São Paulo, domingo, 18 de novembro de 2001

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ARTIGO

Em busca da competitividade global

JEFFREY SACHS
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Fórum Econômico Mundial e o Centro de Desenvolvimento Internacional de Harvard lançaram, neste mês, o "Relatório de Competitividade Mundial 2001". Finlândia, EUA e Canadá ocupam as três primeiras posições entre os 75 países estudados, enquanto Nicarágua, Nigéria e Zimbábue são os três últimos. (As posições podem ser conferidas no site www.weforum.com).
Como co-diretor desse estudo anual, muitas vezes me perguntam o que quer dizer "competitividade". Será que os países competem economicamente como fazem militarmente? Será que faz sentido dizer que a Finlândia é mais competitiva do que a Alemanha ou a Itália?
Para os propósitos do estudo, definimos competitividade de maneira precisa: capacidade de um país atingir crescimento econômico sustentado a médio prazo, ou seja, em um período de cinco anos. Ao definir competitividade, não alegamos que a competitividade de um país implica falta de competitividade para um segundo. Com políticas mais eficientes, todos poderiam crescer mais e simultaneamente.
Todo país tem interesse em saber se suas políticas e instituições se comparam bem com as de outras nações, em termos de capacidade de conquistar e sustentar crescimento econômico.
Há aspectos que funcionam como competição direta, sob a qual os ganhos de um país ou região acontecem em detrimento de outro. Os países competem por capital internacional. Quanto mais investimentos estrangeiros diretos um país obtém, menos caberá a outro país. Isso fica claro quando países disputam um projeto de investimento. Quando a Intel planeja uma nova fábrica, ela convida diversos países para que apresentem propostas. A competição para atrair o projeto é ferrenha e usualmente envolve incentivos fiscais, compromissos quanto à infra-estrutura e até mesmo promessas sobre os currículos de engenharia nas universidades locais.
Na lista deste ano, determinamos a competitividade (capacidade de o país crescer) de acordo com três critérios amplos: tecnologia, instituições públicas e estabilidade macroeconômica. Foram criados índices para cada uma dessas categorias, e assim obtivemos uma média específica para a criação de um "índice de competitividade e crescimento".
Tecnologia se refere à capacidade de um país para estimular invenções e adotar tecnologias inventadas em outras nações. Alguns países, como EUA, Japão, Coréia do Sul, Israel e Suécia, investem pesadamente em pesquisa e desenvolvimento e, assim, atingem índices elevados de inovação. Outros países, como Argentina e Brasil, investem menos em pesquisa e desenvolvimento e atingem resultados insignificantes em termos de criação de novos produtos e processos. Os inovadores desfrutam de alto nível de prosperidade como resultado de suas inovações. Nesse critério, EUA, Canadá e Finlândia ocupam as três primeiras posições.
O critério instituições públicas trata da qualidade da administração pública e do governo. Existe corrupção generalizada? Os tribunais são honestos e imparciais? Pode-se confiar em que o governo cumpram seus compromissos? Países com instituições públicas eficientes atingem níveis mais elevados de crescimento econômico do que países debilitados pela corrupção. Padrões éticos elevados promovem um melhor desempenho econômico. A Europa Setentrional lidera o mundo quanto a isso, com Finlândia, Islândia e Dinamarca nos três primeiros postos do ranking. Nesses países, a corrupção praticamente inexiste.
Estabilidade macroeconômica é um critério definido pela ausência de inflação, equilíbrio orçamentário, taxa cambial realista, capacidade do governo e das empresas em obter empréstimos e confiança de que as obrigações financeiras do governo serão cumpridas. Aprendemos na década passada que, mesmo quando as empresas são competitivas internacionalmente, uma crise macroeconômica pode afetar o crescimento delas, como aconteceu na maioria dos países asiáticos no final dos anos 90. Cingapura, Irlanda e Suíça ocupam o topo do ranking em termos de estabilidade macroeconômica.

Necessidade de inovar
Nos nossos estudos sobre a competitividade, percebemos que a economia mundial pode ser dividida em duas categorias de países: a dos inovadores e dos não-inovadores. Apenas cerca de 20 países no mundo criam ativamente invenções. Para eles, que tendem a estar entre as nações mais ricas do mundo, manter a competitividade requer um sistema excelente de inovação tecnológica.
As universidades precisam ser excelentes; os laboratórios do governo devem ter classe mundial; e o governo e a indústria precisam investir pesadamente em pesquisa e desenvolvimento. Um determinante chave do crescimento futuro desses países é a proporção de estudantes que partem para a educação superior depois de concluir o segundo grau. Nos EUA e no Canadá, essa proporção atinge hoje os 80% dos estudantes.
Para os países que não são inovadores, a tecnologia continua a ser importante, mas neles as novas tecnologias são importadas, e não criadas em casa. Alguns desses países são eficientes na importação de novas tecnologias, outros não. Na última década, boa parte da importação de tecnologia aconteceu na forma de investimento estrangeiro direto.
Quando empresas norte-americanas investem no México, ou empresas de Taiwan investem na China, levam com elas novas tecnologias, que aumentam a eficiência de produção da empresa receptora. Assim, faz sentido que os países concorram ferozmente para atrair tais investidores, porque eles oferecem não só capital, mas também novas tecnologias.

Perspectivas
Um ponto forte e fraco ao mesmo tempo na nossa análise da competitividade é que ela trata do médio prazo, e não do próximo ano ou dois. Nossos rankings não podem ser usados para avaliar condições cíclicas de curto prazo em uma economia, mas oferecem indicações sobre as perspectivas de prazo mais longo das grandes economias. Assim, é irônico que muitos dos líderes de competitividade este ano, como EUA e Cingapura, estejam em recessão, enquanto países que têm posições baixas na lista, como a China (39º lugar), estejam escapando da recessão global.
Parte da desaceleração econômica se relaciona aos ataques terroristas de 11 de setembro, mas vem-se tornando claro que a economia americana e outras economias ligadas à dos EUA já estavam caindo em recessão antes de setembro. Ainda assim, nosso melhor palpite é o de que essa queda cíclica será temporária e, em uma perspectiva de cinco anos, os EUA continuarão a demonstrar forte capacidade para gerar crescimento econômico.


Jeffrey Sachs, economista, é diretor do Centro de Desenvolvimento Internacional da Universidade Harvard (EUA).


Tradução de Paulo Migliacci

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