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Patronato vive crise de representatividade
Sem sócios, parte das entidades vive do imposto sindical; apenas 20% das 500 mil indústrias estão associadas a um sindicato
Em países desenvolvidos,
representatividade chega a
35%; setor patronal arrecadou
R$ 363 mi de taxa sindical em
2008 e ficou com 60% do valor
Diego Padgurschi/Folha Imagem
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Salas na Fiesp que abrigam até cinco sindicatos cada uma |
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Em um prédio comercial na
avenida Rangel Pestana, na região central de São Paulo, funcionam em uma sala sete sindicatos do comércio (calçados, livros, sacaria, couros e peles) e
de outros setores, como o de salões de bilhar. Administrados
por um advogado, esses sindicatos -com nenhum ou poucos
sócios- se mantêm com dinheiro da contribuição sindical, paga de forma compulsória
pelas empresas desde 1943.
A reportagem da Folha visitou e constatou que funcionam
nessas condições dezenas de
sindicatos do comércio e da indústria espalhados pela região
central de São Paulo, como o
Sindicato da Indústria de Calçados no Estado de São Paulo,
o Sindicato da Indústria de Mecânica do Estado de São Paulo
e o Sindicato do Comércio Varejista de Carvão Vegetal e Lenha no Estado de São Paulo.
Esses casos estão mais para
regra do que para exceção. Retratam a crise de representatividade pela qual passam os sindicatos patronais no Brasil. Levantamento da CNI (Confederação Nacional da Indústria)
mostra que, hoje, apenas 20%
das 500 mil indústrias do país
são associadas a algum sindicato. Em países desenvolvidos, o
percentual é de 30% a 35%.
Empresários, procuradores
do trabalho e advogados especializados em criação de sindicatos estimam que 80% dos
quase 4.000 sindicatos patronais registrados no Ministério
do Trabalho não têm representatividade, como deveriam ter,
ou não defendem, como deveriam, os interesses econômicos
de sócios e representados.
"Eles sobrevivem só para arrecadar o imposto sindical, que
incide sobre o capital social das
empresas e é recolhido anualmente de forma compulsória",
afirma Laerte Augusto Galizia,
advogado que há 40 anos atua
na criação de sindicatos (leia
entrevista na pág. B4).
"Essa facilidade de arrecadar
sem necessidade de prestação
de um serviço específico tem
levado nossas organizações,
tanto patronais como profissionais, a permanecer naquela
mesma cultura anterior à
Constituição Federal de 1988,
caracterizada por uma profunda letargia", afirma José Roberto Cazeri, advogado especializado em sindicalismo e associativismo.
Cinco em um
A pouca representatividade
da maioria dos sindicatos é vista em todos os setores da economia. Nas salas 805, 812 e 913
da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo),
estão instalados 15 sindicatos
de indústrias -cinco em cada
sala. Uma secretária cuida de
cada grupo de cinco sindicatos.
Entre as entidades que dividem salas na federação, estão
os sindicatos das indústrias de
chapéus, cordoalhas (cordas) e
estopa, relógios, explosivos,
rerrefino de óleos minerais, balanças, pesos e medidas, proteção, tratamento e transformação de superfícies e de funilaria
e móveis de metal. As secretárias das três salas informam
que "uns têm mais representatividade; outros, menos" e que
existe prestação de serviços.
Na sala 911 da Fiesp, está instalado o Sindifumo (Sindicato
da Indústria do Fumo do Estado de São Paulo), com dois sócios, que divide a sala com outro sindicato patronal. "Nosso
setor já chegou a ter 70 indústrias em São Paulo nas décadas
de 60 e 70. Hoje, são dois sócios
e, assim como no caso de outros
sindicatos, enfrentamos, sim,
crise de representatividade",
diz José Henrique Nunes Barreto, presidente do Sindifumo.
Sem sede
Há casos de sindicatos que
desativaram as suas sedes sem
informar aos representados,
como o Sindicato do Comércio
Atacadista de Louças, Tintas e
Ferragens de São Paulo. Na
convenção coletiva de 2008-2009, assinada com os empregados do setor, porém, consta
que a entidade funciona em endereço no centro de São Paulo.
Funcionários do edifício afirmaram à reportagem que há
quatro anos a entidade não está
mais no local, mas que "pessoas
passam por lá sempre para pegar correspondências".
A proliferação de sindicatos
existe porque mantê-los é um
bom negócio. Em 2008, todas
as entidades patronais arrecadaram R$ 363 milhões. Os sindicatos ficaram com 60% desse
valor; as federações, com 15%;
as confederações, com 5%; e o
governo, com 20%.
Reação
A falta de representatividade
dos sindicatos patronais começa a incomodar um grupo de
empresários que defende reforma no sistema sindical de empregadores e de empregados.
"Devido à total ausência de
representação, cerca de 400 indústrias de calçados e acessórios na Grande São Paulo decidiram criar a Ab-Artcouro para
representar de fato os interesses do setor", afirma Elizete
Fernandes, gerente da Pellegrini, fabricante de calçados.
Hamilton Chaves, sócio proprietário da Indústria Zugliani
de Refrigerantes e Bebidas,
afirma que foi duas vezes ao
sindicato que representa seu
setor -o Sindicato da Indústria
de Bebidas em Geral no Estado
de São Paulo- e que paga cerca
de R$ 100 de contribuição.
"É preciso reavaliar, sim, o
papel dos sindicatos de empregadores e de empregados. Os
dirigentes dessas entidades se
perpetuam no poder e os sindicatos não prestam serviços. Se
a contribuição fosse de R$
1.000 e o sindicato cumprisse o
seu papel, não reclamaríamos
de pagar", afirma Chaves.
O sindicato de calçados informa que perdeu sócios porque o setor entrou em crise e fábricas decidiram ir para outros
Estados. Os sindicatos de mecânica e de bebidas afirmam
que os presidentes das entidades estariam disponíveis para
dar entrevistas a partir desta
semana (leia texto ao lado).
"Não permito que sindicatos
fiquem instalados em salas no
prédio da federação. Cada um
tem que ter a sua casa, senão,
eles começam a exigir benesses. Os sindicatos patronais
têm obrigação de reunir as empresas de seus setores para discutir assuntos de interesse das
categorias. Aqui, acabou o sindicato de gaveta", diz Alcantaro
Corrêa, presidente da Fiesc
(Federação das Indústrias do
Estado de Santa Catarina).
A crise de representatividade
do sistema levou a Procuradoria Geral do Trabalho em Brasília a pedir há um ano ao Ministério do Trabalho um levantamento sobre os sindicatos que
existem no país e a sua representatividade.
"A Constituição Federal determina que um sindicato tem
de representar uma categoria
profissional ou econômica. Se
não representa, não pode existir", diz Otávio Brito Lopes,
procurador-geral do Trabalho.
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