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VINICIUS TORRES FREIRE
Lula abre as asas sobre nós
Entre medidas certeiras ou só politiqueiras, governo cria tanto um programa anticrise como um plano de campanha
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O AUMENTO de gastos anunciado anteontem pelo governo
Lula não é uma medida "anticíclica", como se diz em Brasília.
Não se trata de providências destinadas a contrabalançar os efeitos da
crise. Por ora, apenas se acomoda o
aumento já contratado dos gastos
correntes (salários, custeio), e se
poupa menos. Tais despesas têm escasso efeito "anticíclico", se algum.
Não se tratou de mais investimento.
A fim de gastar em obras o que cortou na poupança, o governo teria de
multiplicar por sete o aumento
anual de investimento registrado
nos anos Lula. Difícil, certo?
Mas o ativismo luliano, no que
tem de melhor e de pior, desconsiderando por ora seu mérito econômico e social, é de amplitude para
deixar a já medíocre oposição ainda
mais diminuída. "Ninguém será deixado para trás", parece dizer Lula. A
lista dos beneficiados é conhecida,
mas impressiona quando alinhada.
São as quase 200 mil pessoas de
classe média a comprar carros novos mais baratos, a cada mês, devido
ao IPI menor. São as centenas de
milhares de metalúrgicos e correlatos, menos ameaçados de perder o
emprego, além de seus sindicatos
cada vez mais alinhados ao governo.
Ainda virá o desconto de imposto
para quem comprar eletrodomésticos de cozinha e área de serviço.
São as dezenas de milhões que receberão outro aumento real do salário mínimo, seja via INSS, emprego
privado ou público em prefeituras e
Estados mais pobres, quase todos.
São as centenas de milhares de famílias ora apenas esperançosas de
comprar uma casinha quase toda
subsidiada, mas que já fazem filas
em prefeituras, em Cohabs etc., para
o cadastramento. A isso se junte a
construção civil agradecida, com casas para fazer e incentivos e fundos
para obras de infraestrutura.
São milhares de prefeitos que, penhorados e agradecidos, poderão
continuar a gastar como se não houvesse amanhã, dado o capilé federal
para compensar a queda de receita,
prefeitos que têm boas clientelas e
são bons cabos eleitorais nas cidades
pequenas. São dezenas de milhares
de servidores federais que ganharão
mais. Serão talvez os governadores,
já na fila do auxílio federal prometido mas ainda não negociado.
Pouco numerosas, mas com voz
política, são as empresas que podem
renegociar suas dívidas externas
com dólares emprestados pelo Banco Central. E outras que poderão tomar empréstimos baratos devido ao
caixa ampliado do BNDES. São os
bancos pequenos, que ganharam seguros de crédito e financiamento incentivado por medidas do BC, o que
melhora a vida de empresas menores ou de compradores de carros
usados. Daqui a pouco serão as micro e pequenas empresas, que talvez
tenham acesso menos difícil ao crédito devido ao seguro que o governo
deve criar para tais financiamentos.
Os frigoríficos e seus milhares de
empregos restantes poderão sair do
gelo devido a linhas especiais de crédito e isenção de impostos, o que
agradará bases políticas no Sul e no
Centro-Oeste; nessa conta entram
também os agricultores que outra
vez renegociam suas dívidas oficiais.
Nem se mencionem os beneficiários permanentes de programas sociais, que, direta ou indiretamente,
alcançam quase 40% da população.
Lula abre as asas para 2010.
vinit@uol.com.br
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