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ANÁLISE
País de Chávez volta a enfrentar pressão
PAVEL GÓMEZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Na Venezuela, nos últimos
dez anos, a pressão política e
econômica vem disparando em
intervalos certos. Desta vez os
alarmes que soaram no país
vêm do mercado cambiário.
Em 8 de janeiro, a moeda foi
desvalorizada na média de 20%
e foi instaurado um esquema de
câmbio múltiplo: 2,60 bolívares fortes por dólar para importação de alimentos, remédios e
bens de capital; 4,30 bolívares
fortes por dólar para exportações petrolíferas e importações
não prioritárias.
Por fim, foi criado um tipo de
câmbio livre, que naquele momento estava em 6,25 bolívares
fortes por dólar.
Na semana passada, o mercado de câmbio livre foi fechado,
depois de a taxa ter chegado a
8,20 bolívares fortes por dólar,
o que implicava uma desvalorização de 30% entre janeiro e
maio de 2010.
Agora esse mercado será redefinido, e veremos se os câmbios alcançam as metas de estabilidade e acesso.
O mercado livre era a opção
mais acessível que os venezuelanos dispunham para trocar
bolívares por dólares.
Após a desvalorização de 8 de
janeiro, muitos apostavam que
a taxa de câmbio livre poderia
se aproximar da taxa do câmbio
preferencial superior (4,30 bolívares fortes por dólar), ou pelo menos se estabilizar.
Essa suposição ingênua se
baseava na conjunção de três
fatores: a) o petróleo parecia
prestes a estabilizar-se em cerca de US$ 70 o barril; b) a esse
preço, o governo poderia injetar mais dólares a 4,30 bolívares fortes; e c) em ano eleitoral,
o governo teria incentivos para
frear os efeitos inflacionários
da desvalorização e estimular a
atividade econômica.
Essa hipótese não se concretizou, e a realidade confirmou
as expectativas apocalípticas
feitas pelos previsores habituais de catástrofes.
O que aconteceu? Em primeiro lugar, a atuação do governo parece revelar que a situação fiscal (balanço entre entradas e saídas de dinheiro do
governo) é pior do que se imaginava até então.
As crises bancária e elétrica
podem ter custado mais do que
o admitido e previsto, e a produção de petróleo talvez seja
inferior às suposições conservadoras de alguns analistas independentes.
Finalmente, o governo talvez
não estivesse disposto a gastar
no curto prazo as poucas economias que lhe permitiriam
enfrentar as eleições parlamentares de setembro de 2010.
Todas essas são hipóteses
que procuram encontrar alguma racionalidade nos fatos, antes de admitir argumentos de
pura e simples falta de inteligência e miopia ideológica.
O que os planejadores governamentais deixaram de prever?
A brutal contração dos investimentos privados e da disposição de produzir na Venezuela,
suscitada por anos de discursos
contra a empresa privada, de
ameaças regulatórias, de intervenções, desapropriações, controles, impedimentos e tratamentos diferenciais por razões
políticas.
O resultado: a oferta local se
contraiu a tal ponto que qualquer injeção de gasto e estímulo fiscal da economia promete
apenas inflação e escassez.
No curto prazo, essa é má notícia para os venezuelanos, mas
uma boa notícia para os parceiros comerciais, que podem
continuar a fornecer os produtos que a Venezuela deixou de
produzir.
PAVEL GÓMEZ é economista e professor do Instituto de Estudos Superiores de Administração
(Iesa), em Caracas.
Tradução de CLARA ALLAIN
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