São Paulo, terça-feira, 17 de setembro de 2002

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AGROFOLHA

Colheita mundial cairá pelo sexto ano, reduzindo os estoques; alta do dólar também encarece importação

Safra menor de trigo encarece pão e massas

MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO

No ano em que o Brasil voltaria a produzir uma grande safra de trigo (pelas estimativas anteriores, a maior dos últimos 14 anos), uma bomba de efeito retardado está sendo montada no setor. Todos vão perder: produtores, cooperativas, cerealistas, moinhos e, principalmente, os consumidores, pois os preços do pãozinho e das massas vão aumentar.
Os problemas do setor têm origem tanto no mercado externo como no interno. No mercado externo, a quebra de safra é grande. O efeito climático adverso sobre as lavouras de trigo deverá provocar a sexta queda seguida na produção mundial. Na safra 1997/8, a colheita mundial somava 610,2 milhões de toneladas. A próxima a ser colhida, a de 2002/3, deverá ficar em apenas 572,3 milhões.
No mercado interno a situação é mais grave. O Brasil importa, em média, sete de cada dez toneladas que consome. A quebra da safra mundial elevou os preços internacionais, que ficaram mais salgados para os brasileiros devido à alta do dólar no mercado interno.
Ao contrário do que ocorre com os principais produtores mundiais, o Brasil vai produzir mais trigo neste ano, mas a safra será inferior às previsões iniciais. Essa quebra interna, somada aos efeitos internacionais, está gerando uma explosão dos preços, o que dificulta as negociações entre produtores, cooperativas e moinhos.
A previsão é de dificuldades financeiras para toda a cadeia, principalmente para os moinhos. Na outra ponta, o consumidor sentirá no bolso os efeitos desse desarranjo do setor. O pãozinho, que já subiu 19,2% em São Paulo neste ano, deverá aumentar mais.
No mercado interno, a tonelada de trigo era negociada a R$ 330 em junho. Atualmente, os preços já atingem R$ 550. O produto importado da Argentina, convertido à taxa atual do dólar, já chega ao Brasil a R$ 740 por tonelada.

Estoques em baixa
Os números dos estoques mundiais de trigo mostram que os próximos meses vão ser difíceis para o setor. Segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, os estoques internacionais do produto na próxima safra cairão para 138,7 milhões de toneladas, apenas 23% do consumo mundial de um ano. Cinco safras atrás, os estoques mundiais eram de 178,3 milhões de toneladas, ou 31% do consumo de um ano.
Os chineses, líderes mundiais, produziram 112 milhões de toneladas de 1995 a 1999, em média. Nos últimos dois anos, colheram 93 milhões de toneladas. A safra dos EUA, que era de 69 milhões de toneladas em 99, deverá recuar para 45,9 milhões neste ano.
Só na América do Norte, a produção cairá 24 milhões de toneladas nos últimos dois anos (os números finais ainda não estão disponíveis). Já o Canadá terá a menor safra dos últimos 28 anos. Uma das exceções nesse cenário de quedas é a Rússia, que deverá colher 48 milhões de toneladas -a melhor safra em dez anos.
A quebra de safra vai provocar oferta menor de produto para exportação. Os cinco principais exportadores vão reduzir em 4 milhões de toneladas o volume exportado, mas o consumo mundial deverá permanecer estável em 593 milhões de toneladas.
A primeira consequência dessa oferta menor foi a forte elevação de preços. No mercado externo, o trigo teve alta de 75% em dólar de abril para cá, diz Lawrence Pih, do Moinho Pacífico.
"Isso é gravíssimo para o Brasil, que depende de importações", diz. A quantidade produzida no mercado interno é pequena e o clima ainda prejudicou a qualidade do produto, segundo ele.
A alta do trigo coloca em jogo a saúde financeira dos moinhos. Para Pih, "vai haver muita turbulência no segmento". Os moinhos ainda têm dificuldades para pagar os dólares tomados antes da alta da matéria-prima.
As linhas de crédito estão escassas, e dólar e trigo ficaram mais caros para os importadores. Os moinhos estão com dificuldade até para comprar o produto nacional. Diante da situação instável de alguns deles, os fornecedores estão dificultando as entregas.
Pih diz que o setor terá de repassar esses aumentos para o preço da farinha, o que vai chegar aos consumidores na hora de comprar pão e massas. As indústrias estão conscientes, no entanto, de que os repasses têm um limite.
Os recentes aumentos da farinha já provocaram queda de 20% no consumo, diz o presidente do Moinho Pacífico. Um aumento de 100% nos preços da farinha gera repasse de 30% nos do pãozinho e de 55% a 60% nos das massas.
Nas contas da Fipe, cada 10% de aumento no pão e nas massas gera inflação de 0,15%. Apesar disso, Pih diz que os aumentos a partir de agora virão em velocidade maior do que no passado porque as indústrias não têm mais gordura para queimar.


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