São Paulo, domingo, 19 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INCLUSÃO

Para escapar das multas, número de contratados sobe de 601, em 2001, para 35,8 mil, em 2005 no Estado de SP

Empresas "caçam" portador de deficiência

FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma lei que obriga as empresas a contratar pessoas portadoras de deficiência (PPD) está levando empresários de todo o país a "caçar" esse tipo de mão-de-obra para evitar multas e indenizações que ultrapassam R$ 1 milhão.
Em 2001, 12 empresas paulistas contratavam 601 portadores de deficiência, principalmente na região de Osasco, onde a Subdelegacia do Trabalho passou a exigir a admissão desse pessoal.
Com a pressão para o cumprimento da legislação estendida para todo o Estado de São Paulo, o número de empresas subiu para 4.004 e o de deficientes saltou para 35.782 no final de 2005.
A lei nš 8.213, de julho de 1991, que estabelece cotas para a contratação de portadores de deficiência (são cerca de 25 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência no país, segundo levantamento feito pelo IBGE em 2000), não era cumprida nem por empresas privadas nem públicas.
Com a publicação do decreto nš 3.298, de dezembro de 1999, que estabelece normas para a integração de portadores de deficiência ao mercado de trabalho, começou um movimento de trabalhadores e de fiscais do trabalho a favor do cumprimento dessa legislação.
Dependendo do porte da empresa, a lei determina reserva para pessoas portadoras de deficiência, que pode variar de 2% (com mais de 100 e até 200 empregados) a 5% (acima de 1.001 empregados) do total de funcionários.
Cerca de 2.700 empresas estão hoje sob fiscalização da DRT (Delegacia Regional do Trabalho) no Estado de São Paulo. Mais 600 empresas serão somadas a esse número até o final deste ano. Cerca de 250 empresas foram multadas nesse período, segundo informa Lucíola Rodrigues Jaime, chefe de fiscalização da DRT paulista.
As multas estabelecidas pela DRT variam de acordo com o número de portadores de deficiência não-contratados -o valor é de R$ 1.101,75 por pessoa. Se a empresa deveria admitir dez portadores de deficiência, pagará multa de R$ 11 mil, por exemplo. O valor máximo da multa da DRT é de R$ 110,17 mil e pode ser aplicado toda vez que houver fiscalização.
Para fugir desse risco, empresas estão "correndo atrás" de portadores de deficiência. O problema é que a busca é por pessoas qualificadas, que possam se adaptar às funções normais das empresas.
"Não queremos contratar portadores de deficiência só para cumprir a cota. Queremos [poder] incluir esse pessoal em qualquer área do banco e que eles se sintam úteis", afirma Marcelo Santos, vice-presidente do departamento de RH do BankBoston.
Há dez meses, o banco tinha 25 PPDs de um total de 3.500 funcionários. Hoje, tem 83 PPDs (espalhadas pelas áreas administrativa, de segurança e de recursos humanos) e cerca de 4.500 empregados. O número de PPDs precisa subir para 225 para a cota ser cumprida. A meta do BankBoston, que há quatro meses recebeu multa de cerca de R$ 80 mil da DRT, é atingir a cota para PPDs até 2008.
Os bancos ABN Amro e Unibanco chegaram a ser condenados pela Justiça do Trabalho a pagar indenização de R$ 800 mil (em 2003) e de R$ 500 mil (em 2004), respectivamente, pelo não-cumprimento das cotas. A Volkswagen foi condenada (em 2003) a pagar indenização de R$ 1,5 milhão. As ações foram movidas pelo Ministério Público do Trabalho de São Paulo. Os bancos e a montadora recorreram ao TRT (Tribunal Regional do Trabalho), que analisa os processos.
"Não concordamos com a assinatura do TAC [Termo de Ajustamento de Conduta] com o Ministério Público do Trabalho porque isso é o mesmo que o banco assumir que fez o acordo só para cumprir a lei de cotas. A contratação de PPDs é meta interna do banco desde 2000, quando começamos a trabalhar com o conceito de responsabilidade social. A contratação de PPDs não pode ser uma obrigação", diz Lilian Guimarães, diretora-executiva de recursos humanos do ABN Amro.
Como o ABN tem 28 mil funcionários, para cumprir a lei de cotas precisará ter 1.400 portadores de deficiência em seu quadro de pessoal. A diretora do banco informa que existem 670 PPDs no ABN e que a previsão é elevar esse número para 1.100 até o final do ano.
O Unibanco informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que vem "desde 2003 intensificando e desenvolvendo suas iniciativas de recrutamento voltadas a esses trabalhadores". A Volks não quis se manifestar. Informa que o processo movido pelo MPT está sob segredo de Justiça.
Uma ação civil pública contra o Bradesco discute há seis anos a forma como a lei que estabelece cotas para contratação de portadores de deficiência é aplicada.
Para o banco, deve ser por agência -nesse caso, só em unidades com cem ou mais empregados. Para o MPT, autor da ação, a lei tem de ser aplicada sobre o número total de funcionários.
O Bradesco informa que o caso está sub judice. "Cabe esclarecer que é contínuo o trabalho do Bradesco no sentido da inclusão de pessoas portadoras de deficiência em seu quadro de colaboradores", segundo informa por sua assessoria de imprensa.
Empresas como Siemens, Ultragaz e Hospital Albert Einstein já procuraram o MPT para discutir a contratação de portadores de deficiência, segundo informa a procuradora do Trabalho Adélia Augusto Domingues.


Texto Anterior: Mercado Aberto
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.