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ANÁLISE
Brasil gira em falso sobre uso de sanções
LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
O Brasil está longe do consenso na decisão final sobre a
retaliação aos EUA por conta
dos subsídios que o país paga a
seus produtores de algodão. A
desarmonia é mais evidente no
que se refere à propriedade intelectual, quando o ineditismo
da medida atravanca o caminho da promessa à prática.
Apesar da publicação das
duas listas de alvos possíveis
das sanções, a cacofonia de pedidos e resistências internas
que marcou a elaboração de
ambas volta a aparecer na discussão sobre sua aplicação.
Há divergências entre o Itamaraty e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior sobre como
aplicar as sanções, se de fato
elas devem ser a plena força e
sobre como dividir custos e benefícios da decisão -tanto os
políticos como os econômicos.
Crescem também as dissonâncias entre setores envolvidos na retaliação, sobretudo os
agrícolas e o farmacêutico.
Ao quadro se soma a percepção, do lado brasileiro, de que
os EUA tentam minar a discussão por dentro, fazendo ofertas
de vantagens e/ou pressões
pontuais por setor, na expectativa de que eles passem a pressionar contra as sanções .
Após sete anos, a Organização Mundial do Comércio deu
ao Brasil em setembro o direito
de aplicar sanções contra os
EUA em duas frentes. A primeira é a dos bens. A segunda,
inédita, é a retaliação cruzada,
que permite medidas em outro
setor que não o que originou a
disputa. O país escolheu o mais
sensível deles para os americanos: propriedade intelectual.
O problema é que nem o Brasil nem seu antagonista sabem
como lidar com essa nova carta.
Os EUA, por ora, pagam para
ver se é blefe. E o Brasil, mesmo
tendo um trunfo, pode acabar o
jogo com o morto na mão.
Existe consenso razoável de
que a retaliação em bens, calculada em US$ 591 milhões para
os próximos 12 meses, será efetivada. A dúvida paira sobre a
retaliação cruzada, que soma
US$ 238 milhões.
Aí, à primeira vista, os focos
são direitos de autor sobre produtos audiovisuais (filmes, essencialmente) e em patentes de
medicamentos. Ambos deixariam de ser pagos no período de
aplicação das sanções.
Mas se há um ponto de convergência entre os brasileiros é
que os americanos só ouvem a
palavra "genéricos". A ameaça à
bilheteria de produções hollywoodianas não recebeu mais
do que muxoxos dos EUA e o
eco de que querem negociar. Na
frente interna, foi vista como
impopular (o país afinal abraçou a bandeira do combate à pirataria) e pouco eficaz.
Já o foco nas farmacêuticas, o
trunfo, esbarra no custo. As
sanções são por período limitado, e quebrar a patente de um
genérico para produzi-lo no
país por um ou dois anos somente não seduz a indústria.
A saída seria a importação de
um determinado medicamento
genérico de outro país que já
quebrou a patente -a Índia,
por exemplo. Ainda assim, discute-se se inserir um terceiro
governo na história não abriria
um flanco para questionamentos dos EUA na própria OMC.
Do lado brasileiro, há quem
ache que a mera possibilidade é
suficiente para pressionar os
americanos. Há quem acredite,
contudo, que Washington só levará Brasília a sério se a ameaça
virar fato. E há ainda os que
apostam que o governo Obama
preferirá pagar a conta, para
não empenhar seu caro capital
político ao mexer com um programa de subsídios -e um
lobby agrícola- enraizado no
Congresso norte-americano.
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