepção de que as micro e pequenas empresas se constituem numa etapa do desenvolvimento de um país, necessariamente transitória, porque se transformarão mais adiante em médias e
grandes empresas. A experiência
da Itália e dos Estados Unidos, para citar apenas dois países, demonstra ser tal tese uma falácia.
Não é justificativa, portanto, para
que não se tenha uma política pública global para os pequenos empresários. Em favor deles, é fácil fazer discurso, por se tratar de boa e
simpática causa, mas é difícil colocá-lo em prática, como demonstra,
por exemplo, a inexpressiva adesão dos Estados ao Simples.
Como a pequena empresa, não
há dúvida, é dinamizadora da economia como um todo, apoiá-la
com mecanismos permanentes é
uma forma de espantar a crise. Alguns passos já foram dados, como
a criação do Simples e do Fácil,
central de atendimento empresarial, uma iniciativa do Departamento Nacional de Registro do
Comércio, em parceria com o Sebrae e outros organismos, que agiliza a criação de pequenas empresas. São iniciativas que precisam,
contudo, ser multiplicadas.
Outra decisão louvável do presidente Fernando Henrique Cardoso, a criação da Apex (Agência de
Promoção de Exportações), no
âmbito do Sebrae, vem atuando no
esforço de ampliar a participação
da pequena empresa nas exportações; mas uma parceria estreita do
BNDES com a Apex seria bem-vinda.
Esses passos são muito pouco,
porém. Para estabelecer uma política pública global para a micro e a
pequena empresa, régua e compasso estão dados: é bastante eliminar para elas a burocracia, em
especial nas áreas jurídica e contábil; reduzir-lhes a carga tributária,
diminuir os encargos trabalhistas,
facilitar o acesso delas ao crédito. É
bastante, repito, vontade política.
Invertendo os sábios dizeres do
mestre Roberto Campos no discurso de despedida do Legislativo:
feito isso, o Brasil, certamente, ficará perto demais da riqueza atingível e longe demais da pobreza
corrigível.
Pio Guerra, 49, engenheiro agrônomo, é vice-presidente da CNA (Confederação Nacional da
Agricultura) e presidente do Conselho Deliberativo Nacional do Sebrae.
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