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Pré-sal terá regime tributário próprio
Governo prepara regras fiscais e financeiras para viabilizar no país produção de 2/3 dos equipamentos de exploração, diz Coutinho
Presidente do BNDES diz que cadeia produtiva precisa de investimentos de U$ 80 bi e que é possível criação de estatal de seguros para setor
Leonardo Wen/Folha Imagem
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O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que elabora política industrial para produção de equipamentos para exploração do pré-sal e prevê desoneração do setor
SÉRGIO MALBERGIER
EDITOR DE DINHEIRO
VALDO CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A SÃO PAULO
O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, foi encarregado de montar uma política industrial para a exploração do
petróleo do pré-sal. Seu objetivo é que, em três anos, dois terços dos equipamentos para explorar o pré-sal sejam produzidos no Brasil.
Para atingir esse objetivo,
disse Coutinho à Folha, será
preciso dar "condições de financiamento e tributação" similares às da Coreia do Sul,
país líder na indústria naval.
Ou seja, adotar uma forte desoneração do setor, para que as
empresas instaladas no Brasil
possam competir com as estrangeiras. Segundo Coutinho,
isso pode envolver até a criação
de uma seguradora pública, como no modelo coreano.
Disse ainda que, pelos estudos do BNDES, será preciso investir, em dez anos, cerca de
US$ 80 bilhões para desenvolver a cadeia produtiva do setor.
Isso sem contar os investimentos da Petrobras, de US$ 174 bilhões nos próximos cinco anos.
Coutinho diz que não defende agigantamento do BNDES,
mas ressalva que a maior participação do banco no mercado
de crédito deve ser mantida
nos próximos anos, principalmente na infraestrutura.
FOLHA - Como está a elaboração
de política industrial do pré-sal?
LUCIANO COUTINHO - Foi feito um
estudo de mapeamento de famílias de empresas do setor,
para identificar o que teremos
de adicionar de capacidade
produtiva ao longo dos próximos dez anos, a fim de assegurar que pelo menos dois terços
sejam produzidos no país. Não
estamos falando de refino, só
de offshore [exploração de petróleo na costa brasileira], que
inclui sondas, plataformas,
equipamentos para desenvolver a exploração do pré-sal. O
que ainda falta é que detectamos uma série de condições de
financiamento e tributação,
oferecidas por países concorrentes, como Coreia, que lhes
dá vantagens competitivas.
Eles têm, além de prazos e taxas favoráveis, seguros e garantias, notadamente a Coreia. Ela
tem uma grande seguradora
pública, que dá cobertura de
risco aos financiadores e empreendedores. A outra coisa é o
tratamento tributário dado lá.
Como é produto para exportação, há um processo de desoneração bastante intenso, com
uma cobertura da cadeia toda.
Esse é outro desafio. Então, na
nossa avaliação, é preciso criar
condições no Brasil similares
para poder competir. Estão na
frente na curva de aprendizado.
Nós estamos no começo para
chegar lá. Temos de aprender a
fazer, com eficiência.
FOLHA - O que será preciso fazer no
Brasil para ter algo similar?
COUTINHO - Um regime tributário e financeiro específico para
a cadeia produtiva do petróleo.
Está em conversações entre
BNDES e Fazenda. O financiamento será do BNDES. Aí nós
temos outra questão que é o
"funding" do banco. Não vai
entrar dinheiro do Orçamento.
Temos de discutir com o Ministério da Fazenda. Recursos
do próprio Fundo Social do petróleo poderão estar disponíveis, mas só depois que o petróleo do pré-sal for extraído, não
antes de 2015. Temos um problema de curto prazo, temos de
encontrar os recursos para
chegar lá.
FOLHA - Quanto será necessário
para desenvolver essa cadeia?
COUTINHO - US$ 80 bilhões nos
próximos dez anos para desenvolver a cadeia produtiva offshore, sem contar os investimentos da Petrobras. É o desenvolvimento de estaleiros, de
novas indústrias, de ampliação
de capacidade. Em cinco anos,
equivalente a US$ 40 bilhões.
Nosso desejo é que tenha
dois terços de fornecimento
nacional. Temos de fazer o desenvolvimento das empresas
que estão aqui, que podem se
capacitar, e temos que atrair
empresas para produzir aqui,
diretamente ou em associação
com empresas nacionais.
Em alguns casos, equipamentos mais simples, o Brasil
conseguiu chegar a um nível de
nacionalização em período relativamente curto. É uma tarefa a ser construída em dois, três
anos, para conseguirmos chegar lá. Não fixamos uma meta,
mas é um objetivo. Realisticamente, vamos ter de desenvolver a cadeia produtiva para fazer isso. Ninguém desenvolve
isso da noite para o dia. Se eu
dissesse em 12 meses, eu estaria forçando. Dois, três anos, teremos de desenvolver uma cadeia produtiva, absorver tecnologia, criar estaleiros de grande
escala, talvez mais um ou dois.
FOLHA - Há contato com as estrangeiras para se instalarem aqui?
COUTINHO - Sim, já há contatos.
E temos estimulados empresários brasileiros a entrar em tratativas, algumas já avançadas,
com empresas líderes de tecnologia. Não posso citar nomes.
FOLHA - Atualmente, em alguns
segmentos, o conteúdo nacional na
indústria do petróleo já supera 80%,
90%. Isso não é possível no pré-sal?
COUTINHO - Por enquanto, não,
porque se trata de uma nova
tecnologia, já conhecida pela
Petrobras, mas diferente para a
indústria. São perfurações a
7.000 metros, em situações diferentes, mais longe da costa,
com requisitos tecnológicos
bem mais desafiadores.
FOLHA - No caso do seguro, a ideia
é seguir o exemplo coreano e criar
uma companhia pública aqui?
COUTINHO - Essa crise financeira debilitou muito o setor de seguro. Mas ainda não sabemos,
há diversas possibilidades. A dificuldade é que nessa área são
projetos de grande escala, outros tipos de riscos, que ainda
não temos total mensuração
que possam permitir uma gestão de risco. Para esse tipo de
seguro a tecnologia é diferente.
Aí, há um desafio. O mercado
não vai prover esses seguros,
pelo menos no curto prazo visível. E são seguros de uma natureza especial.
FOLHA - Desses US$ 80 bilhões, a
grande parte viria do BNDES?
COUTINHO - Esse número é a
necessidade de financiamentos
para a cadeia produtiva nesses
dez anos. Acredito que o mercado virá e suprirá uma parcela
dos requisitos de financiamentos. Além disso, uma parte do
crédito poderá ser suprida a
partir do desenvolvimento do
mercado de crédito brasileiro.
E aqueles créditos de maior risco, de mais longo prazo, possivelmente o BNDES terá de oferecer, de preferência em parceria com o setor bancário.
FOLHA - E os fundos soberanos estrangeiros, podem prover recursos
para o BNDES?
COUTINHO - Estamos tendo
contatos com fundos para investimentos em infraestrutura.
Nessas negociações eles poderão operar diretamente ou ter o
BNDES como parceiro. Temos
contato com a China, Cingapura, Emirados Árabes.
FOLHA - Neste ano, o BNDES deve
fechar com desembolsos de até R$
130 bilhões. Onde o banco chegará?
COUTINHO - Temos pedido para
que nosso pessoal analise essa
questão, tendo em conta que o
mercado não irá suprir o financiamento de longo prazo. Em
breve, vamos ter uma ideia.
Existe um problema que é o desenvolvimento do sistema financeiro privado. O sistema financeiro brasileiro ficou muito
viciado, uma palavra imprecisa,
mas ficou viciado em liquidez
de curto prazo. E era importante um processo de migração e
incentivo ao próprio investidor
brasileiro para confiar no país,
pensar em aplicações financeiras de perfil um pouco mais
longo. É algo que só se constrói
com segurança, confiança e alguns estímulos. Chegou o momento de a gente ter um sistema financeiro privado mais
normal, o que permitirá que ele
possa suprir de maneira adequada as necessidades de financiamento.
FOLHA - Como lidar com o avanço
do BNDES no mercado de crédito
causado pela crise, após a retração
dos bancos privados?
COUTINHO - Não existe nenhum
desejo de agigantar o BNDES.
Mas o que temos de pensar é
que a escala de investimento no
Brasil subiu e precisa subir ainda mais. O Brasil precisa investir, estávamos indo para 19% ou
19,5% do PIB. A crise nos atingiu e vamos ter 17% de investimento. É muito pouco. Temos
de voltar a investir mais de
20%, chegar a 24%, 25% do
PIB, o que nos daria condição
de crescer de forma sustentável
e muito firme. Haverá espaço
para os dois lados. O desafio é
desenvolver o sistema financeiro privado e fazer essa mudança.
FOLHA - Vocês estão buscando
uma nova fonte permanente de recursos?
COUTINHO - Esse é um tema. O
BNDES, se pensarmos o FAT, é
um banco de R$ 60 bilhões, o
que é insuficiente para a escala
de investimento que o país precisa, mesmo contando com a
participação privada. Nós tínhamos que investir muito
mais. Para isso, precisamos ter
mais recursos. Isso coloca um
desafio para o futuro, de como
suplementar o banco.
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