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ANÁLISE
Brics ainda são segunda divisão no jogo global
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
A coincidência entre a cúpula
dos Brics e o plano Obama de
regulação dos mercados financeiros é uma perfeita radiografia do jogo mundial de poder no
momento e no futuro imediato.
O que vão discutir os Brics?
Acima de tudo, a economia
mundial e sua crise, até porque
economia é o único amálgama
entre países que não têm laços
históricos, culturais ou geográficos -usualmente os motivos
que levam a criar um bloco.
No caso dos Brics, ironiza o
"Financial Times" de ontem, "é
certamente o primeiro bloco
multilateral de nações a ser
criado por analistas de pesquisas de um banco de investimento e sua equipe de vendas"
(alusão ao fato de que o acrônimo foi inventado por um economista da Goldman Sachs,
aliás uma das instituições dos
"brancos de olhos azuis" que o
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva culpou pela crise).
Se os Brics serão as potências
mundiais do futuro, então o líder da potência do presente,
Barack Obama, deveria aguardar o que eles têm a dizer sobre
a crise e sobre como evitar que
se repita no futuro, certo?
Errado. Barack Obama já tomou, unilateralmente, todas as
medidas para enfrentar a crise
e já preparou, sem nem ouvir
nem cheirar os Brics e sua cúpula, o pacote de regulação do
seu próprio sistema financeiro.
Posto de outra forma: os
Brics podem até vir a ser as potências do futuro, mas, no momento, representam, todos somados, apenas 15% da economia mundial. Ou dito de uma
segunda outra forma: o que a
Goldman Sachs fez foi antever
MERCADOS emergentes, nos
quais os investidores poderiam
fazer gordos lucros, mas não
PAÍSES de fato capazes por ora
de ditar os rumos do planeta ou
ao menos influir poderosamente neles.
Aliás, a Europa também não
esperou nem consultou os
Brics para anunciar seu próprio
pacote de regulação, cuja aprovação final se dará neste mês.
Pior: nem Estados Unidos
nem Europa agiram no marco
do G20, o clubão das 20 maiores economias do mundo, do
qual fazem parte todos os Brics.
O G20 seria, portanto, o marco
ideal para que os Brics exercitassem seus músculos.
No entanto, como reconhece
-e lamenta- o próprio governo brasileiro, o G20 não tem
um programa próprio de trabalho. Parou na cúpula de abril. A
partir dela, foi cada um por si,
sem a coordenação que se desejava e que, se de fato praticada,
levaria a transformar o grupo
no novo gerente informal da
economia global, suplantando
o G8, no qual só a Rússia está
presente, entre os Brics.
O chanceler Celso Amorim
pode dar por morto o G8, como
o fez nesta semana, mas, no mínimo, no mínimo, o grupo restrito dos países ricos (mais
Rússia) continua dando seus
solavancos -e sem os seis países que participarão da cúpula
do G8 ampliada (todos os outros três Brics entre eles).
Já houve uma reunião de ministros de Economia, que discutiu a crise. Haverá no fim do
mês uma reunião de ministros
do Exterior, para discutir as outras crises, economia à parte,
sem que os ministros brasileiros ou dos outros Brics (Rússia
à parte) fossem convidados.
Parece claro que, embora os
Brics tenham, em uma década,
pulado de 7,5% da economia
mundial para 15%, ainda têm
uma árdua batalha para passar
da segunda para a primeira divisão no jogo global de poder.
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