São Paulo, domingo, 19 de agosto de 2007

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Crise reduz otimismo e ameaça expansão

Para empresários, turbulência diminui previsibilidade e deve afetar investimentos; duração de incerteza e EUA serão "chaves"

Força do consumo interno e da produção e melhora dos indicadores do país são atenuantes, mas extensão da crise pode afetar economia

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

A turbulência financeira da semana passada congelou muito do otimismo reinante entre empresários e economistas e colocou em "ponto morto" as expectativas de novos investimentos. É ainda um "sinal amarelo", mas a duração da crise e, principalmente, a sua extensão nos Estados Unidos determinarão se novos projetos serão engavetados ou continuados.
"A previsibilidade caiu drasticamente e isso é imobilizante. Podemos esperar uma parada em processos de investimento que estavam em curso. Claramente, a direção não é no sentido do neutro, mas no do negativo", afirma Paulo Francine, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Para o empresário, "toda a cadeia que se estabelece agora está apoiada na incerteza. Seu efeito não é devastador, mas é crescentemente negativo".
Edgard Pereira, economista-chefe do Iedi (instituto que reúne 46 empresários de grandes empresas nacionais), teme que as expectativas negativas sejam reforçadas neste momento por uma interrupção, pelo Banco Central, no processo de queda dos juros.
"Neste momento, o melhor seria o contrário: o BC sancionar as decisões de investimentos já tomadas mantendo a trajetória de queda na taxa", diz.
Para o empresário Boris Tabacof, diretor do Departamento de Economia do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo), "vão colocar o pé no freio, caso a crise se prolongue", principalmente as empresas médias e menores.
Tabacof lembra que as vendas de máquinas e equipamentos que atendem esses empresários vêm crescendo cerca de 10% ao mês há alguns bimestres, impulsionando de forma "capilar" vários setores. "Para essas empresas, uma sinalização negativa na condução dos juros pode determinar uma parada maior", afirma.
Ele não acredita, porém, que setores que investem pesado e a longo prazo, como o siderúrgico, de papel e celulose e o petroquímico, deixem-se influenciar pela crise no curto prazo. "O risco para esses setores, como para todos, é uma desaceleração maior na economia dos EUA", diz (ver texto à pág. B4).

Menos vulnerável
O lado positivo, na visão de empresários e analistas, é que o Brasil está menos vulnerável. Na crise externa e interna de 1999, quando o dólar disparou, o resultado das transações do país com o exterior era amplamente negativo.
Na época, o Brasil tinha necessidade semanal de financiamento de US$ 1 bilhão e reservas de US$ 35,5 bilhões.
"Era só olhar para as reservas no BC e fazer a conta para saber quantos dias faltavam para o país ficar insolvente. Hoje, somos credores em dólares, com reservas acima de US$ 150 bilhões, e temos superávit em nossas contas externas", diz Fabio Giambiagi, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), ligado ao Ministério do Planejamento.
Além disso, o setor empresarial está hoje sólido e com um endividamento em dólares proporcionalmente bem menor.
No primeiro semestre de 2007, os cem maiores lucros das empresas com ações na Bovespa foram de R$ 68,1 bilhões. No mesmo período em 1999, de R$ 22,4 bilhões, em valores corrigidos pela inflação. As empresas também têm obtido a maior parte de suas receitas em um mercado interno aquecido.
"As empresas e o mercado estão bem mais sólidos para enfrentar uma crise", afirma Claudio Haddad, ex-diretor do BC e presidente do Ibmec-SP.
No primeiro semestre de 2007, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) registrou recorde de 9,9% nas vendas do comércio. O aumento esteve apoiado nos crescimentos de 13,1% no crédito e de 6,4% na massa salarial -o que deve garantir um bom resultado para o PIB (Produto Interno Bruto) no semestre.
Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos), 97,1% das 280 negociações de categorias de indústria, comércio e serviços tiveram reajustes iguais ou superiores à variação da inflação nas suas datas-base.
"Até aqui, a crise é tipicamente financeira, com um epicentro nos EUA. No front interno, há muitos aspectos favoráveis: o crédito e a massa salarial estão aumentando e, com a receita de tributos "bombando", estamos longe de um problema que ameace o lado fiscal do governo federal", afirma o economista Amir Khair, especialista em contas públicas.


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