São Paulo, segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

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MARCOS CINTRA

Fim da CPMF e inflação


A hipótese mais provável é que o fim da CPMF serviu para aumentar as margens de lucro das empresas

OS CRÍTICOS da CPMF diziam que ela era altamente inflacionária. Segundo eles, o tributo tinha um peso de 2% nos preços. Portanto, dada a magnitude do choque ocorrido com sua extinção, era de esperar que poderia ocorrer deflação. Mas nada disso aconteceu.
Com base na matriz interindustrial do IBGE, calculei o impacto da CPMF sobre os preços em 42 setores da economia brasileira. Em seguida, comparei essa carga com os dados do IPCA de janeiro, divulgados na semana passada, para aferir se a extinção do "tributo do cheque" teve efeito sobre a inflação. A precisão dessa análise requer avaliações mais pormenorizadas, mas a comparação entre o que ocorreu com os preços no primeiro mês sem a contribuição e o peso que ela tinha nos setores produtivos é um sinalizador imediato para que se apure se, do ponto de vista da inflação, a extinção da CPMF foi um avanço.
A CPMF representava, em média, 1,61% no preço dos bens e serviços. Portanto, sua extinção deveria reduzir os preços em torno disso, supondo repasse total desse impacto nos preços ao consumidor. Porém o IBGE apontou que em janeiro o IPCA subiu 0,54%. Obviamente, fatores como sazonalidade, a estrutura de cada setor produtivo e o ritmo da atividade econômica devem ser considerados para fazer uma análise mais precisa. Mas, neste primeiro momento, a expectativa que se criou é que os preços cairiam sem o tributo, dada a magnitude do esperado choque de preços causado pela extinção da CPMF.
É oportuno primeiramente fazer algumas considerações a respeito de índice global. Quando se compara janeiro de 2007 com o mesmo mês de 2008, vê-se que o IPCA atual se posicionou 0,10 ponto percentual acima do registrado no ano passado.
Já o acumulado de 12 meses no primeiro mês deste ano (4,56%) manteve a trajetória de crescimento observada em dezembro de 2007 (4,46%).
Quanto ao núcleo do IPCA, observa-se que o índice saiu de 0,35% em janeiro de 2007 para 0,41% no mesmo mês de 2008. O acumulado de 12 meses passou de 3,62% em dezembro de 2007 para 3,68% no mês seguinte. Portanto, observa-se que em todas essas comparações a inflação global subiu em vez de cair.
Em termos de comparação setorial, o peso da CPMF é de no máximo 2,25% na indústria do café. Segundo alguns críticos do tributo, esse setor deveria reduzir seus preços em torno disso, mas o IPCA mostrou que no caso do café moído houve inflação de 0,16% e, no solúvel, a redução de preços foi de apenas 0,73%.
No setor de eletroeletrônicos, a CPMF tinha custo tributário de 1,74% sobre o faturamento, mas seus preços aumentaram 0,11%; na indústria automobilística, o tributo pesava 1,69% e houve inflação de 0,26%; na indústria farmacêutica, o tributo representava 1,49%, mas o IPCA registrou 0,15%. Na área de transportes, que tem peso elevado para os consumidores, a CPMF representava 1,33%, mas os preços aumentaram 0,4%; e, nos serviços pessoais, em que o ônus do tributo era de 1,31%, os preços cresceram 0,64%.
A inflação mensal de janeiro perdeu fôlego em relação a dezembro, mas isso está longe de ser explicado pelo fim da CPMF. Muito pelo contrário, a comparação setorial mostra que a hipótese mais provável é que a redução do custo tributário serviu para aumentar as margens de lucro das empresas.


MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE , 62, doutor pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas, foi deputado federal (1999-2003). É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
mcintra@marcoscintra.org


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