São Paulo, terça-feira, 19 de junho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo concentra crédito da agricultura familiar

47% do financiamento vai para soja e milho, apesar da busca por diversificação

Sindicalistas e ministro do Desenvolvimento Agrário vêem "contradição" no Pronaf e defendem mudanças na atuação

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Créditos altos, inadimplência baixa, prioridade diante da reforma agrária e simpatia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Todos esses aspectos positivos, porém, não impedem que a agricultura familiar viva hoje uma "contradição" da monocultura que incomoda tanto as entidades de trabalhadores rurais como o próprio governo.
Levantamento do Ministério do Desenvolvimento Agrário revela que as culturas do milho e da soja, juntas, representam 47% de todo o financiamento de custeio das linhas do Pronaf (Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar).
Na safra 2005/2006, por exemplo, dos R$ 3,3 bilhões financiados em custeio, R$ 1 bilhão foram aplicados em milho e R$ 492 milhões, em soja.
O mesmo levantamento revela ainda que, dos 902,7 mil contratos fechados no período (julho de 2005 a junho de 2006), 427,5 mil estão justamente nos plantios de milho (326,4 mil) e soja (101,1 mil).
O milho está espalhado por todo o país, enquanto a soja aparece mais concentrada no Paraná e no Rio Grande do Sul.
Tanto no número de contratos como no valor financiado de custeio, a concentração do milho e da soja é de 47% -distante, portanto, do discurso de "diversificação" da agricultura familiar apontada pelo governo e esperada pelos movimentos e entidades do campo.
"Sem dúvida há uma contradição no Pronaf", disse o ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário). Segundo ele, para tentar reverter esse quadro, o governo estuda uma forma de "liberar" 30% dos créditos para outras culturas.
Por exemplo: um crédito de custeio de R$ 5.000 para milho teria R$ 1.500 obrigatoriamente reservados a outras culturas, como mandioca e tomate.
O Plano Safra da Agricultura Familiar 2007/2008 terá R$ 12 bilhões para linhas de custeio e investimento -alta de 420% sobre os R$ 2,3 bilhões da safra 2002/2003, no governo FHC.
Em geral, a agricultura familiar representa pequenos proprietários, o que, na prática, impede que seus créditos sejam destinados à cana-de-açúcar, vedete do agronegócio. Nas linhas de custeio do Pronaf, a cana tem 0,84% dos contratos e 0,78% do volume financiado.
Dados do governo federal mostram que a agricultura familiar representa 34,5% de toda a produção agrícola nacional. Algumas culturas aparecem acima dessa média, como milho (44,3%) e fumo (95,9%). Na soja, são 27,8% da produção.
Para Antoninho Rovaris, secretário de Política Agrícola da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), o agricultor possui alguns "atrativos" para se manter em culturas tradicionais, como milho, soja e café.
"A assistência técnica, por exemplo, está bitolada nisso. Há também outros atrativos, como créditos específicos, pesquisas direcionadas e garantia de preços. É preciso esses mesmos atrativos em outras culturas, principalmente assistência técnica direcionada", disse.
Somadas, feijão, arroz, tomate e mandioca representam 13% do volume total e 16% dos contratos de custeio do Pronaf. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário, os agricultores familiares são responsáveis por 10% do PIB. Na safra 2005/2006, em todas as linhas do Pronaf, foram fechados 1,9 milhão de contratos.
Altemir Tortelli, da Fetraf-Sul (Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul), diz que o governo precisa iniciar o quanto antes uma segunda etapa na área.
"Já houve uma democratização do acesso ao crédito, com acesso aos bancos e subsídios, uma conquista histórica. Agora é preciso qualificar o crédito, para induzir, estimular e criar condições mais favoráveis."


Texto Anterior: Justiça: Parmalat faz acordo com três bancos
Próximo Texto: Governo vai mudar regras de linhas do Pronaf
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.