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AGROFOLHA
Colheita mundial cairá pelo sexto ano, reduzindo os estoques; alta do dólar também encarece importação
Safra menor de trigo encarece pão e massas
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
No ano em que o Brasil voltaria a produzir uma grande safra de
trigo (pelas estimativas anteriores, a maior dos últimos 14 anos),
uma bomba de efeito retardado está sendo montada no setor. Todos vão perder: produtores, cooperativas, cerealistas, moinhos e,
principalmente, os consumidores, pois os preços do pãozinho e
das massas vão aumentar.
Os problemas do setor têm origem tanto no mercado externo
como no interno. No mercado externo, a quebra de safra é grande.
O efeito climático adverso sobre
as lavouras de trigo deverá provocar a sexta queda seguida na produção mundial. Na safra 1997/8, a
colheita mundial somava 610,2
milhões de toneladas. A próxima
a ser colhida, a de 2002/3, deverá
ficar em apenas 572,3 milhões.
No mercado interno a situação é
mais grave. O Brasil importa, em
média, sete de cada dez toneladas
que consome. A quebra da safra
mundial elevou os preços internacionais, que ficaram mais salgados para os brasileiros devido à alta do dólar no mercado interno.
Ao contrário do que ocorre com
os principais produtores mundiais, o Brasil vai produzir mais
trigo neste ano, mas a safra será
inferior às previsões iniciais. Essa
quebra interna, somada aos efeitos internacionais, está gerando
uma explosão dos preços, o que
dificulta as negociações entre produtores, cooperativas e moinhos.
A previsão é de dificuldades financeiras para toda a cadeia,
principalmente para os moinhos.
Na outra ponta, o consumidor
sentirá no bolso os efeitos desse
desarranjo do setor. O pãozinho,
que já subiu 19,2% em São Paulo
neste ano, deverá aumentar mais.
No mercado interno, a tonelada
de trigo era negociada a R$ 330
em junho. Atualmente, os preços
já atingem R$ 550. O produto importado da Argentina, convertido
à taxa atual do dólar, já chega ao
Brasil a R$ 740 por tonelada.
Estoques em baixa
Os números dos estoques mundiais de trigo mostram que os
próximos meses vão ser difíceis
para o setor. Segundo o Departamento de Agricultura dos Estados
Unidos, os estoques internacionais do produto na próxima safra
cairão para 138,7 milhões de toneladas, apenas 23% do consumo
mundial de um ano. Cinco safras
atrás, os estoques mundiais eram
de 178,3 milhões de toneladas, ou
31% do consumo de um ano.
Os chineses, líderes mundiais,
produziram 112 milhões de toneladas de 1995 a 1999, em média.
Nos últimos dois anos, colheram
93 milhões de toneladas. A safra
dos EUA, que era de 69 milhões
de toneladas em 99, deverá recuar
para 45,9 milhões neste ano.
Só na América do Norte, a produção cairá 24 milhões de toneladas nos últimos dois anos (os números finais ainda não estão disponíveis). Já o Canadá terá a menor safra dos últimos 28 anos.
Uma das exceções nesse cenário
de quedas é a Rússia, que deverá
colher 48 milhões de toneladas
-a melhor safra em dez anos.
A quebra de safra vai provocar
oferta menor de produto para exportação. Os cinco principais exportadores vão reduzir em 4 milhões de toneladas o volume exportado, mas o consumo mundial
deverá permanecer estável em
593 milhões de toneladas.
A primeira consequência dessa
oferta menor foi a forte elevação
de preços. No mercado externo, o
trigo teve alta de 75% em dólar de
abril para cá, diz Lawrence Pih, do
Moinho Pacífico.
"Isso é gravíssimo para o Brasil,
que depende de importações",
diz. A quantidade produzida no
mercado interno é pequena e o
clima ainda prejudicou a qualidade do produto, segundo ele.
A alta do trigo coloca em jogo a
saúde financeira dos moinhos.
Para Pih, "vai haver muita turbulência no segmento". Os moinhos
ainda têm dificuldades para pagar
os dólares tomados antes da alta
da matéria-prima.
As linhas de crédito estão escassas, e dólar e trigo ficaram mais
caros para os importadores. Os
moinhos estão com dificuldade
até para comprar o produto nacional. Diante da situação instável
de alguns deles, os fornecedores
estão dificultando as entregas.
Pih diz que o setor terá de repassar esses aumentos para o preço
da farinha, o que vai chegar aos
consumidores na hora de comprar pão e massas. As indústrias
estão conscientes, no entanto, de
que os repasses têm um limite.
Os recentes aumentos da farinha já provocaram queda de 20%
no consumo, diz o presidente do
Moinho Pacífico. Um aumento de
100% nos preços da farinha gera
repasse de 30% nos do pãozinho e
de 55% a 60% nos das massas.
Nas contas da Fipe, cada 10% de
aumento no pão e nas massas gera inflação de 0,15%. Apesar disso,
Pih diz que os aumentos a partir
de agora virão em velocidade
maior do que no passado porque
as indústrias não têm mais gordura para queimar.
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