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Crise traz lições ao país, dizem economistas
Para Antônio Corrêa de Lacerda, dependência da exportação de commodities representa o maior risco durante a turbulência
Na opinião do americano Mark Weisbrot, BC deveria resistir a pressões para reduzir corte de juros
em meio à crise
JANAÍNA LEITE
MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil pode aproveitar o
momento desfavorável da economia internacional para
aprender uma importante lição
-diversificar a lista de exportações e, assim, depender cada
vez menos da venda de produtos primários, as chamadas
"commodities". A avaliação é
do doutor em economia pela
Unicamp e professor da PUC-SP Antônio Corrêa de Lacerda.
Ele lembrou que a oscilação
nos mercados pode acentuar a
queda no valor dessas mercadorias, o que teria grande impacto sobre a entrada e a saída
de dinheiro do país.
Para Lacerda, entretanto, o
cenário delineado até agora é
favorável ao Brasil. Isso porque
houve uma correção dos ativos
muito afetados pelo excesso de
dinheiro em circulação antes
da crise -dólar e Bolsas.
"O mercado vai achar um novo ponto de equilíbrio e os capitais voltarão ao Brasil, até com
mais qualidade, depois que a
crise passar", afirmou.
A pergunta que fica no ar é se,
para encontrar esse equilíbrio,
o Copom (Comitê de Política
Monetária) deve ceder ao comichão de reverter a tendência
de baixar os juros básicos. A
resposta é "não", de acordo
economista Mark Weisbrot, diretor do CEPR (Center for Economic and Policy Research),
entidade de pesquisas econômicas sediada em Washington.
Em entrevista à Folha, Weisbrot afirmou que adotar uma
política monetária ainda mais
conservadora "seria a pior decisão que o governo brasileiro
poderia tomar".
"O Brasil já tem as taxas de
juros reais mais altas do mundo, o que vem ferindo a economia brasileira por anos e realmente limita o crescimento e o
desenvolvimento", justificou o
economista. "O país precisa
baixar a taxa Selic", completou.
Para Weisbrot, a alta do dólar, em decorrência dos problemas no mercado financeiro,
pode ser "algo muito bom para
a economia brasileira, uma vez
que a sobrevalorização do real
é um sério problema".
O argumento usado por ele é
o mesmo sustentado pelo setor
produtivo: com o real valendo
muito diante do dólar, os preços dos produtos importados
ficam artificialmente baratos.
Ao mesmo tempo, o valor obtido com as exportações cai,
prejudicando a indústria nacional. Desde quinta-feira da
semana passada, quando fundos de investimentos que aplicam no setor imobiliário dos
Estados Unidos anunciaram
problemas de caixa, os agentes
financeiros vêm o capital escapulir de aplicações consideradas de maior risco.
O resultado é uma queda
contínua nos índices das Bolsas
de Valores -a Bovespa chegou
a despencar 8,8% ontem- e o
encarecimento do dólar no
mercado interno. A moeda
americana fechou com alta de
3,15%, vendida a R$ 2,09. O risco-país, por sua vez, disparou
14,5%, batendo 229 pontos.
Moeda e crédito
A economista Leda Paulani,
professora da USP, concordou
com Weisbrot.
"Não existe moeda forte em
país periférico, o que ficou evidente nos últimos dias. O real
não é o que o governo gosta de
alardear", disse. "Prova disso é
que o dólar caiu no mundo inteiro -menos no Brasil."
Assim, na opinião de Paulani,
a alta do dólar evidencia que, ao
optar por uma política de juros
muito altos, o Brasil atrai capital de curto prazo. Quando há
problemas lá fora, esse dinheiro sai rapidamente daqui. "É
hora de botar as barbas de molho", disse ela.
A economista lembrou ainda
que fuga de capitais não é algo a
ser menosprezado, embora o
Brasil conte hoje com uma
quantia de reservas cambiais
confortável em seus cofres.
"Em novembro de 1998, o Brasil tinha US$ 70 bilhões em reservas. Alguns meses depois,
em janeiro, esse montante tinha caído para R$ 30 bilhões",
exemplificou.
A princípio, o impacto da crise sobre a economia brasileira
seria sentido por meio de crédito mais exíguo para empresas
brasileiras ou estrangeiras que
atuam no Brasil e que se financiam no mercado internacional, segundo o economista
Márcio Holland, da FGV (Fundação Getulio Vargas).
"Se você olhar o cenário americano atual, percebe que muitas empresas vão ter que requalificar seus créditos nos Estados Unidos. Isso implica reavaliação geral dos créditos, e isso
tem impacto para empresas do
Brasil também", afirma.
A segunda conseqüência
imediata para a economia brasileira, aponta Holland, é a valorização do dólar em relação
ao real, o que já vem ocorrendo.
"Os investidores estrangeiros estão saindo para cobrir
prejuízos fora do país. Esse movimento de saída de dólares
mexe diretamente com o câmbio, e o ambiente para a inflação fica mais incerto. Isso tem
efeitos na hora de definir a taxa
de juros no país", analisa. "O
Banco Central pode ser mais
conservador na reunião do Copom, e isso afeta crédito e conseqüentemente investimentos
das empresas."
As hipóteses sobre como o
mercado vai se comportar daqui para a frente são várias e,
por conta disso, analistas de diferentes tendências e áreas de
atuação estão unidos ao dizer
que apostar em qualquer uma
delas é prematuro.
"A semana ainda não acabou,
temos a sexta [hoje] pra sentir o
humor do mercado e o final de
semana pra verificar o resultado nos livros", sintetizou o presidente da corretora Souza Barros, Carlos Souza Barros.
Algumas dessas possibilidades e suas implicações, contudo, parecem bem delineadas.
Weisbrot, do CEPR, observou
que a crise deverá levar a economia dos Estados Unidos a
uma desaceleração -o que afetará todo o hemisfério.
Mas, na avaliação do economista, "o Brasil será menos afetado que os demais países da
América Latina, uma vez que o
comércio com os EUA não tem
uma grande proporção".
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