São Paulo, domingo, 18 de abril de 2010

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YOSHIAKI NAKANO

Juros e câmbio de novo!


A alta dos juros é errada porque agravará o deficit em transações correntes e elevará a taxa de câmbio


O BRASIL vem passando por grandes transformações nos últimos anos. De economia dominada pela especulação financeira, estamos caminhando para uma economia orientada para o crescimento, com deslocamento das expectativas para investimento produtivo e ampliação do horizonte temporal dos agentes econômicos. Estamos redescobrindo o nosso potencial de crescimento e reativando o ânimo empresarial. O que demarcará a transição para economia voltada para o crescimento será a constituição de uma massa crítica de empresários tomando decisões de ampliar os investimentos produtivos.
Infelizmente, esse processo foi abortado no último trimestre de 2008, com pânico financeiro e abrupta contração de crédito pelos bancos privados. Agora que iniciamos a recuperação, corremos o risco de novamente abortarmos a ampliação da taxa de investimento com a elevação do juro anunciada pelo BC.
Existem hoje duas ameaças que podem interromper a aceleração sustentada do crescimento: inflação e deficit em transações correntes. De fato, a taxa de inflação subiu neste ano e vamos superar a meta, mas não há indicações de que essa aceleração será persistente. Mas vamos admitir que seja preciso controlar a demanda agregada para evitar que essa inflação temporária se transforme em aceleração persistente.
Mas a elevação da taxa de juros é a medida correta no atual contexto brasileiro? Não. O que garantirá a transitoriedade da aceleração da inflação e seu controle no futuro será a ampliação da capacidade produtiva. E a elevação da taxa de juros afetará negativamente a recuperação da taxa de investimento, em andamento.
A taxa de juros afetará a demanda agregada, mas transitoriamente, já que a dinâmica de expansão do consumo tem como causas fatores reais além de juros e crédito. Estamos apenas transferindo o problema para o futuro, com menor crescimento hoje. O que precisamos é de uma política fiscal que diminua as despesas de pessoal e custeio, pois reduziria não só o nível de demanda, mas também a sua composição, uma mudança estrutural, abrindo espaço não inflacionário para ampliação da taxa de investimento e redução do deficit em transações correntes.
A elevação do juros é errada porque agravará o nosso segundo problema, que é o forte aumento no deficit em transações correntes, pois aumentará o influxo de capitais do exterior e provocará a apreciação adicional da taxa de câmbio. Isso terá duas consequências perversas: elevará o crédito do exterior quando se pretende contê-lo internamente com a alta dos juros; e a apreciação do câmbio provocará maior consumo, particularmente de bens importados, quando deveríamos contê-lo.
Em suma, vamos continuar cometendo os mesmos erros do passado com os dois preços fundamentais da economia fora do lugar e acionando instrumentos errados de política econômica. O atual "mix" de política, que já completou uma década, vem provocando especialização regressiva da estrutura produtiva do país, com repetição cíclica de períodos prolongados de apreciação cambial seguidos de forte e súbita depreciação, com reprodução sistemática de surtos inflacionários.

YOSHIAKI NAKANO, 65, diretor da Escola de Economia de São Paulo, da FGV, foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).



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