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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Política industrial e câmbio
A política industrial anunciada merece apoio,
mas não substitui uma taxa de câmbio não-competitiva
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A POLÍTICA industrial que o governo anunciou na última semana merece apoio porque
envolve um conjunto de medidas
que estimularão o desenvolvimento
tecnológico e a competitividade da
indústria nacional. É uma política
desenvolvimentista da melhor estirpe, semelhante às políticas que outros países adotam para promover
sua indústria. Nenhum país rico deixa de apoiar suas empresas, não há
razão para que não o façamos também. Entretanto, conforme observou o jornal "Valor" (13/5), "a segunda versão da política industrial do
governo Lula é uma continuação
ampliada da primeira, cujos resultados foram escassos". E o jornal prevê que o mesmo destino está reservado a essa segunda versão.
Por que a Política de Desenvolvimento Produtivo deverá trazer poucos resultados? A limitação da nova
política não está no fato de limitar os
recursos que o governo investirá na
infra-estrutura, como sugere o editorial, mas no valor limitado dos estímulos que são oferecidos.
Segundo os cálculos do governo, a política industrial deverá transferir para as
empresas, nos próximos quatro
anos, R$ 21 bilhões. Essa cifra deixa
clara uma idéia fundamental para o
desenvolvimento econômico: política industrial não substitui uma taxa
de câmbio não-competitiva. Fiz alguns cálculos muito simples que
mostram esse fato. Se a taxa de câmbio fosse uma taxa de equilíbrio, ou
seja, que garantisse a competitividade de indústrias de bens comercializáveis utilizando tecnologia no estado-da-arte -se estivesse em torno
de no mínimo R$ 2,50, em vez de R$
1,70 por dólar-, o ganho adicional
da indústria seria de R$ 340 bilhões
(suposto um crescimento das exportações de apenas 5% ao ano). O
governo, portanto, está oferecendo
um valor 94% menor à indústria do
que aquele que esta obteria se a política macroeconômica do governo
assegurasse uma taxa de câmbio de
equilíbrio.
Os ministros Guido Mantega e
Miguel Jorge certamente sabem
desse fato. Talvez não tenham feito
o mesmo cálculo, mas sabem que os
valores oferecidos são muito menores do que os subtraídos. Sentem-se,
entretanto, impotentes em relação à
taxa de câmbio porque não é fácil intervir nos níveis correlacionados da
taxa de juros (elevadíssimos) e da taxa de câmbio (sobreapreciada). Essa
intervenção implicaria medidas fortes que nem o presidente nem a coalizão político-social dominante estão dispostos a apoiar. O presidente
está satisfeito com sua popularidade; a sociedade, com o bom momento da economia brasileira; a elite político-social dominante, com os ganhos que realiza.
Se fosse fácil corrigir a taxa de
câmbio, o Ministério da Fazenda já o
teria feito, porque seus economistas
sabem da necessidade dessa correção. Mas esta envolve uma estratégia integrada de todo o governo com
o apoio da sociedade: a desvalorização cambial implica redução temporária de salários reais e um aumento
também temporário da inflação.
Não é, portanto, apenas a política de
juros altos do Banco Central que impede o resto do governo de agir. Somam-se a ela a alienação e a dependência de nossas elites, que se satisfazem com as taxas atuais de crescimento e não se dão conta de que uma taxa de câmbio tão apreciada
apenas interessa aos países ricos,
que naturalmente a apóiam com entusiasmo.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 73, professor emérito
da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
Internet: www.bresserpereira.org.br
lcbresser@uol.com.br
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