São Paulo, quinta-feira, 18 de junho de 2009

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ANÁLISE

Projeto é prova da arte do possível na política

EDWARD LUCE
DO "FINANCIAL TIMES"

Seis meses atrás, alguns observadores estavam prevendo que os EUA trariam de volta, em alguma forma, a Lei Glass-Steagall, cuja revogação, em 1999, rompeu a barreira que separava os bancos de investimento dos bancos de varejo, mais conservadores. O desaparecimento dessa distinção é visto por muitos como uma das causas dos excessos que resultaram na atual crise financeira.
O projeto divulgado ontem, fruto de meses de apressada colaboração entre o governo do presidente norte-americano, Barack Obama, e representantes do setor financeiro, é prova concreta da arte do possível no reino da política. O texto não faz nenhuma menção ao retorno de um sistema bancário dividido, solução que havia sido recomendada por muitos observadores, entre os quais Paul Volcker, assessor econômico de Obama e antigo presidente do Fed (o BC dos EUA).
E o estudo tampouco exibe qualquer traço do plano original de produzir uma consolidação drástica no número de agências regulatórias que agem sobre o sistema bancário. Em lugar de seis agências para o setor, agora existirão cinco.
Como declarou Obama anteontem, "nós queremos fazer as coisas da maneira correta.
Queremos agir com cuidado. E não queremos enfrentar moinhos de vento". O resultado é uma série cuidadosamente articulada de compromissos entre uma constelação diversificada de agências regulatórias, barões do Congresso e grupos de lobby setoriais. Determinar que proporção desse acordo cuidadoso sobreviverá aos debates para sua aprovação no Congresso continua a ser uma questão em aberto.
É seguro que a maior parte da comunidade financeira e do lobby que representa o setor está satisfeita com a proposta.
"O Tesouro realizou amplas consultas e produziu uma proposta cuidadosa e bem balanceada", afirma Scott Talbott, de um grupo de lobby que defende os interesses de Wall Street.
Talvez o elemento mais vulnerável na proposta de reforma seja a ideia de conferir ao Fed poderes novos sobre instituições consideradas como grandes demais para quebrar. Se considerarmos que o Fed é visto como responsável por alimentar a bolha de ativos que deu início ao processo, muitos legisladores, entre os quais aliados do presidente, consideram que isso seja o equivalente a recompensar o fracasso.
"Poder econômico demais concentrado em um lugar só é algo que coloca em risco o nosso sistema de governo. Os pais fundadores dos EUA se opunham a concentrações de poder econômico, ou de outra ordem, e favoreciam um sistema de equilíbrio e de controles recíprocos", afirmou o democrata Mark Warner, membro da Comissão Bancária do Senado.
Os republicanos são ainda mais estridentes em sua oposição a uma ampliação dos poderes do Fed. "A vasta expansão do balanço do Fed nos últimos meses pode ser vista como fonte muito mais significativa de risco sistêmico para a economia do nosso país do que o colapso de qualquer instituição financeira específica", disse a liderança republicana no Congresso recentemente.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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