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LUÍS NASSIF
A mídia e o fator Lula
O exercício do jornalismo precisa ser repensado. E não se trata de um problema de forma, mas de conteúdo
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NO INÍCIO dos anos 90, a inacreditável entrevista de Pedro Collor para a revista
"Veja" inaugurou a era de maior poder da mídia, desde o início dos anos
50. Descobriu-se a notícia-espetáculo, os fatos inverossímeis baseados em fontes suspeitas, mas que
atendiam à sede de show.
Denúncias graves não foram apuradas, denúncias vazias viraram
manchete, forçou-se a barra, mas o
presidente caiu. Ainda que à custa
de um pequeno Fiat Elba.
Seguiu-se um longo período de
denúncias inverossímeis, ou interessadas. Criou-se até essa obra-prima do jornalismo ficcional, o
"roteiro Frankestein", que consiste
em juntar pedaços de notícias verdadeiras, porém irrelevantes, e
compor um roteiro com denúncias
graves, porém falsas.
Ao longo dos anos 90, esse tipo de
jornalismo gerou peças de ficção famosas, como a capa de "Veja" sobre
Chico Lopes -segundo a qual o lobista amigo de Lopes, ele e o banco
que pagava as informações se comunicavam por meio de três celulares, e o banqueiro Salvatore Cacciolla obtinha as informações por meio
do "grampo" dos aparelhos; no dia
da mudança de câmbio, o "grampo"
falhou, por isso Cacciolla quebrou.
Agora, está-se em plena era da
globalização e da internet, com dois
fenômenos concomitantes, com
implicações relevantes para o futuro das democracias. O primeiro, os
amplos fluxos migratórios para os
países centrais, gerando um novo tipo de cidadão-eleitor, as minorias
étnicas, cada vez mais atuantes.
O segundo, a internet trazendo,
em um primeiro momento, enorme
balbúrdia de informações e, principalmente, de opiniões, catarses, espetáculo. Agora, quando esse tipo
de recurso freqüenta intermitentemente a internet, as caixas de e-mails, os blogs, os comentários nos
blogs, quando o exercício vazio da
indignação pode se expressar de várias maneiras, o papel fundamental
da grande mídia é o de estabelecer parâmetros.
É esse o diferencial: o aval à informação. Muito mais do que em qualquer outra época, há a necessidade
do rigor da apuração, justamente
porque existe uma overdose de notícias, boatos e opiniões exigindo o
avalista.
Pergunto: estamos preparados
para isso? A cobertura dos escândalos do mensalão e pós-mensalão
deixa uma enorme dúvida no ar.
Havia uma betoneira de denúncias
a serem apuradas. Em vez disso,
quando esgotou a fase inicial das denúncias, recorreu-se a uma overdose de denúncias sem comprovação,
somada a uma incapacidade ampla
de ir atrás de pistas consistentes, de
entender a complexidade dos grandes golpes, de separar o escândalo de
episódios triviais. Em alguns órgãos,
juntou-se uma dose de agressividade, desrespeito e preconceito sem
paralelo até na campanha do impeachment.
Chega-se ao final de um ciclo, que
começou com a campanha do impeachment, que derrubou um presidente, e termina com a do mensalão, que não foi capaz de abalar a popularidade de outro presidente.
O exercício do jornalismo precisa
ser urgentemente repensado. E não
se trata de um problema de forma. É
de fundo, de conteúdo.
Blog: www.luisnassif.com.br
@ - Luisnassif@uol.com.br
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