São Paulo, Quinta-feira, 19 de Agosto de 1999
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LUíS NASSIF

O IPI das autopeças

O setor de autopeças está coberto de razão no episódio das isenções fiscais à Ford. Seus problemas, aliás, são uma comprovação de como a decisão foi tomada de afogadilho, sem uma análise mais apurada de seus desdobramentos.
O ponto central de discórdia é o artigo 5º da medida provisória 1.916. Diz ele: "A saída do estabelecimento industrial, ou a importação de chassis, carroçarias, peças, partes, componentes e acessórios destinados à montagem dos produtos classificados nas posições 8.701 a 8.705 da TIPI, dar-se-á com a suspensão do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados)".
O que significa na prática?
O pagamento do IPI se faz por substituição. A empresa A produz um insumo e vende à empresa B por 100. Sobre esses 100 incidem 10% de IPI. A empresa B paga 110 (os 100 mais os 10 de IPI) e fica com um crédito de IPI de 10. Aí ela monta o equipamento com aquele conjunto de peças, agrega valor e vende para a empresa C por 200. Sobre esses 200 incidem mais 10% de IPI -ou 20. Como a empresa B tinha crédito de 10, ela fica devendo 10 de IPI. A empresa C paga 220 e fica com crédito de IPI de 20, e assim por diante.
O que a MP fez? O conjunto de peças chega ao sistemista -que é a indústria que monta componentes maiores do carro e os entrega prontos à montadora. Digamos que o valor das peças do sistema seja 1.000. O sistemista paga 10% de IPI, ou 100, e tem créditos de 40. A peça deveria ser vendida por 1.100 para a Ford. Aí a Ford monta o carro, coloca a margem dela e desconta do IPI a ser pago os 100 que já pagou para o sistemista.
A corrente foi interrompida quando a Ford foi isenta de IPI. Em vez de 1.100, ela passa a pagar apenas 1.000 para o sistemista. Os 100 que deixou de pagar representavam, justamente, o reembolso para a cadeia produtiva de todos os créditos de IPI acumulados.
Em vez de recompor seu capital de giro, as fornecedoras passam a ter em mãos créditos, papel para receber algum dia, se Deus quiser. Todo esse montante que não recebeu será tirado do seu capital de giro, obrigando as empresas menos capitalizadas a tomar dinheiro no mercado, ao custo que todo mundo sabe.
Na reunião que mantiveram com a Receita Federal, o secretário Everardo Maciel sugeriu que utilizassem esse crédito para quitar outros tributos. Pela legislação em vigor, constatado o crédito, após 90 dias a empresa deve dirigir-se ao posto da Receita e informar que necessita a verificação do crédito. A Receita mandará fiscalização à empresa para constatar existência do crédito. Sendo verídico, poderá compensar com outros impostos federais. PIS Cofins e CSSL.
O Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) fez as contas junto aos principais sistemistas e chegou à conclusão que, para um total de R$ 431 milhões de créditos de IPI acumulados em um ano, os demais tributos (PIS-Cofins, CSSL e outros) representariam apenas R$ 175 milhões. O saldo remanescente seria de R$ 256 milhões, muito mais do que os R$ 180 milhões de subsídio anual à Ford.
Enquanto isto, todos os componentes importados ficam isentos do pagamento de IPI.
Tem que haver um limite para esse processo de sucateamento da indústria instalada no país. Não tem mais nada a ver com o início da abertura da economia, quando o aperto visava induzir à busca de competitividade, ao fim dos cartórios e cartéis, ao predomínio do consumidor. Hoje, estão se exterminando empresas e empregos.

Crise à vista
O setor de transformação de plásticos está à beira de uma crise de grandes proporções. Num ponta, há os grandes fornecedores, que registraram aumentos de até 50% por conta de aumento do dólar e da nafta. Na outra ponta, compradores fortes (como supermercados e indústria automobilística), que não aceitam repasses. No meio deles, pequenas e médias empresas nacionais, descapitalizadas.


E-mail: nassif@uol.com.br



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